A dimensão comunitária do ministério presbiteral: reflexões a partir do decreto Presbyterorum Ordinis. Artigo de Eliseu Wisniewski

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03 Abril 2023

"Um tema desafiador para o presbítero: a dimensão comunitária. Na crise do compromisso comunitário e da tentação de fazer carreira solo Sandro Ferreira servindo-se do método da hermenêutica teológico-pastoral, com enfoque na pesquisa bibliográfica e histórico-documental, apresenta a compreensão teológica-eclesial do presbiterado, abordando as principais linhas que orientam o ministério presbiteral a partir do decreto Presbyterorum Ordinis e a dimensão relacional do ministério presbiteral a partir dos números 7, 8, 9 deste decreto", escreve Eliseu Wisniewski, presbítero da Congregação da Missão (padres vicentinos), Província do Sul, mestre e doutorando em Teologia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR).

Eis o artigo.

Juntamente com os bispos, com os outros presbíteros e com os cristãos leigos, os presbíteros devem exercer seu ministério em comunhão, fraternidade e promovendo a unidade. Mas como viver esse ministério em uma dimensão de comunhão hoje? Como relacionar-se com os outros de maneira frutuosa, à luz da fé, do magistério da Igreja e dos desafios de nossa sociedade? Olhar para essa realidade e pensá-la tendo por base o decreto Presbyterorum Ordinis, do Concílio Vaticano II, é a proposta de A dimensão comunitária do ministério presbiteral: reflexões a partir do decreto Presbyterorum ordinis (Paulus, 2022, 264 p.), que é um recorte da pesquisa de doutorado do Pe. Sandro Ferreira, e que tanto pode nos ajudar a pensar o ministério presbiteral nesse aspecto da comunhão.

A dimensão comunitária do ministério presbiteral: reflexões a partir do decreto Presbyterorum ordinis. (Paulus, 2022, 264 páginas) | Foto: divulgação

Sandro Ferreira é doutor em Teologia Dogmático-Sacramentária pelo Pontifício Ateneu Santo Anselmo, em Roma; mestre em Teologia pela PUCPR (campus Curitiba); e bacharel em Teologia, pela PUCPR (campus Londrina), e em Filosofia, pelo Instituto Filosófico Arquidiocesano de Maringá. É presbítero da arquidiocese de Maringá-PR, na qual leciona no Seminário Propedêutico Santo Cura d’Ars, é orientador espiritual do Seminário de Teologia Santíssima Trindade e vigário da paróquia São João Batista em Jandaia do Sul-PR. Desenvolve pesquisas na área de teologia dos sacramentos, com ênfase nos ministérios ordenados.

O referido autor ressalta que para refletir a dimensão comunitária do ministério presbiteral à luz do decreto Presbyterorum Ordinis nos números 7, 8, 9, organizou seu trabalho em um trajeto que visa a profundar a compreensão do ministério presbiteral presente em Presbyterorum Ordinis, a partir da história da sua redação e de seus novos paradigmas; compreender a dimensão teológica do ministério presbiteral, tendo Cristo como modelo e paradigma para o agir do presbítero e ressignificar as relações do presbítero com o bispo, com os outros presbíteros e com os cristãos leigos sob a ótica deste decreto.

Na primeira parte, O decreto Presbyterorum Ordinis e os novos paradigmas do presbiterado (p. 25-102), Ferreira apresenta o percurso conciliar do processo de redação do decreto Presbyterorum Ordinis (p. 26-27) – marcado por muitas intervenções orais e escritas – e o modo como, progressivamente, o tema desse Decreto foi amadurecendo entre os padres conciliares, a ponto de provocar novos paradigmas – ou recuperar compreensões existentes nos primeiros séculos do cristianismo – na concepção teológica sobre o ministério e a vida dos presbíteros (p. 27-69).

