Por: Cesar Sanson | 20 Março 2012
Especialistas aprovam medidas de emergência para retomada do crescimento, mas afirmam que ainda falta política ampla para quem produz.
A reportagem é de Sylvia Miguel e publicada pelo jornal da Usp, 18-03-2012.
As medidas conservadoras adotadas no primeiro trimestre de 2011 pela equipe recém-empossada da presidente Dilma Roussef bateram à porta. O pífio desenvolvimento econômico foi revelado este mês pela taxa de crescimento do PIB, que ficou em 2,7% em relação a 2010, quase a metade da previsão. Os mais recentes movimentos da equipe econômica, já esperados pelo mercado, estão no caminho correto para retomar o crescimento, na opinião de alguns analistas. Porém, promover esse ambiente estimulante não será suficiente para tirar a indústria brasileira da depressão em que mergulhou nos últimos anos, afirmam especialistas.
O professor Simão Davi Silber, da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da USP, ressalta que o “ambiente estimulante” vem sendo promovido, principalmente, pela redução agressiva da taxa básica de juros, pela desoneração de impostos em alguns segmentos industriais e o controle do câmbio. Também se incluem nessa conta o aumento de impostos para captações no mercado internacional, além dos investimentos em infraestrutura por conta da Copa do Mundo em 2014. “No curto prazo não esperamos choques adversos vindos de fora e com esse ambiente interno será possível já sentir a retomada do crescimento a partir de abril”, afirma.
“Na verdade, o governo está correndo para apagar um incêndio. O aumento dos juros e a política conservadora promovida no início do mandato teve como resultado o reduzido crescimento da economia. Pressionado internamente para conter a inflação, o governo foi na contramão da tendência mundial de baixa dos juros básicos”, avalia a professora Leda Paulani, da FEA, referindo-se à política econômica adotada no início do ano passado em meio à crise internacional e aos abalos sofridos pelo euro em agosto de 2011.
Para Leda, o desempenho da economia em 2011 foi ruim, “mas já houve anos piores”, diz a professora, mencionando “os oito anos do governo de Fernando Henrique Cardoso”.
“Há hoje um fluxo de investimentos produtivos entrando e um ambiente favorável no geral. Com isso, a perspectiva é que ao final deste mandato presidencial os juros reais da economia cheguem até 2% ou 3%”, afirma o professor José Roberto Ferreira Savoia, também da FEA. Atualmente, a Selic – a taxa básica dos juros da economia – está em 9,75% e a inflação, 5,5%. A diferença desses dois indicadores dá a taxa real de juros, atualmente de 4,25%. “Após as oscilações previstas para 2012 e 2013, podemos projetar a taxa real de juros para algo em torno de 2% a 3% ao final de 2014”, afirma Savoia.
A taxa real de juros é hoje um componente do custo de capital das empresas. Portanto, a redução da Selic acaba diminuindo o custo de capital das empresas, o que é benéfico para o investimento produtivo.
Indústria
O professor Savoia ressalta que este é um momento em que aumentarão os investimentos das empresas no Brasil, o que refletirá positivamente sobre a taxa de participação da indústria no PIB. “Mas só esse ambiente favorável não reverte a situação da indústria nacional, que vive sob constantes percalços devido ao câmbio desfavorável e a uma carga tributária excessivamente alta”, alerta.
Savoia defende uma política estratégica direcionada ao setor produtivo, de modo a promover setores fortes e proteger os mais sensíveis. Os números do PIB revelaram que a participação da indústria no crescimento econômico foi a pior em 50 anos, ficando em 14,6%. A fatia é semelhante à participação da indústria no PIB durante o governo de Juscelino Kubitschek (1956-1961), quando essa taxa ficou em 13,75%. Naquele momento, o governo tomou medidas de urgência, resultando no Plano de Metas, cujo lema propunha a meta do desenvolvimento: “Cinquenta anos em cinco”.
Independentemente dos argumentos sobre se o País tem ou não uma política industrial, o que precisa ser feito agora é pensar de forma abrangente o que será a economia industrial dos próximos 20 anos, defende Savoia. “É injusto deixar essa estratégia só a cargo dos empresários. O governo precisa ter participação nisso. Preocupa muito os rumos da política industrial, porque ora se escolhem segmentos vitoriosos nos quais investir, ora deixam que o mercado resolva.”
Para Savoia, a falta de uma política estratégica fragiliza ainda mais “setores novos e setores dinâmicos”, pois “são os que mais precisam de proteção para crescer”. O professor defende “uma política mais ampla e capaz de incentivar a tecnologia, a competitividade e a inovação na indústria.”
Na opinião do professor Silber, o governo já sinalizou a intenção de adotar algumas medidas protecionistas para estimular a indústria nacional, como dificultar a entrada de produtos da China e aplicar retaliações à Argentina. A Administração Federal de Ingressos Públicos (Apif), a Receita argentina, tem exigido dos importadores uma declaração sobre quanto pretendem importar. A liberação da licença de importação tem atrasado até mais de 60 dias a entrada de bens de consumo brasileiros, como automóveis, partes e peças, máquinas agrícolas, calçados e alimentos. O governo brasileiro já avisou que prepara uma resposta “dura” ao país vizinho.
“Agora o governo está apagando incêndio. No longo prazo, o ideal seria promover as reformas que aguardamos há mais de 20 anos. A carga tributária é enorme, mas o governo não pode abdicar disso porque tem que cumprir com suas obrigações. Para reduzir a carga de impostos, teria que reduzir os gastos e promover as reformas tributária, previdenciária e outras”, afirma Silber.
Segundo a professora Leda, há décadas o Brasil mantém uma das menores taxas de investimento da indústria de bens de capital, segmento responsável pela produção de uma série de máquinas e equipamentos voltados à produção de outros bens e, portanto, indicador da saúde do setor industrial como um todo.
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“Indústria precisa de política estratégica” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU