05 Junho 2025
"Algumas das expectativas do Concílio em relação às mulheres católicas, especialmente no que diz respeito à reforma litúrgica, foram superadas pelas resoluções conciliares, enquanto outras, como o diaconato e a ordenação sacerdotal das mulheres, permanecem sem implementação até hoje", escreve Regina Heyder, presidente da Comissão Teológica da Federação Católica Alemã de Mulheres (KDFB), em artigo publicado por Herder, abril de 2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Regina Heyder, nascida em 1966, é historiadora da Igreja e professora no Instituto Teológico-Pastoral para a Formação Profissional das dioceses de Fulda, Limburgo, Mainz e Trier. É presidente da Comissão Teológica da Federação Feminina Alemã (KDFB), membro do Comitê Central dos Católicos Alemães (ZdK) e membro do grupo de trabalho "Teologia, Pastoral e Ecumenismo" da Divisão I do ZdK.
As mulheres católicas tiveram de ser criativas para influenciar o Concílio Vaticano II. A sua perseverança, não por último em questões de gênero, continua a ter impacto ainda hoje, como demonstra o último sínodo em Roma.
Como falar de eventos conciliares que violam as normas de gênero e o status eclesial e que são proibidos de fotografar? Como transmitir o evento do Concílio aos leitores do Katholisches Hausbuch, publicado pela St Benno Verlag de Leipzig? O editor Josef Gülden, acompanhante conciliar do bispo Otto Spülbeck durante o Concílio Vaticano II (1962-1965) e colaborador da Sala de Imprensa Conciliar de língua alemã, encontrou uma solução criativa: encarregou a ilustradora Ilse Raddatz-Unterstein de realizar desenhos para o livro Unser Konzil und aus der Konzilsgeschichte (Nosso Concílio e Elementos da História do Concílio), publicado em 1963 e que cobre a primeira sessão do Concílio Vaticano II.
Como outros 25 bispos e acompanhantes conciliares, Gülden também se hospedou na casa de hóspedes romana das Irmãs de Santa Elisabete, na Via dell'Olmata, 9, onde as irmãs haviam se preparado intensamente para seu papel de anfitriãs, realizaram reformas, compraram uma televisão e um freezer, converteram dois escritórios em capelas adicionais para as "26 Santas Missas diárias" e elaboraram planos de celebração para que todos os padres pudessem celebrar a missa antes de sair para o Salão do Concílio. As freiras também haviam estabelecido um regulamento interno: "Não permitimos absolutamente a entrada de senhoras no internato", informava a superiora provincial romana, Madre Engelmunda Morach, em uma carta à casa-mãe em Reinbek.
Havia também uma hierarquia rígida de assentos no refeitório: os bispos sentavam-se à grande mesa central, enquanto "os professores e os carregadores sentavam-se ao longo da parede", como descreveu Friedrich Kindermann, que estava presente como acompanhante conciliar. Os espaços não são neutros em termos de gênero ou poder; estabelecem ordens sociais. Eles também revelam quando essas ordens são infringidas de forma subversiva. Provavelmente foi exatamente isso que aconteceu em Olmata, e Ilse Raddatz-Unterstein o imortalizou em um desenho.
"Às vezes, os bispos até ajudavam a lavar a louça na área da cozinha da casa das freiras", é a legenda de um de seus esboços em preto e branco, publicado no "Hausbuch". No fundo de uma cozinha, se veem duas freiras, uma das quais parece feliz, a outra surpresa e preocupada pelas situações que se desenrolam em primeiro plano: um bispo está secando a louça, outro está carregando uma pilha de pratos ambiciosamente alta. Uma cena em que tanto os bispos quanto as freiras não estão realizando atividades de acordo com seus papéis tradicionais.
Esse episódio em um internato romano não é um caso: para as mulheres católicas, o Concílio foi uma força motriz para pequenas e grandes mudanças, que elas mesmas solicitaram e muitas vezes moldaram. Elas influenciaram a teologia, os temas e os contextos de discussão do Concílio.
Elas participaram dos vários processos de comunicação, tanto a convite quanto sem convite, e formularam contribuições conciliares; reagiram aos rascunhos de textos em várias ocasiões durante as assembleias e contribuíram com seus próprios argumentos e perspectivas por meio de correspondência com os Padres Conciliares; prestaram consultoria a numerosos Padres Conciliares como ouvintes leigas e correspondentes político-eclesiásticas ativas em Roma e trabalharam nas subcomissões; como anfitriãs, criaram locais específicos de comunicação para encontros internacionais e ecumênicos; foram e são protagonistas importantes nos processos de recepção do Concílio (cf. Regina Heyder e Gisela Muschiol [org.], Katholikinnen und das Zweite Vatikanische Konzil. Petições - Relatos - Fotografias, Münster 2018).
Quando João XXIII anunciou inesperadamente um Concílio Ecumênico em 25 de janeiro de 1959, as mulheres católicas de todo o mundo fizeram suas vozes serem ouvidas e se tornaram ativas na política eclesiástica como nunca antes. Apresentaram petições às comissões preparatórias em Roma e aos bispos diocesanos locais para explicar o que pensavam.
Já então se preocupavam com a percepção eclesial e social das relações de gênero que estavam sendo levantadas. A União Mundial das Organizações de Mulheres Católicas (WUCWO), falando em nome de 36 milhões de mulheres, pedia um reconhecimento fundamental do trabalho das mulheres na família, na sociedade e no apostolado da Igreja e se opunha à "tendência pseudocatólica de idealizar as mulheres". Na Igreja, a WUCWO pedia a redução da misoginia e, como muitas organizações femininas, voltava sua atenção para a formação de padres – uma maneira elegante de criticar os padres que haviam seguido a formação tradicional. As mulheres pediam que os padres fossem mais bem preparados para liderar a vida espiritual das mulheres e "desenvolvessem maior confiança nas atividades pastorais auto-organizadas pelas mulheres".
Um segundo memorando da WUCWO abordava a contracepção. Como a Igreja só admitia a chamada "escolha temporal" como método contraceptivo e qualquer outro tipo de contracepção sem a absolvição prévia na confissão comportava a exclusão da comunhão, se criava um círculo vicioso traumatizante para muitos casais casados. No memorando, destacam-se duas estratégias: por um lado, os católicos descreviam as experiências opressivas das mulheres e, como a teologia feminista um pouco mais tarde, definiam as experiências concretas de vida das mulheres como locus theologicus. Do outro lado, pediam que o futuro concílio apresentasse a doutrina católica com mais clareza. Afinal, a Igreja não era representativa de uma doutrina sobre os nascimentos, mas de uma doutrina sobre a família; não se tratava apenas de procriação, mas também de educação dos filhos. A constituição pastoral Gaudium et Spes, aprovada em 1965, efetivamente se expressava nesse sentido.
Algumas das expectativas do Concílio em relação às mulheres católicas, especialmente no que diz respeito à reforma litúrgica, foram superadas pelas resoluções conciliares, enquanto outras, como o diaconato e a ordenação sacerdotal das mulheres, permanecem sem implementação até hoje. Foi precisamente sobre esses temas que as mulheres se empenharam publicamente durante o Concílio.
Gertrud Heinzelmann publicou um livro com o título provocativo "Wir schweigen nicht länger!” (Não nos calaremos mais!), que continha suas declarações e as das teólogas alemãs e estadunidenses Iris Müller, Ida Raming, Josefa Theresia Münch, Mary Daly e Rosemary Lauer. A obra simboliza as novas redes femininas internacionais que se formaram durante o Concílio. Em Roma, não foi apenas a publicação que causou clamor, mas também o fato de "alguns teólogos, mesmo qualificados", terem se unido às reivindicações das mulheres. O Osservatore Romano respondeu com uma série de artigos em três partes com o título "As mulheres e o sacerdócio" – com o juízo negativo que se podia esperar.
A participação dos leigos havia sido solicitada desde o anúncio do Concílio. A teóloga leiga Josefa Theresia Münch participou da primeira coletiva de imprensa em língua alemã, possibilitada pelas transmissões, e perguntou se "as mulheres também" estavam incluídas nessa solicitação. As reações foram apenas risadas e presumiu-se que a pessoa que havia feito a pergunta não fosse católica.
