O mesmo Martini, 20 anos depois

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10 Setembro 2012

A última entrevista com Martini sobre o atraso de "200 anos" da Igreja causou polêmica. Mas o cardeal dizia as mesmas coisas em 1983.

A reportagem é de Andrea Tornielli, publicada no jornal Vatican Insider, 04-09-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Gerou discussão e girou o mundo a última entrevista do cardeal Carlo Maria Martini, um diálogo que durou duas horas, não preparado, com o jesuíta alemão Georg Sporschill. Ele girou o mundo por causa das palavras ditas sobre a Igreja "em atraso de 200 anos", além das palavras sobre a necessidade de abertura em matéria da ética sexual, sacramentos aos divorciados em segunda união... Assuntos dos quais o arcebispo emérito de Milão havia falado com o mesmo padre Sporschill em 2007, no seu livro mais vendido, Diálogos noturnos em Jerusalém. Sobre o risco da fé (Paulus, 2008).

Independentemente do que se pense, o cardeal jesuíta falecido na semana passada deve ser reconhecido pela coragem das suas próprias ideias. Amigo do então arcebispo de Westminster, o cardeal Basil Hume, do qual herdara o cargo de presidente do Conselho das Conferências Episcopais Europeias, Martini costumava visitá-lo na capital britânica. E, por ocasião dessas viagens, entregava à imprensa as suas declarações mais discutidas.

No dia 26 de abril de 1993, o dominical Sunday Times, suplemento do renomado jornal britânico The Times, publicava na capa uma grande foto colorida de Martini, acompanhada pela manchete: The Next Pope? ("O próximo papa?"). A entrevista era assinada por John Cornwell.

Olhando para a situação interna da Igreja, Martini dizia: "Estamos em 1993, mas alguns católicos ainda estão mentalmente em 1963, alguns em 1940, e outros até no século passado. É inevitável que haverá um choque de mentalidades". "Eles", acrescentava Martini, "não podem estar todos certos. Alguns estão mais próximos do Evangelho, e outros, menos – esse é o verdadeiro perigo".

Em entrevista ao Sunday Times, o cardeal abordava o problema do controle de natalidade. "A contracepção é algo especial – dizia – que tem a ver com questões particulares de ensino moral. Há um contraste de atitude entre os países do Norte e os latinos sobre as questões morais. Na Itália, nós acreditamos que o ideal deve ser posto no alto, de modo a poder obter alguma coisa. Em outros países, se pensa que se deve realmente chegar ao ideal, e eles se preocupam se fracassam".

"Eu não sei qual será o desdobramento relativo à contracepção – acrescentava o arcebispo de Milão –, mas acredito que o ensinamento da Igreja não foi bem expresso. O fato é que o problema da contracepção é relativamente novo. Ele foi realmente tornado possível com novas técnicas nos últimos 40 anos, ou pouco mais. A Igreja, por outro lado, pensa muito lentamente, e por isso estou confiante de que conseguiremos encontrar alguma fórmula para expôr melhor as coisas, para que o problema seja melhor compreendido e melhor adaptado à realidade. Devo admitir que há uma lacuna, e isso me incomoda, mas estou confiante de que poderá ser superado...".

Alguns meses depois, no dia 4 de janeiro de 1994, Martini retomaria o tema da contracepção durante uma entrevista concedida a dois jornalistas do Le Monde. "O que a opinião pública não compreende é em que a contracepção e o uso de um preservativo para evitar a epidemia da Aids são atentados à dignidade da pessoa. E essa questão é suscetível de evolução?".

Na entrevista com o Sunday Times de 1993, o arcebispo de Milão havia assumido uma posição possibilista, até mesmo no que se refere a uma revisão da norma que prescreve o celibato dos padres. Que ele aprofundava com o Le Monde: "A crise das vocações – explicava – ameaça essa transmissão da mensagem evangélica. A disciplina da Igreja latina, que reserva o ministério sacerdotal apenas aos homens celibatários também é suscetível de evolução? Não é possível entrever uma abertura aos homens casados? Eu não nego que possa haver uma resposta possível".

Não apenas as ideias de Martini permaneceram as mesmas, mas o cardeal, no dia 11 de abril de 2005, tomando a palavra em uma das reuniões dos cardeais que precederam o conclave, as havia reiterado. Ele pedira mais colegialidade e concertação entre o papa e os bispos justamente sobre as questões relacionadas à família e à sexualidade, para buscar uma nova linguagem para falar à humanidade de hoje. Uma agenda que não se impôs à atenção dos eleitores.

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