01 Fevereiro 2023
Jason Stearns descreve o papel central desempenhado historicamente pela Igreja também no espaço político.
A entrevista é de Jason Stearns, diretor do Groupe d'étude sur le Congo, editada por Christophe Châtelet e publicada por Le Monde, 31-01-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.
O Papa Francisco viaja, na terça-feira, 31 de janeiro, à República Democrática do Congo (RDC), país da África central, onde cerca de 40% da população é católica. Jason Stearns, diretor do Groupe d'étude sur le Congo, descreve o papel central desempenhado pela Igreja, também no espaço político, poucos meses antes das eleições presidenciais previstas para o país para o final de dezembro.
Eis a entrevista.
O que esperar da visita do Papa Francisco à República Democrática do Congo?
Simbolicamente, esta visita é muito importante. Certamente o papa falará da miséria do povo congolês, da guerra e da democracia na RDC para cujo surgimento a Igreja contribuiu muito. Mas expressará um pedido específico ou uma denúncia específica? Provavelmente não. Em relação ao processo eleitoral na RDC, não espero nada mais do que um apelo ao respeito pela transparência.
A situação atual é muito diferente daquela que prevalecia antes das eleições presidenciais de 2018. Na época, aparecia no horizonte uma crise democrática: o regime [do presidente Kabila] não queria ceder o poder e estava pronto para comprometer as bases da democracia. A Igreja mobilizou-se nas ruas, em nível diplomático e político para facilitar a mediação entre oposição e poder. Desempenhou um papel chave para impedir que Kabila mudasse a Constituição.
Este ano, o Presidente Félix Tshisekedi aspira a um segundo mandato e a Constituição autoriza isso. A grande batalha terá lugar ao nível das operações de votação e de apuração. Em 2018, a Igreja Católica implantou a maior missão de observação eleitoral na RDC. Provavelmente será a mesma coisa desta vez também. Também pressionará a comissão eleitoral, a CENI, para cumprir as suas promessas, em particular sobre a publicação dos resultados de cada uma das seções eleitorais.
Mapa da África destacando a República Democrática do Congo (Foto: Wikimedia Commons)
Qual é o papel da Igreja Católica na vida pública, fora do processo eleitoral?
A Igreja foi uma das protagonistas do surgimento da democracia na RDC: primeiro, por ocasião da independência em 1960, depois com Mobutu [1965-1997], durante a abertura democracia dos anos 1990 e, finalmente, no processo democrático a partir da criação da Terceira República em 2006. Inspirada na teologia da libertação da América Latina, a Igreja chama os fiéis a se envolverem.
Na RDC, a política faz as pessoas sofrerem. O país, que é o maior produtor mundial de cobalto e o maior produtor de cobre da África, é malgovernado. Não é segredo: é dominado, desde a independência, por uma pequena elite que atende seus próprios interesses sem preocupação com o bem-estar da população. É por isso que a Igreja participa da vida política, às vezes contra o parecer dos altos escalões. Kabila expressou-o explicitamente ao dizer que "não cabe à Igreja misturar-se na política".
A Igreja pode desempenhar um papel na solução da crise no leste do país?
A Igreja faz muitas declarações sobre o assunto, mas mobiliza pouco, com exceção de algumas marchas ou conferência de paz. O estado congolês tem uma grande responsabilidade na guerra no leste. Como é possível que um exército de mais de 130.000 homens não consiga desmantelar grupos armados que não superam alguns milhares de soldados?
A Igreja possui um imenso patrimônio, sobretudo imobiliário. Isso não a torna dependente do estado e não limita sua ação?
Desde a criação do Congo Belga, a Igreja tem sido o principal parceiro do estado colonial, especialmente nas áreas de educação e saúde. Esse legado é visível: ainda hoje, o estado repassa uma parte da educação e da saúde à Igreja Católica. Que continua sendo um dos principais proprietários de terras da RDC e presta muitos serviços à população.
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"A Igreja foi um dos protagonistas-chave do surgimento da democracia na República Democrática do Congo" - Instituto Humanitas Unisinos - IHU