Tobin sobre o Amoris: bispos devem aceitá-lo e cooperar

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23 Novembro 2016

O novo cardeal Joseph Tobin, de Newark, disse à Crux, na segunda-feira, que os bispos norte-americanos devem se reunir e elaborar uma estratégia sobre o documento papal Amoris Laetita e suas resoluções sobre a comunhão para católicos divorciados e civilmente recasados, ao invés de individualmente pedir esclarecimentos ao Papa.

A entrevista é de John L. Allen Jr., publicada por Crux, 21-11-2016. A tradução é de Luísa Flores Somavilla.

Eu sempre disse que uma das melhores maneiras de saber se você está ficando velho na Igreja Católica é quando os caras com quem você saía em bares e restaurantes romanos começam a ser nomeados bispos. Seguindo esse padrão, eu suponho, o teste para saber quando se está ficando muito velho, é quando esses mesmos caras tornam-se cardeais.

Essa foi a minha experiência no sábado, ao assistir Joseph Tobin se tornando membro do clube mais exclusivo da Igreja.

Conheci o então Padre Tobin na década de 90, quando ele era o superior geral da ordem redentorista mundial, e nós continuamos amigos mais de uma década depois, quando ele foi trabalhar no Vaticano no segundo posto mais importante da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica, mais conhecida como a "Congregação dos Religiosos".

Eu sempre admirei o equilíbrio, a inteligência e a capacidade de adaptação cultural de Tobin, e essas devem ser as mesmas razões pelas quais o Papa Francisco surpreendeu quase todo mundo - inclusive Tobin - ao nomeá-lo cardeal.

Em termos políticos convencionais, Tobin é geralmente visto como uma figura de centro-esquerda, bastante alinhado com o Papa. Durante seu mandato no Vaticano, ele ficou conhecido por seu interrogatório aberto de duas investigações de religiosas norte-americanas - comentários estes que alguns analistas acreditam terem custado seu emprego e que ajudam a explicar por que os amigos veem a investidura de sábado como uma questão de equilíbrio cármico.

Tobin sentou-se comigo e com minha colega da Crux Inés San Martín, na segunda-feira, em Roma, para uma entrevista para o nosso programa de rádio "Crux of the Matter", transmitido no Canal Católico Sirius XM 129. Entre outras coisas, falamos sobre a sintonia - ou não - dos bispos norte-americanos com o Papa, bem como sobre insinuações recentes de que ele precisa esclarecer de alguma forma o seu recente documento sobre a família e as suas resoluções a respeito da comunhão para católicos divorciados e recasados ​​civilmente.

Sobre isso, Tobin foi bem direto: ao invés de exigir que o Papa responda cada pergunta feita a ele, disse Tobin, talvez os bispos devessem aceitar o documento e fazer o seu trabalho de pensar, em conjunto, formas de implementar seu projeto.

Eis a entrevista.

Acredito que nos conhecemos quando você era Superior Geral dos Redentoristas, certo?

Sim, exatamente. Há uns bons 10 ou 15 anos.

O último mês foi, para dizer o mínimo, um momento interessante em sua vida. Primeiro veio a nomeação a cardeal, em seguida, você descobre que vai se mudar de Indianápolis para Newark, e no meio de tudo isso teve o encontro da Conferência dos Bispos. Pode-se dizer que foi um dos momentos mais ativos da sua vida?

Eu provavelmente usaria uma palavra menos generosa do que "ativo", principalmente porque eu fazia parte do Teamster (sindicato dos EUA e do Canadá) antes de ser padre!

Este é um programa de família... Não sei se podemos começar a usar o vocabulário do Teamster.

Exatamente... pergunte em off e eu conto como realmente foi o mês passado!

Não vou enganá-lo, porque tem sido muito difícil, mesmo espiritualmente. É interessante, porque, após o anúncio dos cardeais, lemos o Livro de Êxodo sobre quando Amalec sai para lutar contra Israel e Moisés levanta suas mãos na batalha e, no fim, teve de ser apoiado por Aarão e Hur.

Foi a primeira vez que eu percebi isso, mas levantar as mãos é geralmente uma atitude de oração, de súplica. Percebi que todos passam por momentos em que estão enfrentando certas situações na vida em que rezar torna-se difícil, se não impossível, acredito. Em algumas ocasiões nestas últimas semanas eu vivi isso, mas a Igreja ergueu os meus braços.

Por exemplo, na Liturgia das Horas, eu não fui deixado com meus próprios recursos espirituais e tive uma demonstração do quanto são importantes a comunidade e as tradições da nossa Igreja.

Isso me ajudou a passar por isso, juntamente com o meu entendimento da minha vocação na vida, meu modo de viver meu batismo como missionário. O que inicialmente me atraiu para os Redentoristas era o desejo de ser missionário. Certamente, a incerteza, a mobilidade e o desprendimento exigidos de mim, que eu adianto que serão fundamentais nas próximas semanas, são um pouco característicos dos missionários.

Desculpe-me por dizer isso, mas não vai ser apenas nas próximas semanas... e sim pelo resto de sua vida!

Talvez meu cérebro só consiga assimilar esses pequenos intervalos de tempo, mas sim...

Eu acho que a outra parte é que eu acreditava, por acompanhar pessoas por muitos anos, que a fé pode ser muitas coisas, mas com certeza não é um narcótico. Ela não nos entorpece perante o sofrimento, e sair de Indianápolis também é um sofrimento, acredito que tanto para mim quanto para as pessoas. Deus estabeleceu grandes laços de afeto e cooperação entre nós, e ver isso se desmantelando é difícil.

Quando o Papa anunciou sua nomeação como cardeal, foi uma surpresa para você?

Com certeza.

Você recebeu algum tipo de aviso sobre a transferência para Newark?

Recebi uma declaração. Não foi uma pergunta. O núncio papal, um homem muito legal, me ligou e disse: 'Arcebispo Tobin?' Eu disse, 'Sim', e meus joelhos começaram a tremer. Sabe, o núncio não liga só para ver se você está tendo um bom dia. Ele disse, 'Estou ligando porque o Santo Padre o nomeou Arcebispo de Newark. Vou informar o Arcebispo [John] Myers e depois vocês dois devem conversar sobre a transição."

Você nem sequer foi perguntado se aceitava a nomeação?

Não, e talvez era assim que tinha que ser. Na minha vida, descobri que a obediência pode ser muito libertadora; em geral, pode ser libertador não dar a palavra final sobre tudo o que faço. Eu vou dizer que essa é provavelmente a parte mais difícil destes convites, digamos.

Deixe-me perguntar sobre a reunião dos bispos, antes de chegarmos a Newark. Há comentários de que os bispos norte-americanos não estão em sintonia com o Papa Francisco. Qual a sua leitura sobre isso?

Acho que seria desonesto da minha parte dizer que não há pessoas que têm algum problema com o Santo Padre e sua maneira de propor as coisas, e talvez inclusive seu conteúdo. Eu acho que essas tensões podem ser criativas ou destrutivas. Eu gosto de dizer que não quero viver sem nenhuma tensão...

Acho que o Papa resolveu esse problema para você!

Sim, com certeza. Mas o que eu quero mesmo, até onde posso falar a respeito disso, é que as tensões na minha vida sejam criativas. Por exemplo, não se pode tocar piano, se não houver tensão nas cordas; não se pode falar ou cantar, se não há tensão nas cordas vocais. Por outro lado, a tensão de um terremoto faz edifícios desabarem.

Acho que o que está acontecendo, pelo menos nas ideias do filho mais velho da Dona Tobin, é que o Papa Francisco está tentando promover uma maior ênfase na sinodalidade entre os bispos. A relação primária não é simplesmente entre os bispos locais e o Bispo de Roma, mas há esse tipo de locus regional para a obra do Espírito Santo entre os bispos de uma determinada área. Parece arriscado - e é -, porque pode gerar uma espécie de chauvinismo ou nacionalismo que, por algumas vezes, já prejudicou a Igreja, mas em outros momentos foi muito útil. Pense nos primeiros concílios regionais, ou no capítulo 15 dos Atos dos Apóstolos.

Além das questões que talvez os bispos tragam, ou que provocam discussão, ou a narrativa que coloca uns contra os outros, acho que o que nós estamos tentando encontrar é uma maneira de falar uns com os outros como bispos - não apenas para encontrar um denominador comum, mas sim para exercitar o discernimento, sendo fieis às afirmações autênticas do magistério e dizendo, 'Bom, como se vive isso nesta área?'.

Você usou a palavra "problema" agora há pouco, e quatro de seus Irmãos Cardeais recentemente escreveram ao Papa Francisco pedindo esclarecimento sobre o que eles veem como um problema ou uma confusão relacionada ao Amoris Laetita e as suas disposições sobre a comunhão a divorciados e recasados civilmente. Você acha que houve alguma confusão ou você tem convicção de que está claro?

