12 Dezembro 2023
"Muitos nem sequer foram aflorados. As omissões mais graves da indagação tomista situam-se no campo da história, da ciência e da estética. Há, entretanto, uma atenuante para estas graves lacunas: nos tempos de Tomás esses setores ainda eram pouco desenvolvidos", escreve Eliseu Wisniewski em artigo sobre o livro "Dicionário Enciclopédico do pensamento de São Tomás de Aquino" de Battista Mondin.
Eliseu Wisniewski é mestre em Teologia (Pontifícia Universidade Católica do Paraná, PUCPR, 2013). Presbítero da Congregação da Missão (padres vicentinos) Província do Sul. Professor na Faculdade Vicentina, em Curitiba.
Eis o artigo.
São Tomás de Aquino, afirma a encíclica Fides et ratio, foi sempre proposto pela Igreja como mestre de pensamento e modelo quanto ao reto modo de fazer teologia. Isso se deve ao fato que ele amou desinteressadamente a verdade. Procurou-a por todo o lado onde pudesse manifestar-se, colocando em relevo a sua universalidade. Nele, o Magistério da Igreja viu e apreciou a paixão pela verdade; o seu pensamento, justamente porque se mantém sempre no horizonte da verdade universal, objetiva e transcendente, atingiu alturas que a inteligência humana jamais poderia ter pensado. É, pois, com razão que São Tomás pode ser definido como “apóstolo da verdade” (cf. n. 43, 44).
No contexto das comemorações do 700º aniversário da sua canonização, a partir de 14 de julho de 2023 e durante três anos, a figura do Doutor Angélico será objeto de uma série de eventos importantes com o objetivo de renovar e alargar o conhecimento de um dos grandes Doutores da Igreja. Dentro deste objetivo poderá ser útil a obra: Dicionário enciclopédico do pensamento de Santo Tomás de Aquino (Loyola, 2023, 728 páginas), elaborado por Battista Mondin (1926-2015).
MONDIN, Battista. Dicionário enciclopédico do pensamento de Santo Tomás de Aquino. São Paulo: Loyola, 2023, 728 p. (Foto: Divulgação)
O referido autor foi presbítero e missionário xaveriano, atuando como professor de filosofia na Pontifícia Universidade Urbaniana (Roma). Ao longo de sua prestigiosa carreira, padre Mondin trabalhou como teólogo perito e consultor episcopal do Concílio Vaticano II. Foi também um pesquisador e escritor prolífico: escreveu centenas de livros e milhares de artigos sobre os mais variados temas – filosofia, antropologia, metafísica, cosmologia, teologia e história da Igreja. Durante sua vida, contribuiu notavelmente aprofundando e difundindo o pensamento de São Tomás de Aquino, seja por meio de suas pesquisas, seja pela idealização e fundação da Sociedade Internacional Tomás de Aquino.
Quanto à origem deste Dicionário, o autor destaca que em seus estudos, São Tomás sempre ocupou o primeiro lugar, contudo, efetuou suas pesquisas mais importantes nos anos 1964-1966. Foi no ano de 1989 que recebeu do padre Ottorino Benetollo, OP a proposta de redigir sozinho um dicionário do pensamento de São Tomás de Aquino e depois de uma no respondeu positivamente ao convite. Na sequência, colocou-se imediatamente ao trabalho, dedicando grande parte das suas jornadas de um ano inteiro a este trabalho, que o fez apreciar a grandeza, beleza, originalidade e a atualidade do pensamento do Doutor Angélico.
Levando em consideração que os escritos de São Tomás costumam ser divididos em cinco grupos: a) Sínteses Teológicas; b) Comentários à Sagrada Escritura; c) Comentários de Aristóteles; d) Opúsculos autênticos; e) Vários, a metodologia usada pelo autor na confecção deste Dicionário consistiu em oferecer apenas o pensamento de São Tomás e não de seus comentadores, limitou-se em primeiro lugar a traçar em breve síntese o desenvolvimento do pensamento precedente a São Tomás, para se entender a originalidade de sua contribuição e, em segundo lugar, a exposição de modo exaustivo do seu pensamento, tomando-o de todas as suas obras, mas de modo particular das suas duas obras monumentais: o Comentário às Sentenças e a Suma de Teologia.
Neste volume composto de 549 verbetes encontramos uma síntese ampla e fielmente documentada do pensamento de São Tomas sobre todos os assuntos tratados por ele na sua vastíssima produção literária: argumentos que dizem respeito principalmente à teologia, à filosofia e à moral, mas que compreendem também a liturgia, a Sagrada Escritura, a política, a pedagogia, a sociologia, a biologia, a física, a astronomia, a antropologia, a historia da filosofia e outros assuntos pertinentes.
Mondim observa que o século XIII é celebrado por todos os estudiosos como o século de ouro da Idade Média. É nele, com efeito, que a civilização medieval atinge pontos culminantes em todos os campos: nas artes, na literatura, na política, na teologia e também na filosofia. O que distingue o gênio dos homens de este tempo é o perfeito equilíbrio entre fé e razão, entre autonomia do homem e a sua mais completa submissão a Deus. Esses traços se manifestam de modo particular em Tomás de Aquino, uma das figuras dominantes deste período e um dos maiores filósofos e teólogos de todos os tempos.
Nota, porém, que nem um gênio de tal grandeza, sempre sedento de verdade e iluminado constantemente pela fé, conseguiu explorar completamente os campos infindáveis do cognoscível. Muitos nem sequer foram aflorados. As omissões mais graves da indagação tomista situam-se no campo da história, da ciência e da estética. Há, entretanto, uma atenuante para estas graves lacunas: nos tempos de Tomás esses setores ainda eram pouco desenvolvidos.
Esses limites consideráveis do pensamento do Aquinante, se, de um lado não justificam a aceitação cega de sua autoridade em todos os campos do saber e em qualquer ramo da filosofia, não autorizam, por outro, uma atitude de desconfiança em relação ao seu pensamento. Alguns de nossos contemporâneos consideram a filosofia de Tomás essencialmente atrelada ao carro de Aristóteles e a visão medieval do mundo e, como esta, já reduzida a fragmentos. No entanto, Mondim ressalta que Tomás soube desvincular-se do cosmologismo da metafísica aristotélica e dos estreitos limites da visão científica do mundo que os medievais se tinham formado, e que descobriu princípios metafísicos válidos para todos os tempos, independentemente dos progressos da ciência, da história e da arte.
Assim sendo, a atualidade do pensamento de São Tomás é desconcertante. Quem decidir aprofundá-lo, no inicio experimentará o júbilo da descoberta, depois o encanto da admiração. Somos gratos ao Pe. Battista Mondin pelo seu contributo na elaboração deste dicionário enciclopédico. Que a sua competência e o seu esforço possam ser recompensados pelo conhecimento a que um grande número de leitores e estudiosos poderão ter no conhecimento deste grande Doutor da Igreja.
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Dicionário enciclopédico do pensamento de São Tomás de Aquino. Artigo de Eliseu Wisniewski - Instituto Humanitas Unisinos - IHU