Ciclo de estudos “Juventudes e o espírito do tempo e do espaço. Desafios tecnopolíticos e socioambientais”, promovido pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU, reflete sobre a policrise que afeta as juventudes: crise da saúde, a crise econômica, a crise relativa ao custo de vida e a crise da democracia. Katherine Smith, pesquisadora da Universidade de York, Reino Unido, ministra videoconferência nesta quinta-feira, 26-06-2025
O termo “policrise” remete a uma condição em que crises de diversas naturezas se manifestam simultaneamente e, mais do que isso, se retroalimentam, gerando efeitos complexos e de difícil resolução. Assim tem sido descrita, por exemplo, a crise de saúde mental que afeta as juventudes no mundo todo, associada, por especialistas de diferentes áreas do conhecimento, às crises econômica, social e política, mas também ao acesso desmedido às telas, redes sociais, videogames e ao isolamento.
No pós-pandemia de Covid-19, aumentaram as pesquisas sobre a relação entre policrise e juventude. Pesquisadores alertam para os efeitos que a inter-relação de diversas crises está causando nos jovens. Katherine Smith, professora de Política Social na Universidade de York, Reino Unido, pesquisa os efeitos de quatro crises na saúde mental das juventudes: a crise da saúde, a crise econômica, a crise relativa ao custo de vida e a crise da democracia. Ela também realiza pesquisas qualitativas com jovens, abordando temas como família, relacionamentos, apoio emocional e saúde mental. “Espero que uma maior compreensão das experiências de apoio e saúde mental das gerações mais jovens possa se traduzir em práticas e políticas públicas e, em última análise, ter um impacto positivo na vida dos jovens”, afirma ao comentar os estudos sobre o tema.
Katherine Smith (Foto: Reprodução Universidade de York)
Katherine Smith, formada em Pedagogia, mestre em Justiça Social e Educação e doutora em Educação pela Universidade de York, é a próxima conferencista do Ciclo de estudos Juventudes e o espírito do tempo e do espaço. Desafios tecnopolíticos e socioambientais, promovido pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU. Nesta quinta-feira, 26-06-2025, ela ministra a videoconferência “Juventude europeia e suas articulações políticas em tempos de profundas desigualdades”. O evento será transmitido na página eletrônica do IHU, nas redes sociais e no YouTube às 10h.
Estudo publicado em maio deste ano na revista The Lancet, com a participação de pesquisadores do Murdoch Children’s Research Institute (MCRI), trata da relação entre saúde e juventudes. Segundo dados do relatório, 24% da população mundial é formada por jovens, mas eles recebem somente 2,4% dos recursos globais de saúde. A previsão é de que até 2050, 70% dos jovens viverão em áreas urbanas, o que desperta preocupações em relação à pobreza, ao isolamento e à moradia precária. “Um mito comum é que os adolescentes são saudáveis e, portanto, não precisam de serviços de saúde. No entanto, nossas descobertas mostram que, em todos os países, os adolescentes precisam de acesso a serviços de saúde responsivos que possam identificar e responder confidencialmente às suas necessidades emergentes de saúde”, destaca Susan Sawyer, pesquisadora do MCRI. Segundo ela, o relatório traz informações atuais sobre o estado de saúde dos jovens e “as descobertas [do estudo] são alarmantes, exigem ação urgente e responsabilidade, em colaboração com os adolescentes, para criar espaços mais seguros e mudanças significativas”. O relatório foi lançado em 28 de maio deste ano, na 78ª Assembleia Mundial da Saúde da Organização Mundial da Saúde, em Genebra.
Na Espanha, a associação Cyber Guardians publicou, também no mês passado, o relatório “Vidas Digitais Mais Saudáveis”, no qual apresenta problemas de saúde mental ocasionados ao uso precoce de smarthpones e acesso irrestrito à internet. O que se observa, de acordo com o estudo, é um amento significativo de doença mental entre os jovens associado a esses fatores. “A doença mental entre jovens de até 20 anos na Espanha tem apresentado um aumento explosivo desde 2012, especialmente entre as meninas. Esse aumento culminou nos meses imediatamente posteriores ao início da pandemia de Covid-19, atingindo níveis recordes, com um aumento de 300% em comparação com 1997”, afirma o relatório.