Nos dois primeiros anos do Concílio, as mulheres católicas expressaram o que consideravam importante para elas por ocasião das viagens a Roma por motivos de política eclesiástica, em conversas com os bispos e nos eventos à margem do Concílio. Elas não podiam parecer modestas naquelas ocasiões. Maria Alberta Lücker, consultora do Comitê Central dos Católicos Alemães (ZdK), ofereceu-se como membro do Concílio em 1963, quando soube que ouvintes leigos seriam nomeados. "Mulheres também?", escreveu em um cartão-postal ao Secretário-Geral do ZdK. Seu conhecimento de latim e acomodação gratuita em Roma a tornavam ideal.
Mas, na segunda sessão, as mulheres foram novamente excluídas do primeiro grupo de ouvintes leigos por causa de seu sexo. No entanto, a partir de novembro de 1963, Lücker trabalhou por várias semanas na secretaria do concílio dos ouvintes leigos. Ela descreve vividamente como aprofundou seus conhecimentos teológicos em um espaço de tempo muito curto. Finalmente, durante a quarta sessão, participou como especialista em uma subcomissão "sobre a comunhão dos povos e a paz" sobre Gaudium et Spes, conduzida por dom Joseph Schröffer.
Em 1963, o Papa Paulo VI nomeou os primeiros ouvintes leigos homens para o Concílio; apenas um ano depois, as primeiras 15 ouvintes leigas foram nomeadas. O cardeal belga Léon-Joseph Suenens demonstrou ser um poderoso apoiador: em um discurso ao Concílio, ele enfatizou que as mulheres constituíam "metade da humanidade" e, portanto, deveriam ser convidadas como ouvintes. Quando Paulo VI abriu a terceira sessão, saudou "as nossas caras irmãs, as ouvintes", que, segundo ele, deveriam participar das liturgias solenes e das congregações gerais que "discutem temas de particular interesse para a vida das mulheres".
As ouvintes leigas Rosemary Goldie e Mary Luke Tobin declararam que todos os aspectos da vida da Igreja são importantes para as mulheres. Goldie e María del Pilar Bellosillo, presidente da WUCWO, concordavam que o Concílio não devia definir o papel das mulheres na sociedade e na Igreja nem de forma unívoca nem de forma poética. De fato, isso foi alcançado porque os textos conciliares, mesmo pressupondo a complementaridade dos sexos, abstêm-se de qualquer descrição – uma reserva que infelizmente não foi mantida nos pontificados pós-conciliares.
Várias mulheres puderam exercer sua influência nas subcomissões sobre esquemas conciliares, especialmente sobre a Gaudium et Spes.
Desde 1964, entre as ouvintes leigas estavam a freira alemã Juliana Thomas, na qualidade de secretária-geral da Associação das Superioras Religiosas Maiores na Alemanha, e, desde 1965, a presidente da Associação das Mulheres Católicas Alemãs, Gertrud Ehrle. Ehrle havia ativado todas as suas conexões eclesiásticas e diplomáticas para ser nomeada ouvinte leiga.
De volta a Olmata: todas as regras da casa que a superiora provincial romana, Madre Engelmunda Morach, havia elaborado em 1962 tornaram-se obsoletas durante o Concílio. O mais tardar na terceira sessão, já havia hóspedes femininas morando na casa, entre as quais a ouvinte leiga alemã, Irmã Juliana Thomas, a secretária de um bispo do Senegal e a "filha de um chefe de Uganda", que viera a Roma para a beatificação dos mártires ugandenses.
As Irmãs Elisabetinas prosseguiram sua política conciliar acolhendo os hóspedes do Concílio. Por um lado, reuniram deliberadamente bispos da Silésia, Alemanha do Leste e Alemanha Ocidental para superar, pelo menos em Roma, a divisão da Europa, o que teve um imenso impacto na congregação, que tinha raízes silesianas, mas também filiais em ambos os lados da Cortina de Ferro. Por outro lado, Olmata acolheu com satisfação a composição cada vez mais internacional e ecumênica dos hóspedes do Concílio e orgulhou-se de anunciar, já em 1963, que "só faltava a Austrália" entre os continentes de origem. Como precaução, a superiora provincial fez com que os bispos aprovassem a acomodação de um observador protestante no Concílio no internato.
