08 Agosto 2025
O artigo é de José Manuel Vidal, publicado por Religión Digital, 07-08-2025.
Na esplanada Tor Vergata, sob um sol escaldante e um céu que parecia abençoar o cenário, mais de um milhão de jovens de 146 países se reuniram para o Jubileu da Juventude de 2025, um evento que superou todas as expectativas e, sem exagero, pode ser descrito como um verdadeiro Woodstock católico. A imagem é indelével: um mar humano agitando bandeiras, cantando canções, dormindo ao ar livre, com mochilas, colchonetes e uma fé que desafia os tempos sombrios que a Igreja atravessa, uma nova primavera cujo amanhecer poucos previram.
Ninguém, nem mesmo os mais otimistas, esperava essa resposta massiva. E menos ainda agora, com uma instituição eclesial castigada pela praga dos abusos, pela perda de credibilidade e pelo vazio de um mundo secularizado que parece ter-lhe virado as costas. No entanto, lá estavam eles, os jovens, em busca de algo maior do que um Papa, em busca de um sentido. E o encontraram. Como podemos explicar isso? Que fontes profundas impulsionam esta geração a encher Tor Vergata com seu entusiasmo e esperança?
A Igreja Católica não atravessa seu melhor momento. Os escândalos de abuso sexual, que abalaram seus alicerces nas últimas décadas, deixaram uma ferida profunda, uma perda de confiança que se traduz em bancos vazios nas igrejas, perda de credibilidade social e crescente indiferença, especialmente entre os jovens.
Soma-se a isso a transição de um pontificado carismático como o de Francisco, cuja acessibilidade e espontaneidade conectavam-se naturalmente com as novas gerações, para um Papa recém-empossado, Leão XIV, Robert Francis Prevost, um americano sóbrio, austero em seus gestos, sem o brilho midiático de seu antecessor. Ele não é um papa de massas no sentido clássico; não busca aplausos fáceis ou manchetes. E, no entanto, a Tor Vergata estava lotada. Por quê?
Leão XIV não seduz com carisma pessoal, mas com autenticidade. Seu estilo é o de um pastor que não se propõe a ser o protagonista, mas sim um batista, um indicador do protagonista: Cristo. Durante a vigília de sábado, 2 de agosto, em diálogo com os jovens, não ofereceu receitas fáceis nem promessas grandiloquentes. Falou da "cultura do Evangelho" e da "cultura da fragilidade", expressão que ressoou profundamente em uma geração que vivia entre a precariedade e a busca de sentido.
Citando a parábola da erva frágil, mas resistente, Leão XIV disse-lhes: “Não se contentem com pouco; aspirem a grandes coisas, à santidade, onde quer que estejam”. Foi uma mensagem direta e sem rodeios, que ressoou nos corações de uma juventude que não buscava ídolos, mas respostas que dessem substância às suas vidas.
O fenômeno Tor Vergata não pode ser explicado apenas pela figura de Leão XIV, embora seu papel tenha sido crucial. Os jovens não se aglomeravam para ver um Papa, mas sim pelo que ele representa: uma ponte para algo maior. Em um mundo marcado por conflitos – Ucrânia, Gaza e tantas outras feridas abertas – pela incerteza econômica, pela crise climática e pela superficialidade de uma cultura consumista, os jovens de hoje estão sedentos por significado.
Como disse Francisco, citado por Leão XIV em sua homilia: “Não nos assustemos se nos sentirmos sedentos, inquietos, incompletos, ansiando por um sentido. Não estamos doentes, estamos vivos!” Essa sede de sentido encontrou expressão no Jubileu. Os jovens não vinham a Roma para adorar um líder carismático, mas para compartilhar sua fé, para encontrar outros que, como eles, buscam um horizonte que transcende o cotidiano .
A vigília de oração, a adoração eucarística, os testemunhos e a música ao vivo criaram uma atmosfera de comunidade viva, um "laboratório de paz" onde a fé se tornou uma experiência tangível. A Cruz monumental, a mesma que presidiu o Jubileu de João Paulo II em 2000, serviu mais uma vez como símbolo dessa busca, lembrando-os, como disse Leão XIV, que "é Jesus que buscais quando quereis encontrar a felicidade".
Por que um milhão de jovens se une em torno de Cristo? Como podemos explicar essa aritmética entre Deus e o Papa Leão? As razões são muitas, mas podem ser resumidas em três áreas principais:
A fé como âncora em um mundo fluido: Em uma sociedade que Zygmunt Bauman descreveu como "líquida", onde tudo é efêmero e mutável, a fé católica oferece uma âncora, uma narrativa que dá sentido à existência. Os jovens de Tor Vergata, vindos de 146 países, não são ingênuos nem imunes às críticas à Igreja. Mas encontraram no Evangelho, na figura de Cristo que Leão XIV colocou no centro, uma resposta para suas perguntas mais profundas: Quem sou eu? Para que vivo? A meditação sobre os discípulos de Emaús e a adoração eucarística durante a vigília reforçaram essa conexão espiritual.
A força da comunidade: Como explicou Marina Igelspocher, uma alemã de 28 anos: "Gosto de viver a minha fé com os outros, nas ruas". O Jubileu não foi apenas um encontro com o Papa, mas um espaço de comunhão, de partilha de experiências com outros jovens de diferentes culturas. Num mundo onde a solidão é uma epidemia silenciosa, a comunidade de fé tornou-se um refúgio e uma força motriz. Os cânticos, as bandeiras, as noites passadas ao ar livre em Tor Vergata criaram um sentimento de pertença que transcende fronteiras.
A mensagem de esperança e compromisso social: Leão XIV falou não apenas de fé, mas de ação. Seu grito "Queremos a paz no mundo!" ressoou na Praça São Pedro e em Tor Vergata, acompanhado por sua proximidade explícita aos jovens de Gaza e da Ucrânia. Essa mensagem se conectou com uma geração que buscava não apenas espiritualidade, mas também um compromisso ético com um mundo fragmentado. O convite para serem "sinais de esperança" e levar a paz de Cristo às suas comunidades deu aos jovens uma missão concreta.
Leão XIV não é Francisco, nem pretende ser. Sua sobriedade, seu foco no essencial, pode parecer menos midiático, mas é profundamente eficaz. Em Tor Vergata, ele não buscou deslumbrar, mas sim apontar o caminho. Ao carregar a cruz até o palco, num gesto carregado de simbolismo, lembrou aos jovens que fragilidade e resiliência andam de mãos dadas, que a fé não é uma fuga do mundo, mas uma forma de transformá-lo. "A decisão é um ato humano fundamental", disse ele, convidando-os a escolherem ser "peregrinos da esperança".
O Jubileu da Juventude de 2025 não será lembrado apenas por seus números — mais de um milhão de pessoas, um marco logístico e espiritual —, mas pelo que revelou: que a Igreja, mesmo em seus momentos mais sombrios, permanece capaz de convocar novas gerações. Não porque seja perfeita, mas porque oferece o que o mundo não pode oferecer: um significado transcendente, uma comunidade viva e uma esperança inextinguível. Tor Vergata foi, nas palavras de Leão XIV, "um laboratório de paz". E os jovens, com seu entusiasmo e fé, demonstraram que, contra todas as probabilidades, a frágil grama continua a crescer, resiliente, sob o sol romano.