O estranho caso de Viganò. O que mais ele tem que dizer para ser formalmente censurado?

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25 Abril 2020

"Não é possível tolerar que um arcebispo possa negar toda preciosa elaboração conciliar – sobre a liturgia, sobre a Igreja, sobre a Palavra de Deus e sobre o exercício de autoridade, sobre a ministerialidade, sobre o sacerdócio comum, sobre o papel da mulher - sem ser formalmente chamado para o âmago comum de consciência e de expressão eclesial", escreve Andrea Grillo, teólogo italiano, em artigo publicado por Come Se Non, 23-04-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.

Eis o artigo.

Se um Bisco falasse a centésima parte das coisas que D. Viganò profere em superabundância (em entrevista concedida ao portal Dies Iræ, 21-04-2020, disponível em português aqui), auxiliado pelas perguntas tendenciosas de seu entrevistador português, teria imediatamente consequências de caráter disciplinar e doutrinal. Isso não porque na igreja não há liberdade de expressão, mas porque na Igreja não há liberdade de insulto, não há liberdade de calúnia, não há liberdade de difamação, não há liberdade de fraude. Na Igreja, um arcebispo não pode insultar pessoalmente outro cristão, talvez ironizando sobre seu nome, sem sofrer as consequências de uma intemperança que é escandalosamente em contradição com o que deveria ser e representar. As palavras irrepetíveis com as quais um arcebispo fala da Igreja, do papa, dos teólogos, da pastoral, da oração, do Concílio Vaticano II, da inculturação, da história e da cultura contemporânea já são agora uma questão que toca a estrutura do debate interno na Igreja.

Não é inoportuno que também um pastor possa ter uma certa liberdade nos juízos. Ai de não pretender de todos uma parrésia. O que os teólogos fazem por profissão, os pastores podem fazê-lo por oportunidade ou por urgência. Mas há limites além dos quais, tanto um teólogo quanto um pastor, se coloca objetivamente fora da comunhão eclesial. E se não há reação, não se diz nada, se deixa passar, se levantam os ombros, se considera tudo como pessoal ou particular, não se presta um serviço à confiabilidade do discurso comum e compartilhado na Igreja.

Como não é possível tolerar ainda mais que uma Igreja possa ter "duas formas rituais" do mesmo rito, não é possível tolerar que um arcebispo possa negar toda preciosa elaboração conciliar – sobre a liturgia, sobre a Igreja, sobre a Palavra de Deus e sobre o exercício de autoridade, sobre a ministerialidade, sobre o sacerdócio comum, sobre o papel da mulher - sem ser formalmente chamado para o âmago comum de consciência e de expressão eclesial.

Gostaria também de acrescentar: esses são os frutos de atitudes forçadas que, depois de Summorum Pontificum, foram tentadas - em vão - no diálogo a todo custo com os lefebvrianos. Tentar "adoçar", "diluir", "selecionar" nos documentos do Concílio o que vincula a todos e o que vincula apenas os "entusiastas", para chegar a um "protocolo de entendimento" é uma operação que massacra a tradição comum. E naquelas tentativas não era fácil entender de que lado da mesa se sentavam os homens mais perigosos para o caminho comum desejado pelo Concílio Vaticano II.

De qualquer forma, aquela urgência de "paz" com a venda em liquidação das joias da casa resultou, em nossos dias, em oficiais da Cúria que trabalham há anos em caminhos paralelos e contraditórios em relação à Reforma Litúrgica e Arcebispos em aparente comunhão com Roma, que dizem coisas tão graves em relação às quais Marcel Lefebvre parece um severo, mas respeitoso, padre conciliar. O esclarecimento formal das aquisições comuns que devemos ao Concílio Vaticano II exige que saiamos do duplo estado de exceção, pelo qual se pode celebrar com ritos que contestam a Reforma e também se pode ser arcebispos pretendendo impor à Igreja de 2020 uma linguagem digna da Igreja de 1907, como se a delação antimodernista fosse o horizonte do futuro.

O tempo não flui para trás. Nem liturgicamente, nem pastoralmente, nem doutrinalmente. Somente no cinema isso pode acontecer. O "estranho caso de Benjamin Button" não se repete na cena eclesial. Sobre esse caso paradoxal, o silêncio das instituições responsáveis para a garantia do discurso comum parece, no mínimo, inoportuno. Eu não gostaria que a habituação às "formas duplas" e aos "diálogos para baixo" tivesse feito incluir até os discursos gravíssimos de D. Viganò, como "legítimas expressões da Igreja de sempre". Se assim fosse, devemos nos perguntar: Quis custodiet ipsos custodes?

 

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