23 Mai 2017
O Papa Francisco surpreendeu duplamente no domingo com o anúncio da criação de cinco novos cardeais eleitores e com a inclusão na lista do bispo auxiliar de San Salvador, Gregorio Rosa Chávez (74 anos), principal impulsionador da causa de santidade (canonização) do bispo mártir salvadorenho beato Oscar Romero, de quem fora um estreito colaborador. O Papa fez o anúncio pessoalmente falando da janela de seu escritório romano e destacando a importância da internacionalidade do colégio cardinalício. “A proveniência de diversas partes do mundo manifesta a catolicidade da Igreja, espalhada pelo mundo inteiro”, disse Francisco.
A reportagem é de Washington Uranga e publicada por Página/12, 22-05-2017. A tradução é de André Langer.
Os novos cardeais serão formalmente criados no próximo dia 28 de junho. Quatro dos cinco novos cardeais vêm de países que terão, pela primeira vez, cardeais da Igreja católica romana. Dois procedem da Europa: Anders Arborelius (bispo de Estocolmo, Suécia) e Juan José Omella (arcebispo de Barcelona, Espanha). Os restantes são de Laos (Ásia), Louis-Marie Ling Mangkhanekhoun, vigário apostólico de Paksé; El Salvador (América Central), Gregorio Rosa Chávez, bispo auxiliar de San Salvador; e, Mali, Jean Zerbo (arcebispo de Bamako). Entre os designados não há nenhum funcionário da cúria romana.
Agora o grupo dos cardeais eleitores (menores de 80 anos) de um eventual sucessor de Francisco chega a 121. Desses, 49 foram nomeados diretamente pelo Papa Bergoglio. A nova geografia de quem está em condições de escolher, será: Europa 53 (24 italianos); Ásia e Oceania 19; América do Norte 13 (10 dos Estados Unidos e três do Canadá); América Latina 21 e África 15. Os europeus perderam a maioria (eram 60, entre eles 28 italianos, quando Francisco assumiu em março de 2013) e pela primeira vez têm presença cardeais de países que nunca antes participaram desta instância.
Gregório Rosa Chávez, o novo cardeal salvadorenho, tem uma história muito particular. Jornalista de profissão (é licenciado em Comunicação Social pela Universidade Católica de Lovaina, Bélgica), foi um colaborador próximo do bispo mártir salvadorenho Oscar Romero, que foi beatificado (um passo anterior à santidade) pelo Papa no ano passado. Rosa Chávez foi o principal promotor da causa de canonização de Romero e, também por este motivo, sofreu exclusões e marginalizações dentro da própria Igreja. Atualmente, preside a Cáritas, organização assistencial da Igreja, na América Latina e Caribe, e antes disso ocupou vários cargos relacionados com a comunicação social no Conselho Episcopal Latino-Americano (CELAM).
Entre 1995 e 2008, por decisão de João Paulo II, a Arquidiocese de San Salvador foi ocupada por Fernando Sáenz Lacalle, bispo da Opus Deis, que tomou medidas para limitar a ação de Rosa Chávez e fez de tudo para bloquear o processo de canonização de Romero. Mesmo assim, Rosa Chávez continuou com sua pregação, tanto em El Salvador como na América Latina. Foi Bergoglio, logo depois de ser eleito Papa e a pedido de Rosa Chávez, que destravou o caminho do bispo mártir à santidade.
A pedido de Gaspar, irmão do beato Romero, a Justiça salvadorenha reabriu recentemente o caso do bispo, assassinado em 24 de março de 1980. Em julho de 2016, a Suprema Corte salvadorenha anulou um decreto de anistia do presidente direitista Alfredo Cristiani que, em 1993, deixou sem efeito as condenações por crimes de lesa humanidade. A partir dessa decisão, recobrou a liberdade, entre outros, o capitão do Exército Álvaro Rafael Saraiva, único detido e processado pelo crime de Romero. O militar fazia parte do esquadrão da morte comandado pelo major da Guarda Nacional, Roberto D’Aubuisson. Enquanto celebrava a missa, o bispo foi baleado no coração, tiro que provocou sua morte instantânea. Um dia antes, do púlpito da catedral, Romero fez um apelo aos saldados para que desobedecessem às ordens de reprimir os camponeses que protestavam.
Em agosto próximo se celebrará o centenário do nascimento de Romero, e o atual presidente, Salvador Sánchez Cerén, solicitou recentemente ao Papa Francisco que faça coincidir essa data com a canonização do bispo mártir. Em março passado, após conversa com o Papa Francisco, o agora novo cardeal Gregorio Rosa Chávez recordou que Bergoglio disse que quer “uma Igreja pobre para os pobres, e que a Igreja para Romero era precisamente uma Igreja pobre e para os pobres, e lhe custou a vida”. O bispo salvadorenho disse também que “o Papa nos deu pistas para que não abandonemos esse sonho, porque nos ‘esfriamos’ em relação a esse ideal, fomos nos acomodando e é preciso recuperar essa utopia de dom Romero. E isso supõe ter alma de mártir, o que não é uma coisa de todos os dias”.
Sobre a santificação de Romero, o bispo Rosa Chávez afirmou que com o Papa Francisco “tocamos amplamente este tema e ele estava muito confortável com este futuro santo”. Acrescentou que Romero “é como o ícone que o Papa tem do que é um pastor e uma Igreja como ele sonha”. E, embora “ainda não haja data para a canonização, podemos dizer que tudo está indo bem e que o próprio Papa está com a esperança de fazê-la”.
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O Papa nomeia cardeal um discípulo de Romero - Instituto Humanitas Unisinos - IHU