21 Julho 2021
"Ninguém imaginou que eles chegariam a tanto: ao descumprimento dos preceitos constitucionais por meio do ativismo político-partidário, para o desmonte do Brasil e da democracia brasileira, subservientes à política do espectro total estadunidense, construindo uma estrutura neocolonial no século XXI, mediante a edificação de novas Casas Grandes e Senzalas, onde eles se arvoram a ser os novos senhores de engenho nacionais", escreve Alexandre Aragão de Albuquerque, arte-educador (UFPE), especialista em Democracia Participativa (UFMG) e mestre em Políticas Públicas e Sociedade (UECE).
Eis o artigo.
Como é que as Forças Armadas pensam em cicatrizar as feridas abertas no seio das famílias brasileiras, diante das revelações contundentes dos inquestionáveis indícios de negligências e corrupção praticadas por coronéis sob o comando do general Pazuello no Ministério da Saúde?
As revelações das tenebrosas transações são resultado da corajosa e responsável ação de investigação dos representantes do povo no Senado Federal, à frente da CPI do Genocídio. Tal pergunta paira nos corações e mentes de todas as rodas de conversa, do Oaipoque (AP) ao Chuí (RS).
Essa é uma questão fundamental para o futuro da democracia. Torna-se mais que necessária a publicação de uma nota oficial dos generais, pedindo desculpas pelos desmandos, negligências e atos ilícitos dos diversos integrantes da Corporação, que contribuíram diretamente para a morte de quase 600 mil cidadãos e cidadãs, destruindo centenas de milhares de lares brasileiros, em virtude do imbróglio político-administrativo e dos indícios de atos de corrupção na condução do combate à pandemia.
Além das desculpas, como ato contínuo, os militares precisam retornar para a caserna e cumprir sua missão constitucional. O desastre social em que o Brasil foi colocado pelas mãos do governo bolsonarista, que conta com a participação de sete mil militares em funções as mais diversas na administração federal, impõe-lhes o retorno imediato aos seus postos de trabalho no castro, conforme determina a Constituição Federal.
Hoje no Brasil militarizado de Bolsonaro um litro de gasolina custa R$6,20 (seis reais e vinte centavos), um botijão do gás de cozinha está na casa dos R$120,00 (cento e vinte reais), a cesta básica encontra-se valendo R$1.066,00 (um mil e sessenta e seis reais), o desemprego bate um recorde histórico. Além disso, eles dilapidaram nossa liderança nos BRICS e no diálogo geopolítico Sul-Sul. E entregaram nossas riquezas estratégicas para o Capital Internacional.
A história recente demonstra que, desde o Golpe de 2016, há uma militarização da política, com a adoção de valores, práticas e códigos, conduzindo o País a uma radicalização sem precedentes, decorrência do ativismo militar de natureza político-partidária, numa proporção muito além do mero exercício de direitos políticos individuais, pelo total apoio em 2018 à candidatura de Jair Bolsonaro, conforme ele mesmo reconheceu em cerimônia oficial, em 02 de janeiro de 2019, ao agradecer e responsabilizar o Comandante do Exército, general Villas Bôas, por sua vitória. Entre uma centena de fatos, chama atenção o caso do slogan totalitário da campanha bolsonarista, que surgiu nos anos 1960, durante a ditadura militar, pouco depois da publicação do Ato Institucional 5 (AI 5), em 13 de dezembro de 1968, criado por um grupo de capitães paraquedistas: “Brasil acima de tudo”.
Há dois anos e meio, o Brasil possui um governo dos generais, mais militarizado do que o da ditadura militar de 1964, controlado pelo partido militar. O presidente Jair não é a figura dirigente do partido; a direção é composta por um núcleo restrito de generais que controla, orienta e gerencia o governo, o presidente e as narrativas sobre seus papéis políticos.
As evidências da existência do partido militar podem ser apresentadas segundo as categorias presentes nos partidos políticos formais, a saber: memória histórica, vocação institucional, base ideológica, pautas corporativas e de interesse específico, direção partidária encarregada da distribuição do poder, controle do governo, quadros partidários, formação de lideranças, base eleitoral e militante.
Desde então, o Brasil está submetido a um processo de destruição das conquistas sociais civilizatórias produzidas pelos governos passados de Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. Bolsonaro anunciou em 17 de março de 2019, setenta e cinco dias após a sua posse, em jantar com representantes da extrema-direita estadunidense, haver chegado ao poder para levar adiante um projeto de desconstrução de inúmeras conquistas nacionais. Afirmou: “O Brasil não é um terreno aberto onde iremos construir coisas para o nosso povo. Nós temos de desconstruir muita coisa”. Todas as conquistas sociais das políticas progressistas estão sendo destruídas: SUS, Universidades Públicas, Planos de carreira dos Servidores Públicos, Proteções Ambientais, Política de Valorização do Salário Mínimo, Bolsa Família, Minha Casa Minha Vida, Pré-Sal, Eletrobrás.
Ninguém imaginou que eles chegariam a tanto: ao descumprimento dos preceitos constitucionais por meio do ativismo político-partidário, para o desmonte do Brasil e da democracia brasileira, subservientes à política do espectro total estadunidense, construindo uma estrutura neocolonial no século XXI, mediante a edificação de novas Casas Grandes e Senzalas, onde eles se arvoram a ser os novos senhores de engenho nacionais.
O ano de 2022 apresenta-se como um momento crítico para o povo brasileiro exercer uma séria reflexão sobre a importância do voto. Porque voto não tem preço, tem consequências. Inclusive é preciso compreender melhor a importância do voto nos membros do Congresso Nacional – senadores e deputados federais.
Afinal, foram eles que em 2016 deram início ao Golpe, quando destituíram ilegalmente a presidenta Dilma Rousseff. Em 2022 o povo brasileiro precisa derrotar de forma acachapante Bolsonaro com seus deputados e senadores bolsonaristas.
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