26 Junho 2025
"A abordagem da tecnologia é muito diferente no Oriente e no Ocidente. Porque é influenciada pelas culturas filosóficas originais. Com muitas surpresas".
O artigo é de Antonio Spadaro, jesuíta e ex-diretor da revista La Civiltà Cattolica, publicado por La Repubblica, 18-06-2025.
No coração do Vale do Silício, em abril de 2019, participei de um seminário na Universidade de Santa Clara. Éramos doze, dos Estados Unidos, Europa e China. Cada um com sua própria cultura, sua própria visão de mundo. No centro da discussão: a inteligência artificial e seu impacto na humanidade. Foi então que uma clara consciência emergiu em mim: a IA não tem o mesmo significado em todos os lugares do mundo. Suas implicações éticas, culturais e espirituais variam radicalmente dependendo do mapa conceitual com o qual é interpretada. Ficou claro que nossas discussões assumiam filosofias diferentes e estávamos falando sobre coisas diferentes, embora tratássemos do mesmo tópico.
Conversando com os chineses, entendi que a narrativa dominante – que retrata a tecnologia como neutra, universal – é fruto da modernidade ocidental e se impôs por meio da globalização. Na realidade, cada civilização desenvolve tecnologia de acordo com sua própria visão de mundo e seus próprios valores constitutivos. A tecnologia, em suma, nunca é uma simples ferramenta: ela faz parte de uma ordem cosmológica.
A comparação entre Oriente e Ocidente destaca duas abordagens profundamente diferentes. No Ocidente, quando falamos de IA, mencionamos autonomia individual, liberdade pessoal, responsabilidade ética. Fazemos isso porque somos moldados pela filosofia e teologia gregas expressas em sua linguagem. Daí uma visão da IA centrada em direitos: proteção da privacidade, consentimento informado, controle do algoritmo. No Leste Asiático, e em particular no pensamento confucionista, o ponto de partida é diferente: o ser humano não é um átomo isolado, mas um nó em uma rede de relações. A ética surge do vínculo, do dever para com a família, a comunidade, a sociedade. A IA, neste contexto, deve ser avaliada com base em sua capacidade de fortalecer a harmonia e a coesão social, e não apenas para proteger o indivíduo. E isso, líquido das consequências políticas, muda a perspectiva.
As diferenças se acentuam quando abordamos a questão da criação. O Ocidente concebe Deus como um criador a partir do nada, e o homem como capaz de ser criativo. Mas o que acontece se uma máquina escreve poesia, toma decisões autônomas, pinta quadros? Estaremos talvez cruzando uma fronteira ontológica?
Michelangelo Pistoletto, por exemplo, colocou a questão no centro de sua reflexão. Em muitas tradições orientais, como o Taoísmo, não há ideia de criação como a entendemos: "Há uma coisa caótica, porém formada, / ela nasceu antes do Céu e da Terra. / Silenciosa. / Vazia. É autossuficiente; não muda. / Ela vai em todas as direções, mas não se esgota. / Poderia ser considerada a mãe de toda a criação. / Não sei seu nome; eu a chamo de Tao", lemos no Tao Te Ching. O mundo não é feito: ele "flui". O universo é fluxo, transformação, mudança contínua. A tarefa do homem não é criar, mas harmonizar-se com o fluxo do Tao. Mesmo a IA, então, é vista como algo a ser harmonizado nesse fluxo.
O tema crucial, no entanto, é o da nossa relação com a própria tecnologia. Duas visões também são confrontadas aqui. De um lado, aquela que considera a tecnologia um meio neutro, avaliável apenas com base em seu uso. De outro, aquela que a reconhece como um ambiente, como algo que nos molda, nos forma, nos transforma. A IA não é apenas uma ferramenta: ela faz parte do habitat em que vivemos, pensamos, sentimos. Não basta nos perguntarmos como usá-la, mas como viver nela, permanecendo humanos.
Para ir além de uma visão excessivamente antropocêntrica e funcional, são necessários novos mapas, que precisam ser explorados. Robin R. Wang, por exemplo, se perguntava em um de seus ensaios: "Uma máquina pode fluir como o Tao? Qi, a energia vital que move tudo, não pode ser replicada por um algoritmo", diz ela. E, no entanto, não se trata de se opor à tecnologia, mas de reformulá-la, com o objetivo de tornar as máquinas "autênticas", zhen, isto é, em harmonia com a vida e o mundo. O filósofo Yuk Hui, em sua Cosmotecnica, por sua vez, propõe abandonar o universalismo técnico moderno para redescobrir cosmologias esquecidas. Na China - observa Hui - a tecnologia não é dominação sobre a natureza, mas um gesto que está de acordo com o Tian, o Céu, o princípio ordenador do universo.
As reflexões que estamos fazendo ressoam profundamente com a encíclica Laudato si', que parte do fato de que "tudo está conectado". O Papa Francisco rejeitou a ideia de um progresso técnico linear, universalizável, desconectado do cuidado com a vida e com a Terra. Sua proposta era a de uma ecologia integral, na qual natureza, cultura, espiritualidade e tecnologia se entrelaçam. Também para Bergoglio, não havia uma modernidade única: eram necessárias muitas visões, capazes de gerar uma responsabilidade compartilhada. E para falar sobre isso, ele fez referência privilegiada às cosmogonias amazônicas.
Devemos aprender a imaginar uma compreensão da inteligência artificial e da relação entre homem e máquina que seja situada, plural, enraizada em contextos culturais e espirituais. Leão XIV levantou a questão, lembrando outro Leão XIII, que em sua época se perguntou como forjar e refinar a inteligência. O Papa Pecci, na segunda metade do século XIX, escolheu o caminho do neotomismo. Pode-se discutir isso, mas ele certamente colocou o problema claramente. Hoje, a questão do que molda nossa inteligência e como ela é forjada na era do "cérebro mecânico" – como Paulo VI a definiu, já em 1964 – torna-se ainda mais decisiva. E o Papa Prevost sabe disso. Muitas vezes, são as próprias autoridades espirituais – tanto no Ocidente quanto no Oriente – que se fazem esse tipo de pergunta com clareza.
Precisamos nos afastar da perspectiva meramente ética na qual todo o nosso raciocínio cultural sobre IA termina. E temos o dever de pensar sobre a tecnologia de forma diferente: não como um objeto a ser governado, mas como parte do nosso destino, a ser habitado com consciência. A questão da IA não é apenas técnica, mas "espiritual" : ela não nos pergunta apenas o que podemos fazer, mas quem queremos ser. Para isso, precisamos olhar para fora da perspectiva individualista e antropocêntrica que moldou a visão ocidental da tecnologia. Não negá-la, mas integrá-la e, assim, melhorar nossa capacidade de ser humanos.