No entanto, as Irmãs Elisabetinas realmente se tornaram criativas, em sentido literal, antes do início da terceira sessão, em 1964. A Constituição sobre a Liturgia Sacrosanctum Concilium havia sido adotada em 04-12-1963 como o primeiro documento conciliar. Um Conselho para a implementação da Constituição sobre a Liturgia, que incluía especialistas residentes em Olmata, como dom Otto Spülbeck, de Meissen, acompanhou a efetiva implementação. A Congregação dos Ritos havia lhe dado permissão para celebrar a Eucaristia com concelebração ad experimentum, e mais uma vez as Irmãs Elisabetinas eram responsáveis pela infraestrutura litúrgica. Isso incluía a distribuição de patenas e a presença na capela de mesas de altar adequadas para a concelebração versus populum.
A Madre Engelmunda Morach relatou sobre essas celebrações eucarísticas à casa-mãe em Reinbek com genuína euforia, pois os papéis dos participantes haviam mudado na nova liturgia na sala reestruturada: enquanto antes o rito dependia exclusivamente do padre, agora as irmãs se sentiam, pela primeira vez, participantes da celebração eucarística. Engelmunda Morach escrevia em uma carta: “Todos os celebrantes escutavam. O Introito não foi repetido pelo bispo oficiante. A leitura da irmã era, portanto, plenamente válida. Todos os celebrantes a ouviram”. Sem usar o termo técnico, a freira está descrevendo a participatio actuosa, a participação “consciente, ativa e frutífera” dos fiéis na liturgia, conforme previsto pelo Concílio.
Como alguns eventos do Concílio só podiam ser transmitidos por meio de esboços e não por fotografias, Engelmunda Morach realizou um desenho, que também enviou a Reinbek. Mostra o espaço do altar com um altar-mor que ficou "intacto", a posição do "padre regente" que coordenava a liturgia e os assentos para até cinco bispos e seis padres. A superiora provincial estava ciente de seu papel como "multiplicadora" do Concílio.
As mulheres católicas tinham grandes expectativas em relação ao Concílio Vaticano II, principalmente a de atuarem como protagonistas. Com maravilhosa criatividade, desenvolveram novas formas de ação, como a redação de memorandos, petições, relatos teológicos e artigos de imprensa; estavam presentes no local como ativistas com reivindicações claras; eram colaboradoras no Concílio e ouvintes leigas; expandiram as redes internacionais e organizaram espaços de comunicação como anfitriãs. Tudo isso exigiu uma forma decididamente nova de agir: ocupar novos espaços, fazer perguntas provocativas no momento certo, apresentar-se à opinião pública, envolver-se, transcender os papéis fixos.
Em outubro de 2024, concluiu-se em Roma o Sínodo 2021-2024: Por uma Igreja Sinodal: Comunhão, Participação e Missão. Pela primeira vez, leigos católicos e leigas católicas puderam participar com direito a voto. Esse direito ao voto também não caiu do céu, mas foi requisitado por meio de petições e ações criativas.
Uma fotografia das monjas beneditinas de Fahr, manifestando-se a favor do “voto às mulheres católicas” em Roma em 2019, tornou-se icônica. As monjas carregaram cartazes com esse pedido na Via della Conciliazione, com a Basílica de São Pedro ao fundo, e também exibiam essa solicitação em laranja brilhante na parte interna de suas capas. Na segunda sessão do Sínodo, foi principalmente graças às mulheres que o diaconato feminino foi discutido, contrariando as diretrizes do Papa, e inserido (ainda com muita cautela) no documento final.
Talvez outra estratégia do documento final se mostre ainda mais eficaz a longo prazo, a qual certamente está em continuidade com o trabalho das mulheres leigas ouvintes no Concílio: não há estereótipos de gênero no documento final. A função de tais estereótipos é sempre limitar a autonomia das mulheres. De fato, o Papa Francisco cultiva uma retórica de idealização estereotipada das mulheres, embora ele próprio tenha testemunhado em uma entrevista que toda idealização é uma forma de agressão. No entanto, um traço menos óbvio em seus escritos doutrinários leva da complementaridade de gênero à reciprocidade. Esse é precisamente o ponto de partida das mulheres e dos homens membros do Sínodo. O Papa Francisco valorizou as vozes de todos os membros do Sínodo afirmando explicitamente: "O documento final pertence ao magistério ordinário do sucessor de Pedro". Agora é o momento da implementação criativa.