Projeto analisa poluição por microplástico em praia do litoral paulista

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24 Fevereiro 2017

A poluição nas praias por derivados sólidos de petróleo revela uma das consequências do atual modelo de produção e consumo das sociedades modernas e expressa o total descuido das populações e gestores públicos com o descarte adequado de resíduos entendidos como lixo.

A reportagem é de João Malavolta,publicada por Envolverde, 20-02-2017. 

De acordo com o artigo 1º da Convenção das Nações Unidas sobre o Direto do Mar (CNUDM) a poluição marinha é definida como a introdução pelo homem, direta ou indiretamente, de substâncias ou de energia no meio marinho, incluindo os estuários, sempre que a mesma provoque ou possa vir provocar efeitos nocivos, tais como danos aos recursos vivos e à vida marinha, riscos à saúde do homem, entrave às atividades marítimas, incluindo a pesca e as outras utilizações legítimas do mar, alteração da qualidade da água do mar, no que se refere à sua utilização, e deterioração dos locais de recreio (CNUDM, 1982).
Essa poluição tem se tornado uma crescente ameaça aos ambientes costeiros e marinhos por causa do aumento de materiais não degradáveis, principalmente material plástico. Eles são os mais comuns e persistentes nos oceanos e praias de todo mundo, devido à degradação mais lenta do plástico ocorrer no oceano do que em terra (GOLIK & GARTNER, 199; MOORE, 2008 apud BISI et al., 2011).

Todos os anos entre 8 e 12 milhões de toneladas de plástico ingressam nos oceanos. Esse material é gerados tanto a partir de atividades marítimas, quanto terrestres como a pesca, o turismo e a precária gestão de resíduos. Embora a quantidade total no oceano seja desconhecida o plástico já é encontrado em todo o mundo, incluindo as regiões polares, longe de sua fonte de geração (UNEP 2014).


Crescimento da produção mundial de plástico / Fonte: www.weforum.org

A pesquisa realizada no litoral paulista, denominada “Projeto Microplástico“, que está sendo desenvolvida pela Ecosurf, desde 2015, realizou um estudo de análise e quantificação do microplástico distribuído na Praia dos Pescadores na cidade de Itanhaém.

O estudo durou cerca de 180 dias e contou com saídas de campo, processo de quantificação e classificação do material plástico recolhido, no laboratório da Escola Técnica Estadual de Itanhaém (ETEC).


Área de estudo na Praia dos Pescadores / Imagem: Google Maps



Tipicamente os plásticos são definidos como: pedaços de plástico ou de fibras e podem ser divididos em dois grandes grupos: macroplásticos (fragmentos > que 5 mm) e microplásticos (< que 5 mm), (ARTHUR et al., 2009; HIDALGO-RUZ et al., 2012 apud PEREIRA, Flávia Cabral, 2014, p. 5).

Partículas microplásticas também consistem em material plástico manufaturado de tamanho microscópico, como abrasivos utilizados em produtos de limpeza industrial e domésticos (DERRAIK, 2002), além de matérias-primas industriais utilizadas para produção de plásticos (pellets), (OGATA et al., 2009 apud VEDOLIM, M, 2014, p.2) e fragmentos e fibras de plásticos derivados da quebra de produtos plásticos maiores (MOORE, 2008 apud PEREIRA, Flávia Cabral, 2014, p. 5).

Atualmente, produtos de higiene pessoal e cosméticos possuem em suas fórmulas micropartículas feitas de resinas sintéticas (polietileno (PE), polipropileno (PP), polietileno tereftalato (PET), polimetilmetacrilato (PMMA)).


Microplástico retirado de creme dental / Foto: João Malavolta

Os microplásticos são formados por fontes geradoras primárias e secundárias. As fontes primárias são aquelas que possuem microplásticos em sua composição, como cosméticos – cremes esfoliantes e produtos de higiene pessoal – pasta de dentes. As fontes secundárias geram o microplástico a partir do processo da fragmentação e/ou sua decomposição pelos raios solares ultravioletas (UV).

Área de estudo

Em Itanhaém a Praia dos Pescadores foi escolhida para o estudo por possuir características geomorfológicas peculiares. O ambiente possui o total de 22.341 m2 de área.

A pesquisa considerou como amostragem ideal a investigação 5.395m2 do total da praia, o que equivale a cerca de 25% da faixa de areia (1/4 do total).

A metodologia aplicada pelo estudo utilizou o sistema de isolamento de área através de transectos. Dessa forma foi possível determinar uma linha padrão para a coleta das amostras.


Transectos na área de estudo / Imagem: Google Maps


Foram montados 18 transectos (T01 ao T18) e distribuídos ao longo de toda extensão dos 22.341m2 da praia. Cada ponto foi definido com o auxilio de uma trena, estaca e barbante, estabelecendo um transecto de 5 mt de largura, que se estendia (cumprimento) da área da face da praia na maré mais baixa no momento da coleta, até a primeira barreira natural ou ocupação urbana.


Divisão do transecto em quadrantes de análise / Foto: Vinícius Patrocínio

Cada transecto teve três pontos de coleta (sub-transectos) definidos, sendo estes descritos como quadrantes do transecto (Q1, Q2 e Q3), que correspondem a 33,3% da metragem do total de cada transecto, localizados entre zonas da praia.

Os 18 pontos analisados demonstraram que os transectos divididos em grupos de seis áreas, nos três setores amostrados da praia (norte, centro e sul), totalizaram 5.395 mt2, o que representou 24,1% da área total do ambiente mostraram-se confiáveis como método representativo da área.

Devido ao tamanho do microplástico a equipe de pesquisa permaneceu realizando a coleta durante 60 minutos, em cada transecto, o que permitiu maior possibilidade e padrão de recolha dos resíduos.


Microplástico na areia da Praia dos Pescadores / Foto: João Malavolta

Conforme análise, os microplásticos mais encontrados foram nas medidas entre < 5 mm a < 2,5 mm, representando 86% do total de 4.770 unidades de fragmentos plástico, como demonstra a Tabela abaixo e o Gráfico 03.

Destacou-se nessa categoria os pellets, (Gráfico 03) que correspondem a maior abundancia de itens descobertos em todo ambiente, cerca de 55% do total. Já itens < 2,5 mm, representaram 14% do material achado pela pesquisa.

No setor norte da praia foi contabilizado a menor quantidade de fragmentos, 714 itens de microplástico, distribuídos nos seis transectos – 01 a 06. Nesta área a pesquisa analisou 1.845m2, que corresponde a 08,25% do total.


Coleta manual de microplástico / Foto: Caio César

No caso do setor centro, na análise dos transectos: 07 a 12 houve um acréscimo de 1.058 fragmentos de microplástico em comparação ao setor norte, totalizando 1.772 itens encontrados em 2.040 m2 de praia. O que evidencia o aumento da sujidade do local nessa região.

A distribuição da poluição ao longo da praia mostrou uma tendência de aumento no sentido norte – sul. O setor sul totalizou 2.284 itens de microplástico encontrados.

Nos três setores amostrados ao longo da distribuição de 18 transectos na praia foi possível observar um gradiente da repartição do microplástico em maior quantidade na área de pós-praia, onde os fragmentos mais leves são depositados pela corrente de deixa de detritos, em cada fluxo de maré alta.


Divisão da praia sem setores / Imagem: Google Maps

O setor sul foi a área mais poluída da praia representando 48% do total de toda distribuição de resíduos.

Vale destacar que em todos os gráficos de quantidade apresentados os campos localizados no Quadrante 03 de cada transecto, próximos ao primeiro obstáculo na área urbanizada da praia, foram os locais com maior deposição de material plástico.


Vegetação na areia facilita a retenção do microplástico / Foto: João Malavolta

Resultados

A Praia dos Pescadores apresentou uma quantidade extremamente alta de poluição por microplástico. Segundo os dados amostrais produzidos pela pesquisa é possível afirmar que 88% da área total estudada da praia tem resíduos sólidos de plástico de baixa densidade, < 5mm, depositados em suas areias. Ainda, conforme os dados sistematizados, o padrão de sujidade da areia, quando extrapolados espacialmente para o total da praia mantém a mesma proporção devido a homogeneidade do ambiente.


Microplástico separado, quantificado e classificado por tamanho / Foto: João Malavolta


No entanto, estudos complementares são necessários para ampliar ainda mais o conhecimento sobre as informações e dados estatísticos produzidos pela pesquisa.

Portanto, a poluição da praia pelo microplástico reflete um problema global de poluição marinha e reforça a ideia do relatório, “A Nova Economia do Plástico: Repensando o Futuro dos Plásticos”, produzido pela Fundação Ellen MacArthur e apresentado no último Fórum Econômico Mundial, em 2015, na Suíça, onde existe a afirmação, que nos próximos 34 anos, a quantidade de lixo plástico no oceano vai superar, em peso, a de peixes.


O mundo do plástico / Imagem: www.weforum.org

A solução para os problemas ambientais visando à diminuição do consumo de plástico e seu descarte inadequado deve passar por um amplo trabalho de educação para a sustentabilidade junto aos povos, e um novo pacto entre os governos, indústrias, sociedade civil e demais tomadores de decisão, para a busca de soluções conjuntas, que consigam criar cenários que favoreçam a diminuição do consumo de embalagens descartáveis, a economia circular e o uso racional dos bens naturais.


Pesquisadores: Caio César, João Malavolta, Felipe Nogueira, Alisson Antônio e Vinícius Patrocínio


Para saber mais sobre a pesquisa, entre em contato através do e-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.


Referêcias

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