12 Novembro 2019
"Na América Latina, estamos assistindo a instrumentalização do cristianismo para que grupos das velhas oligarquias retornem aos espaços políticos e implementem programas autoritários e neoliberais em detrimento do povo", afirma em nota pública o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil - CONIC. A nota é subscrita por outras organizações e se encontra no portal do CONIC, 11-11-2019.
Eis a nota.
“Deus acima de tudo” é usado por extremistas ao longo da história para a implantação de regimes econômicos e políticos autoritários e violentos. Os nazistas usaram, durante anos, o nome de Deus e elementos da fé cristã para justificar a sua ideologia e os seus crimes. No manifesto do partido nazista, Hitler chega a pedir que Deus abençoasse as armas alemãs [1].
Golpe na Bolívia. (Reprodução: Youtube)
Com integrantes da seita fundamentalista de extrema-direita Ku Klux Klan, na América do Norte, o enredo foi semelhante [2]. Para integrar o grupo, o membro devia ser cristão, além de branco e nascido nos EUA. Como forma de legitimar a seita, uma Bíblia era usada no batismo, e então trechos de Romanos 12 eram lidos, além de certos versículos selecionados e fora de contexto.
Na América Latina, estamos assistindo a instrumentalização do cristianismo para que grupos das velhas oligarquias retornem aos espaços políticos e implementem programas autoritários e neoliberais em detrimento do povo. A entrada com a Bíblia, no Palácio do Governo, do grupo que forçou Evo Morales a renunciar, representa o vínculo perigoso entre política autoritária e instrumentalização da religião.
A Bolívia é um país plurinacional, formado por uma população indígena que mantém sua cultura e suas tradições de forma vibrante. A bandeira Whipala é um dos símbolos da plurinacionalidade boliviana. Impor a Bíblia à força e realizar ações de violência contra as pessoas pobres e a população indígena, em nome do Deus cristão, é recuperar as práticas colonialistas [3] do passado[4].
A diferença é que, desta vez, o colonialismo é neoliberal e o deus que fundamenta esta prática é o do Mercado, não o Deus amoroso e misericordioso que conhecemos no Evangelho.
O Deus do Evangelho não ataca e nem violenta as múltiplas formas de espiritualidade de um povo. É um Deus que só reconhece a linguagem do amor. Como pessoas que desejam manter uma coerência mínima com a fé em Jesus Cristo, não podemos aceitar o ataque à democracia e a violência em nome de Deus nem na Bolívia, nem no Brasil, e em nenhum lugar do mundo.
Que a ordem democrática, alicerçada firmemente na laicidade, no plurinacionalismo que respeita as diversidades culturais e religiosas, retornem à Bolívia. Estamos atentos e vigilantes em relação à garantia da integridade do presidente Evo Morales, das lideranças populares e defensores dos direitos humanos. Ao povo boliviano, nossa solidariedade. Que sua bandeira Whipala volte a tremular.
Agencia Ecuménica de Comunicación - ALC
Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil - CONIC
Coordenadoria Ecumênica de Serviço - CESE
Fórum Ecumênico ACT Brasil - FE-BRASIL
Fundação Luterana de Diaconia - FLD
Koinonia – Presença Ecumênica e Serviço
Notas:
[1] Instituto Humanitas Unisinos - IHU
[3] Brasil de Fato
[4] Colonialismo e Genocídio no Congo Belga
Leia mais
- “Me dói abandonar o país”, diz Evo Morales rumo ao México
- Quem é Luis Fernando Camacho, o ‘Bolsonaro boliviano’ que despontou em meio à renúncia de Evo
- Uma análise de fundo a partir do golpe de Estado na Bolívia
- Insurreições de outubro. O mundo nas ruas
- Aliança de esquerda na Argentina celebra Fernández e Lula à sombra da crise na Bolívia
- Evo Morales x Carlos Mesa: 3 possíveis saídas para a crise política na Bolívia após a eleição presidencial
- Bolívia sitiada pelas paralisações
- Bolívia. Apuração preliminar mostra Morales à beira da vitória sem segundo turno
- Resultados preliminares indicam segundo turno na Bolívia
- Bolívia. A eleição mais árdua de Evo Morales
- Eleições de Argentina, Uruguai e Bolívia podem mudar a política regional
- Incêndios na Bolívia prejudicam Evo Morales a menos de dois meses das eleições
- Bolívia. Em busca do 4º mandato, Morales enfrenta oposição de 8 candidatos
- Bolívia. A carta da oposição. Uma sociologia do 'mesismo'
- Bolívia. Evo comemorou a sentença que permite sua reeleição
- Na Bolívia, improvável êxito
- Bolívia. Evo Morales inscreve chapa para tentar outra reeleição
- Bolivia 2019: masismo vs mesismo
- Bolívia. “Os conservadores honestos sabem que o País nunca esteve melhor”
- Bolívia. "Es el mandato del pueblo boliviano": el controversial fallo que permitirá a Evo Morales aspirar de forma ilimitada a la presidencia
- “Perder Evo Morales seria um suicídio político”, diz vice-presidente da Bolívia
- Bolívia. Post 21F: No a la intolerancia, sí a la democracia
- Bolívia. “Que o voto do povo decida”, sobre nova reeleição de Evo Morales
- Álvaro García Linera: La conformación histórica del sujeto político-popular en Bolivia
- Bolívia é o país que mais cresce na América Latina
- Como a Bolívia se tornou o país que mais cresce na América do Sul
- "Las relaciones entre Iglesia y Estado en Bolivia siguen siendo formales y frías"
- Bolívia. Assume o primeiro governo autônomo indígena
- Bolívia abre arquivos de ditaduras militares
- A Bolívia diante de seu novo desafio. Artigo de Atilio Boron
- Bolívia. Dez perguntas e 10 respostas sobre o conflito com os “cooperativistas” mineiros
- Guerras extractivistas en Bolivia
- Bolívia. “Havia uma conspiração política”, diz Morales
- Referendo na Bolívia. “Está em jogo o modelo de país”
- O caminho boliviano. Entrevista com Fernando Mayorga
- ‘Não’ à reeleição de Evo pode significar necessidade de ajustes no governo
- 'Socialismo é a radicalização da democracia', diz vice-presidente boliviano
FECHAR
Comunicar erro.
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Mais um golpe... em nome de Deus - Instituto Humanitas Unisinos - IHU