25 Agosto 2025
"A Intersos não tem intenção de abandonar o país: as necessidades continuam enormes, mas num contexto tão volátil, é difícil prever como a situação irá evoluir. Transitamos entre a urgência do presente e a incerteza do que nos espera. E, infelizmente, não podemos descartar que o pior ainda esteja por vir", afirma Sofy Dia, assistente de Programa, Afeganistão da Organização Humanitária INTERSOS, Distrito de Cabul, Província de Cabul, Afeganistão, em entrevista concedida a Francesca Mannocchi, publicada por La Stampa, 24-08-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Qual é a situação humanitária no Afeganistão hoje?
No Afeganistão, metade da população, aproximadamente 23 milhões de pessoas, precisa de assistência humanitária para sobreviver. Entre as principais necessidades que nossa equipe enfrenta diariamente estão as relacionadas à saúde: são necessários cuidados primários, imunização, medicamentos, e há o enorme problema da desnutrição, que no Afeganistão continua entre as principais causas de morte entre crianças abaixo dos 5 anos. Para mulheres e meninas, as vulnerabilidades são amplificadas pela discriminação de gênero que as exclui da vida social, política e econômica.
Após os cortes de financiamento da USAID, a situação humanitária se deteriorou rapidamente.
O impacto dos cortes impostos pelo governo dos EUA foi devastador. Os Estados Unidos eram o principal doador do país e, em 2024, haviam financiado 47% do total de fundos solicitados no apelo anual lançado pelas Nações Unidas. 422 clínicas foram fechadas, com um impacto devastador em mais de 3 milhões de pessoas que perderam repentinamente o acesso aos serviços de saúde. O PMA — em um país com 3,5 milhões de crianças sofrendo de desnutrição aguda — teve que reduzir seu programa em 60%, deixando mais de 1 milhão de crianças sem tratamento. Na Intersos, fomos obrigados a suspender as atividades em oito instalações, deixando mais de 123.000 pessoas sem assistência. Felizmente, para cinco delas — quatro em Kandahar e uma em Cabul — conseguimos mobilizar recursos de outros doadores, o que nos permitiu retomar os serviços. Mas o crescente desinteresse da comunidade internacional em relação ao apoio humanitário — no Afeganistão, como em outros lugares — é um sinal alarmante. Se essa tendência global se consolidar, o risco é que nos encontremos diante de crises cada vez mais profundas, esquecidas e sem resposta.
As áreas mais remotas do país, ou seja, a maioria, são as mais necessitadas. Quem são as pessoas que vocês ajudam?
Nas áreas remotas, a maioria das famílias não consegue gerar renda suficiente para cobrir as necessidades básicas. Além da escassez de alimentos, as famílias enfrentam uma quase total falta de serviços básicos. Não há serviços de saúde, água potável ou saneamento adequado, o que aumenta o risco de doenças e desnutrição, especialmente entre crianças — que representam metade da população — e mulheres grávidas. E são justamente essas pessoas que atendemos todos os dias em nossas unidades de saúde, graças ao apoio significativo da União Europeia.
Como vocês se relacionam com o governo?
Relacionar-se com o governo é fundamental para ter acesso a áreas de intervenção e para poder iniciar e executar os nossos projetos. A coordenação com as autoridades é, portanto, essencialmente sobre questões técnicas: coordenamo-nos em nível central para nos mantermos atualizados sobre as políticas nacionais e com as autoridades locais para realizar atividades no campo, especialmente nas comunidades mais vulneráveis. A Intersos não tem intenção de abandonar o país: as necessidades continuam enormes, mas num contexto tão volátil, é difícil prever como a situação irá evoluir. Transitamos entre a urgência do presente e a incerteza do que nos espera. E, infelizmente, não podemos descartar que o pior ainda esteja por vir.