Para a presidente da Associação de Saúde Pública de Madri (AMaSaP), Pilar Serrano, a situação revela “um problema de saúde pública” que precisa ser enfrentado a partir de uma “visão abrangente”. Segundo as orientações da AMaSaP, se as questões relativas à saúde mental não forem abordadas de forma ampla, as soluções serão “imperfeitas, devido aos determinantes sociais e estruturais, como desigualdades que impedem as crianças de terem tempo de lazer saudável longe das telas em seus bairros ou que seus pais possam exercer o controle parental porque raramente estão por perto devido às suas longas jornadas de trabalho”.
Segundo Marta Beltrán, chefe da Área Científica da Agência Espanhola de Proteção de Dados e pesquisadora da Universidade Rey Juan Carlos, entre as medidas a serem enfrentadas está a de regulamentar o setor de tecnologia. “Há regulamentações que eles devem cumprir, como o Regulamento de Proteção de Dados Pessoais, a Lei Geral da Comunicação Audiovisual, o Regulamento de Serviços Digitais, o Regulamento de Inteligência Artificial, e agora temos um projeto de lei abrangente para a proteção de menores online. Existem ferramentas, mas o setor precisa cumpri-las”, adverte.
No Brasil, pesquisadores também estão investigando os fatores que incidem sobre a saúde mental dos jovens. Hugo Monteiro Ferreira, pós-doutor em Estudos da Criança pela Universidade do Minho, Portugal, e doutor em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), autor de A Geração do Quarto: quando crianças e adolescentes nos ensinam a amar (Rio de Janeiro: Record, 2022), realizou uma pesquisa com 3.115 meninos e meninas, entre 11 e 18 anos, de cinco capitais brasileiras, e identificou “sérios problemas de saúde mental”.
A Geração do Quarto: quando crianças e adolescentes nos ensinam a amar (Foto: Divulgação)
Segundo ele, os jovens que “passam mais de seis horas dentro de seus quartos, se envolveram com bullying e/ou ciberbullying, apresentam comportamento autodestrutivo – autolesão sem intenção suicida, ideação suicida, tentativa de suicídio mais de uma vez –, apresentam quadro de sintomatologia psicopatológica – transtornos obsessivos compulsivos, transtornos alimentares, transtornos de ansiedade geral, síndrome do pânico, distúrbio do sono –, têm muita dificuldade de inter-relação face a face com os membros da família e utilizam excessivamente as redes sociais digitais”. Dos entrevistados, relata, “238 se envolveram com violência sistemática, tentaram se matar mais de uma vez, cortam a pele para aliviar a dor do psiquismo, não falam com mãe, com pai, mas usam as redes sociais de forma intensa e densa. Abusam do álcool, fazem sexo sem camisinha, adoram as redes e a internet, falam que não querem sair da casa dos pais. Estão muito tristes e falam sobre a tristeza como um sentimento desafiador”. A “geração do quarto”, contudo, pontua, não é restrita a esses marcadores etários, mas estende-se a adultos que também enfrentam sofrimento psíquico.
Na avaliação do pesquisador, “a geração do quarto na América Latina é produto de um profundo modelo social e econômico injusto, desumano, atrelado a modelos de convivência social baseado menos na cooperação e mais na competição, menos no respeito à alteridade e mais na tentativa de não compreender diferenças identitárias”.
O Ciclo de estudos Juventudes e o espírito do tempo e do espaço. Desafios tecnopolíticos e socioambientais tem como objetivo “debater, de forma transdisciplinar, aspectos sociológicos das juventudes, seus papéis e suas perspectivas no contexto contemporâneo de transformações políticas, ecológicas e econômicas”.
A atividade é gratuita e aberta ao público. Será fornecido certificado a quem se inscrever e, no dia do evento, assinar a presença por meio do formulário disponibilizado durante a transmissão. Inscreva-se aqui. A programação completa do ciclo está disponível na página do evento. Assista as quatro conferências ministradas neste semestre no Canal do IHU no YouTube.