08 Mai 2025
O artigo é de Carlos María Galli, presbítero, membro da Comissão Teológica Internacional e da Academia Pontifícia de Teologia, publicada pro Religión Digital, 06-05-2025.
Em 2005, entreguei uma carta ao cardeal Jorge Mario Bergoglio, que era meu arcebispo. Dizia nela que, em 1978, veio um papa do Leste e que era tempo de chegar um do Sul. Foi eleito Bento XVI, que construiu uma época de papados surgidos da Europa Central. Depois de sua lúcida renúncia, em 11 de fevereiro de 2013, manifestei em privado e em público que o sucessor, se viesse da América Latina, seria Bergoglio. Mantive minha opinião até a eleição de Francisco, como escrevi em La Nación em 20 de março daquele ano, no dia seguinte ao início de seu pontificado.
Em outubro de 2012, fui perito no Sínodo dos Bispos sobre a nova evangelização. Chamaram minha atenção as intervenções do filipino Luis Tagle e do maltês Mario Grech. Hoje eles estão à frente de organismos decisivos da Santa Sé: o Dicastério para a Evangelização e a Secretaria do Sínodo. Francisco, na reforma da Cúria Romana, colocou em primeiro lugar o organismo para a evangelização e passou para o segundo o da doutrina da fé. Se a Igreja existe para evangelizar, o principal é anunciar o Evangelho a todos, e não apenas cuidar da doutrina dos crentes.
Quando voltei daquela assembleia, escrevi a Bergoglio sobre essas duas figuras emergentes e lhe transmiti minha percepção de que na Igreja soprava o Vento de Deus vindo do Sul. Com humor negro, ele me disse para tomar cuidado porque uma forte sudestada poderia me fazer voar pelos ares. No entanto, o Espírito soprou e, três meses depois, ele foi eleito papa, o primeiro do sul do Sul.
Muitos não contavam Bergoglio entre os papáveis. Em meio aos ataques que sofreu tanto de Roma quanto na Argentina, o bispo de Buenos Aires ficou conhecido por três episódios: o Sínodo de 2001, onde substituiu o relator, o arcebispo de Nova York; o conclave de 2005, porque o cardeal Carlo Martini o sugeriu e ele recebeu muitos votos atrás de Joseph Ratzinger; e em 2007, quando presidiu a comissão redatora do Documento da Conferência Episcopal de Aparecida. Apesar disso, o diretor do L’Osservatore Romano me disse que ele não estava entre as 20 biografias preparadas.
Ninguém sabe como os cardeais discernem, e sempre há “candidatos ocultos”. Entre outras coisas, deverão avaliar a vida e a morte de Francisco, o impacto dos funerais, o reconhecimento global, o choro dos pobres. Não tenho blogs, não sou vaticanista nem leio. Mas, depois de tantos sínodos e reuniões, me atrevo a mencionar cardeais com a mesma ressalva que fiz em 2013: “se sair de… seria…”.
Um conclave elege o sucessor de São Pedro, não o herdeiro do último papa. Em 2013, Francisco me disse: “Sou apenas um elo de uma longa cadeia”. Em seu recente livro Esperança. A autobiografia, ele escreveu: “Sou apenas um passo”. Mas seu estilo pastoral e seu magistério aberto deixam uma grande marca. Eu gostaria que o Bispo de Roma se chamasse Francisco II, João XXIV ou Paulo VII.
A rede internacional anti-Francisco opera com todo o seu poder. Divulga a ideia de que há um duelo entre conservadores e progressistas, e apresenta como candidatos Robert Sarah, Raymond Burke, Gerhard Müller, que nunca serão eleitos. Sua voz mais agressiva, Carlo Viganò, afirmou: “O Concílio Vaticano II foi o câncer, Francisco é uma metástase”. Como esse grupo ideológico é minoritário, surgem candidatos supostamente moderados: Péter Erdő, da Hungria; Albert Ranjith, do Sri Lanka; Anders Arborelius, da Suécia.
O conclave deverá decidir em que ritmo continuará a reforma sinodal e missionária da Igreja, quem pode seguir o diálogo misericordioso com o mundo, de qual continente convém que venha o papa. Não é uma questão geográfica, mas envolve o papel do Sul global na Igreja do futuro. É preciso escolher alguém com personalidade própria e pertencimento geocultural.
Se for preferido um cardeal asiático, convém que seja das Filipinas, o terceiro país com maior população católica depois do Brasil e do México. Luis “Chito” Tagle — com quem compartilhou jornadas desde 2014 — foi arcebispo de Manila, teve um avô budista chinês, encarna o diálogo inter-religioso, é o único papável que integrou a Comissão Teológica Internacional, tem enorme carisma para pregar e se comunicar com os jovens.
