Por: Cesar Sanson | 16 Outubro 2012
O diretor executivo da Agência de Informação Frei Tito para América Latina – ADITAL – Ermanno Allegri fala para o sítio da Adital, 15-10-2012, sobre as impressões do Congresso Continental de Teologia, que foi encerrado no último dia 11, em São Leopoldo, Rio Grande do Sul.
Eis a entrevista.
Terminou o Congresso e todos voltaram para seus trabalhos cotidianos. Quais suas impressões gerais destas Jornadas Teológicas?
Foram dias cheios de fortes emoções, de fortes ideias e de grandes perspectivas para o futuro. Mas o primeiro aspecto que quero destacar é que esse Congresso me deixou uma felicidade profunda pelo contato direto com os teólogos da América Latina. Esses pensadores que alguém vê como ‘perigosos’ transmitem a sensação de profunda humanidade. São pessoas de uma extrema simplicidade com que você se relaciona facilmente: conversa, faz fotos, fica com eles na fila para fazer o prato para almoçar, senta junto nos momentos de oração. Muitos têm um destacado sentido de humor brincando com os colegas sobre seus títulos de estudo, sobre livros e ideias condenados, sobre os cabelos brancos que já não podem esconder...
Um momento geral de comoção profunda foi a palestra que Gustavo Gutierrez [autor do livro Teologia da Libertação, que completa 40 anos de edição] nos proporcionou via internet. Este ‘pai da teologia da libertação’ falava com o coração como se estivesse aí, na sala, no nosso meio. Os três minutos de aplausos que seguiram foram como uma consagração geral daquela pessoa, da sua vida, de seus escritos. Senti naqueles minutos de aplausos uma empatia profunda de sentimentos com Gustavo Gutiérrez e a consciência de que o que nasceu na América Latina foi verdadeiramente fruto do Espírito. É um novo ar que não pode ser acorrentado em nenhuma jaula.
Então a Teologia da Libertação é a irrupção de uma novidade na igreja do nosso continente?
E não só do nosso continente. Hoje reparamos que a Teologia da Libertação é verdadeiramente universal, não no sentido que todos vão recebê-la como uma nova doutrina para ser estudada daqui em diante, mas no sentido que ela descobriu o sentido profundo da vida humana mais sofrida e do motivo da encarnação de Jesus Cristo na história da humanidade. Os polos: Jesus Cristo (o verdadeiro, o histórico e não o que sempre se disse dele e o que se imaginou dele) e os pobres (excluídos) se encontram e nasce a faísca que toca fogo na história e provoca novas relações, novos caminhos de liberdade e solidariedade.
Ao mesmo tempo em que é universal esta teologia é também reinventada em cada cultura e momento histórico. Não está feita e fixada em regras e em dogmas para os próximos 500 anos, mas se recria numa dinâmica permanente, porque se move dentro da vida que está sempre em movimento, é dinâmica permanente.
A Teologia da Libertação, apesar de hostilizada, continua viva e chegou a outros continentes...
É um movimento que não tem retorno, apesar das investidas dos que não percebem seu valor humano e evangélico. Há uma nova e profunda vivência da fé expressada na Teologia da Libertação. Por esta fé, para criar uma humanidade mais justa, milhares de pessoas se tornaram vítimas da perseguição de governos civis, militares e até eclesiais. Quem acredita, não para, não volta atrás.
Um momento alto do Congresso foi a descoberta, para muitos, que a Teologia da Libertação também é fortemente vivida e produzida na Ásia: na Índia, no Vietnam, em Taiwan, nas Filipinas desenvolvendo com mais força a teologia feminista. O teólogo vietnamita Peter Phan lembrou que a necessidade de refletir a fé dentro da vida foi o terreno natural para nascer uma nova teologia. Países sofridos e explorados na Ásia repensaram sua fé e o contexto da teologia latino-americana foi como continuação natural do projeto local de pensar uma fé cristã autenticamente asiática.
E como será a continuidade desse Congresso? Os primeiros e mais conhecidos teólogos têm certa idade...
Eles têm consciência disso tanto que na noite em que ouvimos a palestra de Gustavo Gutiérrez eles chamaram ‘os dinossauros’ da teologia presentes e fizeram uma foto muito simpática e alegre.
Mas dentro do Congresso houve um grupo de uma centena de jovens, teólogos e estudantes de teologia, que assumiram compromissos sérios de se encontrar, de estudar e produzir material popular e acadêmico, para dar continuidade a essa linha teológica procurando envolver sempre mais as igrejas. Ficou claro que, o que interessa, não é uma doutrina, mas o que ela significa: uma fé encarnada para que o Jesus Cristo de Nazaré, concreto e histórico, continue sendo esperança para as massas que sobram dentro de um modelo social excludente e assassino.
A Teologia da Libertação será sempre uma voz que não se encaixa, que discorda?
Alguns teólogos deixaram claro que o verdadeiro desastre social é quando no sistema dominante há harmonia entre economia, cultura, política, meios de comunicação. Quando não há mais contradições e há consenso generalizado é o totalitarismo da economia de mercado que domina e quem não entra neste esquema que se dane. Nesse panorama sombrio e de barbárie, qual o lugar das religiões, da fé? Queremos ser funcionais ao sistema, deixar as consciências adormecidas ou topadas com um Jesus transformado em pop star? Quem topa o desafio de Jesus Cristo de viver ao lado dos pobres de hoje? Eles são bilhões.
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Impressões do Congresso Continental de Teologia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU