Mobilização nacional defende comunidades remanescentes quilombolas contra retrocessos em direitos estabelecidos, por Sucena Shkrada Resk

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05 Agosto 2017

"Em pouco mais de um mês, quatro companheiros quilombolas foram mortos. Observamos ao longo do tempo, a impunidade na solução desses casos. Temos feito uma mobilização intensa no país, sem deixar de dialogar com os órgãos, exceto neste governo, com o qual não está tendo a mínima possibilidade, pois está aprofundando cada vez mais a crise e a corrupção no país" escreve escreve Sucena Shkrada Resk, jornalista e especializada em Meio Ambiente, em artigo publicado por EcoDebate, 04-08-2017.

Eis o artigo.

Nos últimos anos, está sendo construído um cenário de retrocessos no campo dos direitos humanos no Brasil, que ferem a Constituição de 1988. Atualmente, uma causa que ganha visibilidade é a das comunidades remanescentes quilombolas. Isso acontece, porque o julgamento iniciado em 2012, sobre a Ação Direta de Inconstitucionalidade ADI nº 3239/2004 realizada pelo Partido Democratas (DEM), antigo Partido da Frente Liberal, no Supremo Tribunal Federal (STF), está sendo retomado no início da segunda quinzena de agosto. O objeto da ação é o decreto 4887/2003, que regulamenta a titulação de terras remanescentes quilombolas, e corre o perigo de ser anulado. Segundo levantamento da Fundação Palmares, são mais de 3.600 comunidades remanescentes certificadas até julho deste ano pela organização e cerca de 260 estão em análise técnica para certificação. Mas o número de comunidades pode ser bem maior, ultrapassando seis mil, segundo representações do segmento quilombola.

Mesmo com o decreto em vigor, os processos de titulações ainda são lentos no país. Somente 258 comunidades têm propriedade definitiva em 168 territórios quilombolas titulados pelo Instituto Nacional Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). De acordo com levantamento realizado pela Comissão Pró-Índio, nos últimos sete anos, o orçamento do instituto sofreu uma queda de 94%, o que praticamente inviabiliza os processos, que estão atualizados até mês de setembro do ano passado.

Com relação à ADI nº 3239/2004, uma mobilização nacional foi iniciada por representantes das comunidades remanescentes quilombolas com apoio de diferentes segmentos da sociedade civil com o intuito de que a decisão da Justiça seja contrária à ação. É a campanha O Brasil é Quilombola! Nenhum Quilombo a Menos!, na qual também foi elaborada uma petição, que está aberta a adesões e vídeos de mobilização, com o apoio do Instituto Socioambiental (ISA) e de Uma Gota no Oceano.

A mobilização rebate os argumentos expostos pelo DEM, entre os principais, de que é inconstitucional no decreto reconhecer às pessoas, que por auto-atribuição, se declararem como remanescentes de comunidades quilombolas, o direito à propriedade de terras, que no período imperial, formavam os quilombos.

A legislação diz o seguinte – “…remanescentes das comunidades dos quilombos, para os fins deste Decreto, os grupos étnico-raciais, segundo critérios de auto-atribuição, com trajetória histórica própria, dotados de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida…” . Este conceito se ampara também na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário, que assegura aos grupos e comunidades tradicionais o direito de se autodefinirem.

Em 2013, Andreza do Socorro Pantoja de Oliveira Smith, advogada e Mestre em Direitos Humanos, fez uma análise sobre a relatoria desse processo, que estava sob a condução do ministro Antonio Cesar Peluso (hoje aposentado) e deu parecer favorável à ADI, condicionando os efeitos da decisão para “declarar bons, firmes e válidos” os títulos de tais áreas, emitidos até agora, com base no Decreto 4.887/2003.

“Avaliar que a propriedade não pode ser coletiva para os remanescentes de quilombos, é impedir que eles possam construir formas de desenvolvimento próprias, de acordo com suas práticas sociais e culturais, inclusive pelo valor diferenciado dado ao território ocupado”, disse a especialista a respeito do voto favorável. Em 2015, a ministra Rosa Weber abriu a divergência e votou pela improcedência da ação, entendendo pela constitucionalidade do decreto presidencial. Segundo ela, o dispositivo é autoaplicável e não necessita de lei que o regulamente, portanto não houve invasão da esfera de competência do Poder Legislativo pela Presidência da República. Saiba mais.

O Blog Cidadãos do Mundo – jornalista Sucena Shkrada Resk entrevistou Givânia Maria da Silva, da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), que apresenta a avaliação da organização sobre o processo em andamento.

1) Qual é o posicionamento da Conaq com relação ao decreto 4.887/2003 e a retomada do julgamento da ADI, em agosto, pelo STF? O decreto 4.887/2003 é um instrumento que veio para regulamentar o artigo 68 do ato das disposições constitucionais transitórias da Constituição de 88. A Conaq foi parte do grupo que construiu esse texto, no ano de 2003, e debateu por meses, qual seria o melhor instrumento. Substituiu o decreto 3.912, que apresentava vários problemas temporais e conceituais.

O conteúdo do decreto 4.887/2003 tem tudo a ver com o que pensam os movimentos sociais e o Conaq, sobretudo no que tange a quem cabe a responsabilidade de quem titular e aos conceitos de terra e de comunidade quilombola. O Partido DEM está promovendo um processo de genocídio da comunidade negra, com esta ação. Estamos trabalhando fortemente para que esse julgamento não aconteça. Temos receio, porque nem todos estão comprometidos com os direitos dos trabalhadores, e Direitos Humanos.

2) A Comissão Pastoral da Terra (CPT), em seu levantamento sobre violência no campo, tem apresentado o aumento de casos com vítimas quilombolas, em diferentes localidades do país. O que tem a dizer a respeito desta situação? E quais são as principais ações da Conaq hoje?

Nos últimos tempos, temos dedicado a energia para a questão da terra. Não estamos falando só da terra, mas como a compreendemos que seja possível de morar, de forma ambientalmente correta e que permita aos nossos filhos produzirem com dignidade na vida e para as futuras gerações. Tem havido o aumento da violência, da expropriação, do conflito principalmente com as grandes obras e mineradoras, e com o agronegócio. Em pouco mais de um mês, quatro companheiros quilombolas foram mortos. Observamos ao longo do tempo, a impunidade na solução desses casos. Temos feito uma mobilização intensa no país, sem deixar de dialogar com os órgãos, exceto neste governo, com o qual não está tendo a mínima possibilidade, pois está aprofundando cada vez mais a crise e a corrupção no país.

Formulamos uma denúncia internacional. Caso o STF vote a favor da ADI, chancelará uma lei equivalente à da escravidão. A Conaq entende que o julgamento é intempestivo. Tantos temas parados no Supremo e justamente neste momento que o governo brasileiro vem arrastado e derrotado na democracia, se coloca mais um ataque aos trabalhadores, que podem sofrer uma derrota.

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