10 Setembro 2018
Biagio Agnes gostava de repetir: "Quando o Papa fala os cardeais ficam em silêncio." A escolha de Francisco de não responder, pelo menos por enquanto, às graves acusações do ex-núncio apostólico nos Estados Unidos, monsenhor Carlo Maria Viganò, permitiu que tantos "cardeais", laicos e clérigos, externassem suas opiniões livremente, sem restrições. E como sempre acontece, tem aquele que quer parecer mais papista do que o Papa. Como oportunamente salientou o historiador Alberto Melloni, "que um idoso prelado, furibundo por não ter feito carreira, aninhe ressentimentos contra o Papa é o ‘abc’ do catolicismo romano. Que use os jornais para se vingar é um déjà vu, desde os dias em que o Cardeal Ottaviani confiava a Indro Montanelli documentos para difamar o papa João".
A reportagem é de Francesco Antonio Grana, publicada por Il Fatto Quotidiano, 09 -09-2018. A tradução é de Luisa Rabolini.
Nada de novo sob o sol, embora muitos tenham se apressado publicamente a mostrar enfurecimento diante das acusações do monsenhor Viganò. Nestas duas semanas após a denúncia do diplomata do Vaticano que pediu a renúncia de Bergoglio, assistimos a um espetáculo, no mínimo, indecente. Especialmente no mundo da mídia onde teve inclusive quem, na esperança de ganhar alguma cadeira no Vaticano, subiu na cátedra julgando-se um Salomão, como se seu carreirismo não fosse bem conhecido do Papa e dos seus colaboradores mais próximos.
Competições de solidariedade com o Pontífice pipocaram entre os bispos do mundo inteiro, como se para rezar por Francisco, como ele pede desde o instante de sua eleição, fosse necessário um ataque tão violento contra ele. O Arcebispo de Milão, monsenhor Mario Delpini, ressaltou a consideração que a arquidiocese tem por Bergoglio especificando, porém, que "nós também podemos discutir, mas toda discussão deve terminar assim: 'Nós queremos o bem do Papa Francisco'". Uma maneira, talvez não muito velada, de enfatizar algumas diferenças, porque Delpini, neste primeiro ano como arcebispo de Milão, não pareceu assumir a agenda pastoral de Francisco.
O que resta depois de duas semanas do violento e, sob alguns aspectos, vulgar ataque de monsenhor Viganò, é uma situação difícil para a continuação do pontificado de Bergoglio. Continua aquele terreno de areia movediça que começou com a conclusão do quinto ano na cadeira de Pedro, e a infeliz fake news que custou a cabeça do primeiro prefeito da Secretaria da Comunicações, Dom Dario Edoardo Viganò. Uma fake news que visava elogiar Francisco creditando-o como um teólogo da mesma dimensão de Bento XVI, algo que Bergoglio não é e nunca será. E que no final acabou se transformando em uma caricatura colossal à custa de ambos os Papas.
Alguns meses antes, em janeiro de 2018, o ano tinha se iniciado mal com a desastrosa viagem para o Chile, que trouxe como dramática consequência a demissão em massa de todos os bispos do país, incapazes de lidar com o escândalo da pedofilia no clero. Um flagelo abominável que nestes últimos tempos foi se agravando, especialmente nos EUA, e para o qual o Papa, como sempre, está respondendo prontamente e rigorosamente, aprendendo, como ele mesmo diz, com as vítimas.
No entanto, essas areias movediças do pontificado o mantêm ainda encalhado na véspera do Sínodo dos Bispos sobre os jovens e da virada de seu governo da Igreja para uma temporada nova e há muito aguardada. Além dos tantos Viganò que, mesmo sem colocar a cara, também gostariam da renúncia de Francisco, o Papa sempre manteve aquela serenidade que lhe permite não tirar a atenção da sua substancial reforma da Igreja.
Não por acaso Bergoglio, juntamente com seus colaboradores do Conselho dos Cardeais, está concluindo a redação da nova Constituição apostólica sobre a Cúria romana, Praedicate Evangelium, que em breve virá à luz. "A Igreja precisa de união, não de solistas fora do coro ou comandantes das batalhas pessoais", Francisco reiterou recentemente aos bispos dos territórios de missão. Uma união que não pode, para aqueles que se dizem católicos, ser construída independentemente do Papa. Uma Igreja de Roma acéfala ou até mesmo autocéfala, como no mundo ortodoxo, não existe e nunca existirá. Com todo o respeito pelos ‘sedevacanistas’ que logo gostariam de ver um novo Pontífice.
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O papa fica em silêncio enquanto os cardeais e os leigos atacam. Agora Francisco deve preparar uma virada - Instituto Humanitas Unisinos - IHU