Não pude estudar a declaração dos quatro cardeais, pois isto aconteceu durante a Conferência dos Bispos e, como você salientou anteriormente, eu tive outros compromissos naqueles dias. Acho que seria desrespeitoso comentar sobre coisas que eu realmente não estudei.

Não estou pedindo para você comentar sobre a carta, mas sobre Amoris Laetitia: você tem convicção de que a linguagem utilizada na parte dos divorciados e recasados civilmente seja suficientemente clara?

Eu acho. E já disse isso recentemente em outras ocasiões, que seria realmente útil que nós como bispos aceitemos o documento e façamos o que tem que ser feito, ao invés de cada bispo ou cardeal exigir que o Papa se pronuncie sobre cada aplicação concreta do magistério. Isso significa reunir-se, desenvolver um processo e, se esse grupo precisar de mais luz do Santo Padre, aposto que ele estaria disposto a dar.

Você acha que o fórum adequado para isso é a Conferência dos Bispos?

Sim, eu acho. Claro, para a conferência funcionar bem, não se pode pôr 300 bispos sentados e dizer: 'o que vocês querem fazer?' Precisamos desenvolver um processo dentro de nós. De alguma forma, isso acontece na conferência, pois nós debatemos regionalmente, pelo menos por alguns momentos no decorrer da reunião.

Talvez seja necessário pensar em uma reunião de negócios, que não acontece apenas uma vez por ano. Você sabe, eu não sou alguém que acredita no princípio estético do 'Encontrar Jesus, através de reuniões!' Mas eu realmente acho que, especialmente no fluxo que estamos vivendo no mundo todo, precisamos falar e ouvir uns aos outros.

Você mencionou a sua mãe há alguns momentos. Você a trouxe com você para este consistório, não foi?

Tentei convencê-la de não se envolver. Ela tem 93 anos de idade, criou 13 crianças bem grandes, e eu não tinha certeza de que uma viagem transatlântica e todo o caos de uma celebração romana como esta seria a melhor coisa para ela. Mas ela queria vir, então ela está aqui, assim como 11 dos meus 12 irmãos.

Ela já teve a chance de conhecer o Santo Padre pessoalmente?

Não, e eu lamento por isso, porque eu brinco com minha mãe dizendo: 'acho que ele quer chegar até você através de mim!' Desde que nos encontramos pela primeira vez, ele sempre pergunta como minha mãe está e pergunta: 'ela reza por mim?' Eu sempre lhe digo: 'sim'.

Lembro-me de quando eu era superior geral e podia entrar na pequena recepção informal após a missa diária de São João Paulo II com a minha mãe. O Papa muito graciosamente recebeu um pequeno grupo de pessoas e eu a apresentei e disse algumas coisas, mas estranhamente ela estava estupefata e não conseguiu dizer nada. Quando chegamos lá fora perguntei: 'o que houve?'

Ela disse: "Joe, toda a minha vida o Papa tem me acompanhado em uma foto na minha parede, ou uma pequena imagem no meu livro de orações. Mas ele estava sentado bem na minha frente... o que você esperava que eu dissesse?"

Você passou 18 anos em Roma, com os Redentoristas e, em seguida, mais tempo no Vaticano, na Congregação dos Religiosos. Esta semana foi como em um retorno à sua casa?

Para mim, Roma não está simplesmente nos monumentos ou nos grandes locais de peregrinação religiosa, mas está nos meus amigos, incluindo os meus amigos italianos, e tem sido ótimo poder compartilhar tudo isso com a minha família. Tivemos uma noite excelente na Igreja Redentorista, aqui em Roma, onde a imagem de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro é reverenciada. Havia muita gente conhecida, algumas pessoas cujos casamentos eu celebrei e que agora têm bebês e crianças. Compartilhar isso tudo com eles significa muito para mim.

Quais as suas expectativas em Newark?

Estou e estarei aprendendo sobre a arquidiocese por um tempo. Uma das características mais atraentes para mim é que a Eucaristia é celebrada em 22 línguas em Newark e há uma grande presença de imigrantes e refugiados. Gosto dessas coisas desde que era criança, no sudoeste de Detroit... outras culturas, outras línguas, outras formas de pensar sempre me fascinaram.

Além disso, isso me ensina a ser humilde, porque eu sei que é preciso tirar seus sapatos quando se está andando sobre a cultura dos outros. Isso é a terra santa. E eu acho isso incrível, esforçar-me e dar o meu melhor nesta arquidiocese multicultural.

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