Entre os cardeais latino-americanos estão Luis Rueda, de Bogotá, e Sergio da Rocha, de Salvador da Bahia. Da América do Norte vem Robert Prevost, que foi bispo no Peru e preside o dicastério para os bispos; em Quebec está Gérald Lacroix.
A África é o continente onde o catolicismo mais cresce. Na última assembleia sinodal destacou-se Cristóbal López, bispo em Rabat, Marrocos, que viveu no Paraguai.
Dois europeus não italianos se destacaram no último triênio: Jean-Marc Aveline, de Marselha, nascido na Argélia, comprometido com os migrantes e o diálogo tricontinental no Mediterrâneo; José Tolentino, prefeito de Cultura e Educação, com um diálogo requintado com a cultura atual. Também o espanhol Ángel Fernández Artime, vice da irmã Simona Brambilla no dicastério para os consagrados.
Alguns querem um papa italiano e propõem o secretário de Estado Pietro Parolin, ex-núncio. Argumentam que a Igreja não deve abandonar a Europa em sua crise, que o cenário mundial requer um papa diplomático e que ele seria um moderado capaz de impor ordem.
Mencionam Matteo Zuppi, arcebispo de Bolonha, membro da Comunidade de Santo Egídio, com perfil pastoral; e Gianbattista Pizzaballa, jovem patriarca latino de Jerusalém. Não mencionam Roberto Repole, arcebispo de Turim, que presidiu a Associação Teológica Italiana. Ele é um dos bispos nomeados nesta década com 55 anos, como em Buenos Aires e Madri, e um dos cardeais jovens, como Francis Leo, do Canadá; José Cobo, da Espanha; François Bustillo, da França; ou Giorgio Marengo, na Mongólia.
Se se deseja avançar rapidamente no processo sinodal, a figura é Mario Grech, de Malta, secretário do Sínodo. Com ele e com o relator Jean-Claude Hollerich, de Luxemburgo, trabalhei desde 2021. Os temerosos antissinodais os consideram progressistas, uma palavra que já carece de significado no âmbito eclesial. Não sabem que Francisco, no hospital Gemelli, aprovou uma agenda que leva a uma assembleia sinodal mundial em 2028 e que Grech já a comunicou a todos os bispos.
Nomen est presagio. Nome é missão. O papa jesuíta escolheu o nome do Poverello, que tem uma grande potência renovadora. Em 2013, em Assis, recordou a união de São Francisco com Jesus e a missão que lhe foi confiada: reparar minha casa. Expôs três traços de seu carisma: o amor aos pobres desde seu abraço à Senhora Pobreza; o ideal pacificador cifrado no lema Paz e Bem; a fraternidade universal expressa no Cântico das Criaturas. Ou seja, a identificação com Cristo, a reforma da Igreja, o amor aos pobres, a luta pela paz, a defesa da criação.
Com esse nome, o papa latino-americano marcou três prioridades: a dignidade diante da desigualdade, a paz contra a violência, o cuidado da casa comum. Então se entende melhor a “encíclica” de seus gestos: viver pobremente, abraçar a todos, promover o encontro, defender os migrantes, nomear mulheres, conversar com jovens, animar o diálogo ecumênico e inter-religioso.
Um dia ele me disse: durante a perseguição nazista, Pio XII destinou casas religiosas para os refugiados e transformou o palácio de Castel Gandolfo em hospital para judias grávidas. Se o quarto do papa foi a sala de parto, como eu vou para lá de férias? E transformou-o em centro histórico.
O futuro bispo de Roma encontrará uma Igreja com duzentos milhões de batizados a mais do que em 2010, em uma humanidade muito frágil e um mundo globalizado e fragmentado. Deverá ser místico e profético, tentar incluir a todos, escutar muito, ser compassivo, transmitir esperança, lutar contra os abusos, ensinar com sua austeridade, governar de forma colegiada e sinodal, comunicar o Evangelho atraindo, não conquistando. Se for do Sul, poderá avançar para uma Igreja mais intercultural. Se não for, deveria situar-se nas periferias para compreender o mundo inteiro.
O sucessor de Pedro é chamado a amar a Jesus, o Bom Pastor, e a servir ao seu povo. Ele é o Deus–Homem, “aquele que nos amou” (Rm 8,37), como se intitula a última encíclica. O cristianismo crê, com São João, que “Deus é Amor” (1 Jo 4,8), e ensina, com São Paulo, que “o mais importante é o amor” (1 Cor 13,13). Com seus limites, Francisco manifestou a terna humanidade de nosso Deus.