15 Dezembro 2012
"A reação da população, principalmente dos jovens, ao governo do presidente Morsi é um fato importante, porque diz que há uma grande fatia da população que não quer que se instaure no Egito um regime islâmico fundamentalista. O que surgirá desse protesto? Não sou capaz de dizer, mas é fundamental que o protesto tenha ocorrido, porque é a demonstração de que há um desejo de democracia". Samir Khalil Samir, jesuíta egípcio, atento observador das dinâmicas políticas do seu país, olha com interesse para a onda de protestos antigovernamentais que estão agitando o país nestes dias. Ele os vê como uma reação a uma tentativa de silenciar as demandas de liberdade que brotaram da Primavera Árabe.
A reportagem é de Enrico Casale, publicada na revista dos jesuítas italianos, Popoli, 07-12-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis a entrevista.
A Irmandade Muçulmana está ameaçando o processo democrático no Norte da África e no Oriente Médio?
A Primavera Árabe foi um movimento de jovens sem experiência política que reivindicavam liberdade e dignidade, além de trabalho e comida. Eles não tinham, no entanto, nenhuma experiência política. As eleições que foram realizadas no Egito, levaram ao poder inevitavelmente a única estrutura política que restou, a Irmandade Muçulmana. O resultado a favor dos Irmãos Muçulmanos era quase previsível. Os velhos partidos haviam sido abatidos. Os novos eram muito fracos. Assim, eles dominaram nas urnas, jogando também com o fato de que 40% da população é analfabeta, e a rede de imãs tradicionalistas formados por Al-Azhar os apoiou. O presidente Morsi agora concentrou todos os poderes (legislativo, executivo e judiciário) nas suas mãos e fez com que fosse votada por uma Assembleia Constituinte – da qual os representantes não islamistas renunciaram – um projeto de constituição que tem uma tendência fundamentalista.
Quem saiu às ruas para protestar contra o presidente?
Principalmente jovens que não querem a criação um regime islâmico fundamentalista. Esses rapazes não são laicistas, mas sim muçulmanos que olham para a religião como um fenômeno importante, mas que não deve se impor sobre a sociedade. Quando saíram às ruas, o fizeram de modo pacífico, não tinham armas. O fato de que o protesto se degenerou em um confronto é responsabilidade dos islamistas que chegaram para defender Morsi, que estavam armados com coquetéis molotov, pedras e paus.
Os manifestantes estão divididos em muitas correntes. Como é possível encontrar um entendimento entre eles?
Na realidade, cristãos, liberais, socialistas e muçulmanos moderados estão de acordo: todos rejeitam a ideia de um Islã fundamentalista. Todos querem que se afirme um sistema realmente democrático. O verdadeiro problema é que, no nosso país, se perdeu o hábito da democracia. São 60 anos que o Egito é governado por ditadores, e as pessoas não estão familiarizadas com as armas da democracia. Vai levar tempo, mas acredito que o país conseguirá completar essa transição.
O que vai acontecer nos próximos meses?
O governo não vai renunciar. Talvez suavizará as suas afirmações, mas continuará governando. A revolução se dará nos fatos. Se o regime islâmico souber melhorar a condição das pessoas, eliminando a pobreza, então permanecerá no poder. Se, ao invés, não mudar nada, as pessoas não votarão mais neles.
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''As manifestações no Egito? Sinal de democracia'' - Instituto Humanitas Unisinos - IHU