Fratelli Tutti: Papa Francisco convida ao perdão e à reconciliação. Entrevista especial com Agbonkhianmeghe Orobator

A encíclica indica uma fraternidade autêntica que cria uma família de nações, baseada na hospitalidade e na gratuidade, explica o teólogo

Reprodução da obra do muralista Kobra

Por: Patricia Fachin e João Vitor Santos | Edição: Ricardo Machado | 13 Outubro 2020

Francisco, o papa, parafraseia Francisco, o de Assis, no título de sua mais recente encíclica, Fratelli Tutti, em que recupera a fraternidade como valor central das relações não somente entre os humanos, mas entre os humanos, todas as demais espécies e o planeta. Nesse sentido o documento é, ao mesmo tempo, o testemunho de um mundo ferido e uma lúcida proposição de caminhos para enfrentarmos os dilemas contemporâneos a partir de uma visão que tem o amor e o cuidado aos mais vulneráveis como pano de fundo. 

 

O jesuíta Agbonkhianmeghe Orobator, na entrevista concedida por e-mail à IHU On-Line, analisa a nova encíclica do papa Francisco. Para Orobator, o "Papa Francisco promove a fraternidade e a amizade social em nosso contexto atual para nos lembrar que somos uma família comum e com um propósito comum; daí o imperativo de construirmos uma comunidade de solidariedade e pertença".

 


Agbonkhianmeghe Orobator (Foto: jesuitespao.com)

Agbonkhianmeghe E. Orobator é presidente da Conferência dos Superiores Maiores Jesuítas de África e Madagáscar - Jesam, com sede em Nairobi, no Quênia. Nascido na Nigéria, é doutor em Teologia e Estudos Religiosos pela Universidade de Leeds, na Inglaterra. Atuou como superior provincial da Província da África Oriental entre 2009 e 2014. Também foi diretor da Hekima University College – Escola Jesuíta de Teologia e do Instituto de Estudos de Paz e Relações Internacionais, em Nairobi, Quênia. É autor de Theology Brewed in an African Pot (Orbis, 2008) e Religion and Faith in Africa: Confessions of an Animist (Orbis Books, 2018). Ainda editou Reconciliation, Justice, and Peace: The Second African Synod (Orbis, 2011) e, junto com Linda Hogan, também editou Feminist Catholic Theological Ethics: Conversations in the World Church (Orbis, 2014).

 

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Para discutir o novo documento papal, o Instituto Humanitas Unisinos - IHU promove a palestra virtual Encíclica Fratelli Tutti: uma leitura francisclariana, com Prof. Dr. Ildo Perondi - PUCPR e Prof. Dr. Luiz Carlos Susin - PUCRS, na quinta-feira, 08-10-2020.

Na sexta-feira, 09-10-2020, o cardeal português José Tolentino de Mendonça ministrará a conferência virtual Pandemia, um evento global. Repensar o futuro da casa comum a partir da Encíclica Fratelli Tutti

 

Confira a entrevista.

 

IHU On-Line – Qual é a mensagem central da Encíclica Fratelli Tutti e que reflexões ela propõe para cristãos e não cristãos? Quais são os três pontos que destacaria do texto?

Agbonkhianmeghe Orobator - O Papa Francisco promove a fraternidade e a amizade social em nosso contexto atual para nos lembrar que somos uma família comum e com um propósito comum; daí o imperativo de construirmos uma comunidade de solidariedade e pertença. A fraternidade reside em uma cultura de encontros autênticos cuja condição prévia é a abertura criativa ao outro.

Francisco propõe um caminho novo na direção de uma cultura de fraternidade fundada em um “encontro misericordioso” e amor usando o exemplo do Bom Samaritano. A fraternidade universal forja um laço social renovado de solidariedade que cuida dos pobres e vulneráveis para além de fronteiras estreitas, interesses e preconceitos.

Para o Papa Francisco, o amor sem fronteiras transforma a humanidade em uma comunidade ilimitada de pessoas próximas que transcendem o Eu e criam uma solidariedade de serviço pelo outro.

 

 

IHU On-Line – Que relações o senhor percebe entre a Encíclica Fratelli Tutti, a Laudato Si', o recente discurso do Papa Francisco na ONU e seus pronunciamentos acerca da economia e da justiça social? Nesse sentido, como esta encíclica se insere no pontificado de Francisco? 

Agbonkhianmeghe Orobator  - Como Laudato Si’, Fratelli Tutti inspira-se na vida e nos ensinamentos de Francisco de Assis. O Papa Francisco reconhece o papel das Nações Unidas e a necessidade de uma comunhão entre as nações bem como uma autoridade global regulada pelo direito. Esta encíclica encontra-se na tradição do Papa Francisco, de uma economia e de uma política centradas na pessoa e que favoreçam a solidariedade, a compaixão, a inclusão e o cuidado dos pobres.

 

IHU On-Line – Que saídas a Encíclica Fratelli Tutti aponta para este momento de mudança epocal que vivemos? 

Agbonkhianmeghe Orobator - Esta encíclica indica uma fraternidade autêntica que cria uma família de nações, baseada na hospitalidade e na gratuidade assim como no direito de todos os povos, comunidades e grupos nas esferas privada e social.

Fratelli Tutti promove uma mudança a partir da política perigosa, como o populismo, o nacionalismo e o neoliberalismo, para uma política saudável que serve o bem comum e anima-se pela caridade como o seu “coração do espírito”.

A fraternidade universal e a amizade social conectam o local e o global numa relação mutualmente benéfica. Isso significa que o diálogo promove o respeito à diferença de opiniões e pontos de vista e que se anima pela busca comum da verdade, do bem comum, do serviço aos pobres e da paz com base na verdade.

Tal cultura do diálogo e encontro transcende as diferenças e divisões e estabelece uma preferência de amor pelos pobres, vulneráveis e pelos menores [de nossos irmãos].

Finalmente, Francisco faz um novo chamado ao perdão e à reconciliação, à eliminação da guerra e da pena de morte.

 

 

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