Para isso, observa que para melhor compreendermos o processo de redação deste decreto, é importante destacar que o tema sobre o presbiterado já havia sido tratado pelo Concílio Vaticano II na Constituição Lumen gentium, por isso, a elaboração deste decreto – com os seus diversos esquemas, ou seja, as versões preliminares que foram feitas até que se chegasse ao texto final – reflete e amadurece a teologia do presbiterado, tendo presentes os princípios teológicos já presentados na Lumen gentium. Assim sendo, em relação ao modelo adotado pelo Concílio Vaticano II, o autor destaca: o uso da terminologia in persona Christi ao invés do termo alter Christus (p. 70-79); a compreensão de que o tríplice múnus é inerente ao sacramento da ordem, superando, assim, a concepção de dupla potestas (p. 79-86); e a predominância da perspectiva missionário-comunitária no lugar da visão cultual-sacerdotal (p. 86-95). Tais mudanças apontam para um novo modelo de presbítero, no qual se ressaltam a perspectiva da comunhão e a valorização dos múnus de ensinar, santificar e governar.

Na última parte deste capítulo, Ferreira apresenta alguns limites contidos neste decreto, seja pela falta de tempo durante as sessões conciliares, ou – talvez a razão mais provável – porque o Concílio tenha se concentrado com maior ênfase na reflexão sobre a teologia do episcopado e não tenha dedicado suficiente atenção à teologia do presbiterado, há críticas em relação à terminologia, ao conteúdo e ao modo como certos temas são tratados no decreto Presbyterorum Ordinis (p. 95-101).

Na segunda parte, intitulada A compreensão teológico-eclesial do presbiterado (p. 103-166), o autor aborda a compreensão teológico-eclesial do ministério presbiteral a partir da perspectiva da comunhão. Esclarece que, antes de adentrar especificamente nos números 7, 8, 9 do Presbyterorum Ordinis que tratam sobre as relações no ministério presbiteral, versa sobre alguns temas gerais tratados pelo decreto e que fundamentam, juntamente com os números supracitados, a teologia do presbiterado. Assim, a partir dessa base teológica, segundo o autor, poderemos compreender melhor a dimensão relacional do ministério presbiteral. Assim sendo, a reflexão desenvolve-se a partir da perspectiva bíblica, cristológico-trinitária e eclesiológica e espiritual.

Do ponto de vista bíblico, Ferreira aborda, a partir do Novo Testamento, os ministérios no período apostólico – com ênfase para os doze apóstolos (p. 105-119) e nas primeiras comunidades cristãs – com ênfase pra os presbíteros-epíscopos (p. 119-127); em seguida, o autor, trabalha o modo como a carta aos Hebreus compreende o sacerdócio de Cristo, visto que os demais textos bíblicos jamais aplicam a terminologia sacerdotal a Jesus (p. 127-135). Em um segundo momento, apresenta as dimensões cristológico-trinitária (p. 135-142) e eclesiológica do ministério presbiteral (p. 142-147). Observa que são duas dimensões que se complementam, pois os presbíteros, como participantes da missão de Cristo, são chamados e enviados por ele para continuar sua missão de anúncio e pregação do Reino de Deus. Essa missão se realiza, de forma especial, na Igreja particular, em comunhão com o bispo, com o presbitério e com a comunidade eclesial, na qual o presbítero é chamado a ensinar, santificar e apascentar o povo de Deus.

Por fim, neste capítulo Ferreira sob o ponto de vista teológico-eclesial, reflete sobre a espiritualidade presbiteral (p. 147-152). A partir da perspectiva conciliar, de que o exercício do ministério é o meio ordinário para santificação – palavra usada no decreto Presbyterorum Ordinis para se referir à espiritualidade – do presbítero, o autor apresenta a caridade pastoral (p. 153-160) como elemento unificador da vida e da ação dos presbíteros, bem como a relevância de valorização de outros meios oferecidos pela Igreja para fortalecer a espiritualidade cristã e que visam a maior comunhão intimidade com Cristo (p. 160-166).

Na terceira parte, intitulada As relações no ministério presbiteral a partir do decreto Presbyterorum Ordinis (p. 167-235), Ferreira reflete especificamente sobre o conteúdo dos números 7, 8, 9. Assim, tendo por base a história do decreto e a teologia do presbiterado apresentada em Presbyterorum Ordinis, o autor detém-se nas orientações e particularidades desses três números, bem como na visão conciliar a respeito das relações que englobam o ministério presbiteral.

Ferreira nota que, de acordo com o número 2 do Presbyterorum Ordinis, os presbíteros não são compreendidos de forma individualista, mas comunitária, pois estão unidos sacramentalmente à ordem episcopal, e seu ministério se desenvolve em comunhão com todo o corpo eclesial – os ministros ordenados e os cristãos leigos. Esses pontos, acenados em Presbyterorum Ordinis n. 2 e Lumen gentium n. 28, são tratados de maneira mais específica nos números 7, 8, 9 de Presbyterorum Ordinis como elementos constituintes do presbiterado. Esses números se encontram no segundo capítulo do decreto e se referem às relações que os presbíteros desenvolvem com as pessoas que os circundam em seu ministério, ou seja, os bispos, os outros presbíteros e os cristãos leigos. Nesse sentido, o autor ressalta que esse tríplice vínculo que caracteriza o ministério presbiteral deve ser vivido de forma comunitária, pois, segundo o número 7 de Presbyterorum Ordinis – nenhum presbítero pode realizar suficientemente a sua missão, isoladamente, mas só num esforço comum com os outros presbíteros, sob a direção dos que estão à frente da Igreja, e com os cristãos leigos, com os quais deve trabalhar em comunhão, reconhecendo e promovendo a sua dignidade e participação na missão da Igreja.

Especificamente neste capítulo, Ferreira baseando-se em cada um dos três números do Presbyterorum Ordinis discorre sobre o relacionamento dos presbíteros com o bispo, dos presbíteros entre si, e deles com os cristãos leigos. Em relação ao primeiro aspecto, Ferreira reflete a respeito dos presbíteros enquanto cooperadores da ordem episcopal (p. 169-178), da concelebração (p. 178-185), do Conselho Presbiteral (p. 185-190) e também da relação fraterna que deve haver entre eles (p. 190-200); acerca do relacionamento dos presbíteros entre si, o autor sublinha que a fraternidade que os une é de caráter sacramental (p. 200-204), manifestando-se no presbitério e também na imposição das mãos realizada na ordenação sacramental (p. 204-208), e concretizando-se na vida comum e nas associações de presbíteros (p. 208-215); no que tange ao relacionamento com os cristãos leigos, Ferreira destaca que os presbíteros são, para eles, pais e mestres, mas, com eles, são irmãos entre irmãos (p. 216-223) e, por isso, devem reconhecer a dignidade batismal dos cristãos leigos, assumindo que eles são corresponsáveis na missão evangelizadora da Igreja (p. 223-229), e dispensando cuidado e atenção também para com os cristãos afastados e os não cristãos (p. 229-235).

Um tema desafiador para o presbítero: a dimensão comunitária. Na crise do compromisso comunitário e da tentação de fazer carreira solo, Sandro Ferreira, servindo-se do método da hermenêutica teológico-pastoral, com enfoque na pesquisa bibliográfica e histórico-documental, apresenta a compreensão teológica-eclesial do presbiterado, abordando as principais linhas que orientam o ministério presbiteral a partir do decreto Presbyterorum Ordinis e a dimensão relacional do ministério presbiteral a partir dos números 7, 8, 9 deste decreto.

Certamente essa reflexão contribuirá para que os presbíteros compreendam mais e melhor sua imprescindível relação, cooperação e unidade com o bispo; redescubram que a intima fraternidade que os une possui caráter sacramental, sendo, portanto, inerente ao sacramento da ordem, e cujo, testemunho no presbitério não é fruto de uma escolha pessoal, mas elemento constitutivo do sacramento recebido; e que, na comunidade eclesial, os presbíteros possam ser verdadeiramente sinais de unidade e de comunhão com os cristãos leigos, valorizando-os e incentivando-os a assumirem a sua missão na Igreja.

Convidando o leitor a refletir sobre o ministério presbiteral na perspectiva da comunhão, sem dúvida, as páginas desta obra nos colocam em sintonia com a eclesiologia do papa Francisco e apontam para uma Igreja sinodal.

Esta obra vale também como questionamento para que os presbíteros possam refletir sobre o modo como estão vivendo a dimensão comunitária entre si e com as outras pessoas com as quais exercem o seu ministério. Os bispos são motivados a rever suas atitudes na questão do cuidado que eles são chamados a praticar com os presbíteros. Os presbíteros são chamados, ainda, a dar verdadeiro testemunho de unidade e de comunhão com os cristãos leigos, como pastores nas funções de ensinar, santificar e governar o povo a eles confiados, para que, assim, possam colaborar com a edificação do Reino de Deus.

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