19 Mai 2025
Quando uma bomba cai, você escuta um barulho “alto, alto”, diz Jana levando as mãos aos ouvidos. A casa, explica, começa a tremer e você acha que ela vai desabar “pouco a pouco” em cima da sua cabeça. Jana diz que esse barulho “alto, alto” sempre a assusta muito, então corre para os braços de sua mãe, que também abraça todos os seus irmãos e “protege você”. Assim você não morre, explica a menina de cinco anos, especialista em guerra. Mas depois aparece Mohammed que grita “Alá, faça minha mãe viver”, ao lado do corpo da mulher que nunca mais o abraçará. Ele chora, e nuvens de poeira voam de suas bochechas pintadas como as de um mímico: é a cal de sua casa destruída. Há Ghana que quer ser engenheira quando crescer e reconstruir toda Gaza: "Você sabe que a gente costumava se divertir aqui? Era lindo". Ela perdeu sua irmã gêmea e um irmão em um bombardeio. Há Khalid, que tem nove anos de idade e conta: "Sou muito forte”. Ele precisa pensar assim porque é o único sobrevivente da família.
A reportagem é de Greta Privitera, publicada por Corriere della Sera, 18-05-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Rashaf tem 11 anos, o rosto estranhamente inchado, os ossos de seu corpo tão visíveis que daria para contar todos eles. “Quero voltar a pentear meus cabelos compridos”, conta ela com um fio de voz, tocando os poucos fios que sobraram na cabeça. "Se alguém a toca, ela grita de dor. Ela está tão desnutrida que corre o risco de morrer, deveria comer frango, carne, ovos, mas não há nada", explica o pai, enquanto mostra uma foto de Rashaf antes da guerra: tão linda.
"Queria que meu cabelo voltasse a crescer, penteá-lo. Queria voltar a ser como eu era antes"
— FEPAL - Federação Árabe Palestina do Brasil (@FepalB) May 4, 2025
Menina palestina Rahaf, 12 anos, sofre de desnutrição aguda e doenças não-diagnosticadas devido à destruição completa do sistema de saúde de Gaza por "israel" e ao bloqueio total imposto… pic.twitter.com/PGvZVGaTk2
São as crianças de Gaza. Pequenos corpos sem vida alinhados em um corredor de um hospital. Olhos castanhos arregalados, sem mais ninguém para procurar. Corpos leves envoltos em lençóis brancos, segurados por pais desesperados. Cadáveres empilhados em caminhões da morte. Rostos empoeirados. Bebês no colo de mães órfãs de outros filhos.
Ontem, o Ministério da Saúde da Palestina disse que, em 24 horas, 153 pessoas foram mortas por ataques da autoridade israelense. A Unicef informa que pelo menos 45 crianças morreram em dois dias. Desde março, quando o governo de Benjamin Netanyahu violou a trégua retomando os bombardeios no enclave palestino, o número é recorde: 950 menores mortos (quase 20.000 desde o início da guerra).
O bloqueio total imposto pelas autoridades israelenses à entrada de ajuda e bens humanitários levou as famílias da Faixa a tomar medidas inimagináveis, relata a ong Save the Children: "Um milhão de crianças correm o risco de fome, doenças e morte”. Desesperadas, sem mais nada, no norte da Faixa, estão voltando a comer ração animal, farinha vencida, farinha misturada com areia, folhas. Enquanto a poucos metros de distância, nos portões da prisão-Gaza, centenas de caminhões lotados de tudo esperam para entrar: poderiam alimentar a população por pelo menos quatro meses, diz a ONU.
Acrescenta-se um número: 4.500 crianças necessitam sair para tratamento médio. “As saídas médicas deveriam ser facilitadas sem prejudicar o direito dos palestinos a um retorno seguro, voluntário e digno”, afirma a ong Médicos Sem Fronteiras. De lá também vêm relatos do oposto: menores que saem para tratamento médico e são forçados a retornar. “É pior do que no início”, conta Sami Abu Omar, da Faixa de Gaza. “Eles bombardeiam e nós morremos como formigas”. Aqueles que pagam esse “pior” são principalmente Jana, Ghana, Khalid e todos os outros: dos cerca de dois milhões e cem mil habitantes, metade são crianças. Elas são as mesmas que aparecem em nossos perfis sociais naqueles curtas-metragens de desumanidade que é difícil acreditar que sejam verdadeiros. A partir lá de dentro, aqueles que viram tentam oferecer algumas coordenadas para torná-las reais. Em Gaza, dizem eles, uma criança morre a cada 45 minutos. Ou imaginem o ginásio de uma escola com cem estudantes: dois foram mortos, dois estão desaparecidos, três estão feridos, cinco são órfãos, cinco precisam de tratamento por desnutrição aguda.