13 Novembro 2015
"É uma mudança de atitude que o papa propõe à Igreja italiana: mais evangélica e menos política, mas sem se refugiar no espiritualismo. João Paulo II tentou trazer para a Itália o modelo polonês, mas essa tentativa de importação de um modelo não é o que Francisco quer. Francisco não tem um plano de ação eclesial, mas sim uma eclesiologia que é profundamente conciliar."
A opinião é do historiador italiano Massimo Faggioli, professor de história do cristianismo e diretor do Institute for Catholicism and Citizenship, na University of St. Thomas, nos EUA.
A entrevista foi concedida a Pierluigi Mele, publicada no blog Confini, 11-11-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis a entrevista.
Comecemos pelas obscuras histórias do Vatileaks 2. Se o objetivo era de pôr o Papa Francisco em dificuldades, esse objetivo fracassou completamente. Qual é a sua opinião?
Os Vatileaks 1 e 2 pertencem ao passado, enquanto a visão da Igreja de Francisco é o futuro. A reforma de Francisco (e Francisco é um papa que não tem medo de falar de "reforma") prossegue, e o que veio à tona ainda são naturezas mortas de abusos e imoralidades passadas, dos quais ainda vemos os vestígios. Mas os tempos mudaram com Francisco, e não há dúvida de que todos percebem as diferenças abissais entre Francisco e o mundo que existia antes dele em certos âmbitos do Vaticano.
Em relação ao discurso do papa proferido no Duomo de Florença para a Igreja italiana: para muitos observadores, ele marca uma virada da "política" eclesial dos últimos 30 anos. É isso?
É uma mudança de atitude que o papa propõe à Igreja italiana: mais evangélica e menos política, mas sem se refugiar no espiritualismo. João Paulo II tentou trazer para a Itália o modelo polonês, mas essa tentativa de importação de um modelo não é o que Francisco quer. Francisco não tem um plano de ação eclesial, mas sim uma eclesiologia que é profundamente conciliar. Em certo sentido, poderia ser a retomada do Vaticano II na Itália, depois de 30 anos de modelos que eram o fruto de outras estratégias. Francisco fala pouco do Vaticano II de maneira direta, mas é claro que ele faz referência ao Vaticano II, que ele introjetou e assimilou de um modo muito profundo.
Quais são os pontos de reviravolta?
Especialmente a advertência de Francisco contra os "substitutos" – poder, dinheiro, aparência – que faziam parte de um certo modo de ser católico (clérigos e leigos) na cena pública. A centralidade dos pobres não só do ponto de vista social, mas também espiritual. O papel da Igreja não como lobby, mas como mãe de todos e, especialmente, dos pobres. A abordagem ao diálogo como distintivo de um certo modo de ser Igreja no mundo plural de hoje.
Pode nos explicar o ataque ao "pelagianismo" e ao "gnosticismo"?
São dois modos clássicos de criticar uma certa ideia de catolicismo que prescinde da centralidade de Jesus Cristo e da simplicidade e gratuidade da sua mensagem. Francisco é radicalmente um centrista em termos teológicos.
Entre os pontos abordados no discurso, rico e denso, chama a atenção a referência a "Don Camillo e Peppone". Dois personagens imaginários que marcaram a Itália no imediato pós-guerra. Alguns acharam fraca essa referência do papa, porque, na época, havia um povo. Hoje, não há nada disso. Como deve ser entendida essa referência?
Eu acho que o papa não se referia àquele modelo social e civil da Itália, mas àquele modelo de pastoralidade do ministério: Don Camillo via Peppone também como uma das ovelhas do seu rebanho. Era uma igreja universalista mesmo no mundo das divisões ideológicas. Hoje, às vezes, parece prevalecer o sectarismo e um catolicismo ideológico. Não é o principal problema da Igreja Católica na Itália, mas, em outras partes do mundo, certamente sim. Isso teve consequências sobre um certo modo de perceber a função do bispo e também influenciou sobre um certo modelo de nomeações episcopais. O perfil pastoral dos bispos nomeados por Francisco é visivelmente diferente dos nomeados nos 35 anos anteriores.
No seu discurso, o papa instou a Igreja italiana a ser "criativa". Você acha que a comunidade eclesial do nosso país está à altura?
Veremos. Certamente, a Igreja italiana tem riquezas espirituais que estiveram em silêncio por muito tempo, e não só por culpa de uma certa política vaticana, mas também por causa da refratariedade da cultura secular italiana para interagir com a católica. O importante é que o Congresso Eclesial de Florença de 2015 é um teste importante em nível mundial para a "Igreja da colegialidade" que Francisco delineou no discurso ao Sínodo no dia 17 de outubro.
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A nova temporada da Igreja: mais evangélica e menos política, mas sem se refugiar no espiritualismo. Entrevista com Massimo Faggioli - Instituto Humanitas Unisinos - IHU