23 Junho 2025
"É difícil, neste momento, dissipar a suspeita de que o ataque repentino de Israel ao Irã, e não a ameaça nuclear, tenha sido decidido para desviar a atenção internacional da violência diária, cada vez mais gratuita e inaceitável, contra a população palestina inocente, unindo em defesa do Estado judaico os governos que, como o inglês, começavam então a aprovar sanções contra os ministros ultraortodoxos de Tel Aviv".
O artigo é de Giuseppe Savagnone, diretor do Escritório para a Pastoral da Cultura da Arquidiocese de Palermo, publicado no site Pastoral da Cultura da Diocese de Palermo, e reproduzido por Settimana News, 22-06-2025.
O ataque de Israel ao Irã foi considerado por todos os governos ocidentais e pela grande maioria da opinião pública e da imprensa como um preço necessário para a defesa – não apenas do Estado judaico, mas de nossas democracias – da iminente ameaça atômica de um regime autoritário e terrorista.
Daí as reações que vão desde os tons mais extremos da nossa imprensa de direita – "Finalmente! O Irã bestial está prestes a cair" (Libero) – até as reações grosseiramente realistas do chanceler alemão Mertz, que definiu a operação militar como "o trabalho sujo que Israel faz para todos nós".
De fato, desde o início, Netanyahu vinculou o objetivo de deter o programa nuclear do Irã a outro: a queda do governo dos aiatolás e a mudança de regime, fazendo um apelo ao povo iraniano nesse sentido.
Isso explica, além do bombardeio de instalações nucleares, a estratégia de decapitação sistemática de líderes políticos e militares de Teerã e as palavras ameaçadoras e desdenhosas do Ministro da Defesa israelense, Israel Katz, ao Presidente iraniano Khamenei: "Advirto o ditador iraniano: quem seguir os passos de Saddam Hussein acabará como Saddam Hussein". Uma referência ao enforcamento do chefe de Estado iraquiano, após sua derrota na Guerra do Golfo de 2003, que certamente vai muito além do objetivo limitado da neutralização pura e simples da arma atômica, abrindo, em vez disso, os cenários de uma guerra total.
Nessa linha, o presidente Trump também dirigiu seu pedido a Teerã, que não era negociar sobre energia nuclear, mas, como o chefe da Casa Branca escreveu em letras maiúsculas em seu site, “rendição incondicional”. E suas palavras sobre Khamenei soam tão violentas quanto as de Katz: “Sabemos exatamente onde o chamado ‘Líder Supremo’ está escondido”, escreveu ele nas redes sociais. “Ele é um alvo fácil, mas está seguro lá. Não o eliminaremos, pelo menos não por enquanto. Mas (...) nossa paciência está se esgotando.”
A posição da União Europeia é diferente: embora apoie totalmente a guerra de Israel, distanciou-se expressamente do projeto de mudança de regime, enfatizando, em vez disso, a necessidade de uma distensão que leve o atual governo iraniano de volta à mesa de negociações com os EUA. "Qualquer tentativa de mudar o regime levaria ao caos", alertou o presidente francês Macron.
Não que o regime iraniano seja visto com bons olhos no Ocidente. Ele é sobrecarregado por acusações bem fundamentadas de dissidentes internos e observadores externos, que há muito tempo denunciam a repressão sistemática das liberdades civis e políticas, com especial referência às limitações impostas às mulheres, com base na aplicação rígida da lei islâmica.
Estamos diante de um fanatismo religioso que mistura indistintamente as prescrições do Alcorão e as regras de convivência civil e que está na própria origem do atual sistema do Irã, nascido de uma revolta, em 1979, contra o governo laico do Xá, culminando com a ascensão ao poder do aiatolá Ruhollah Khomeini, do qual o atual presidente é sucessor.
Estamos muito longe da distinção entre Estado e Igreja que, mesmo sem sempre a respeitar na prática, inspirou, no entanto, em princípio, a civilização ocidental, cujas raízes espirituais não são um fundador ao mesmo tempo religioso e político, um guia espiritual e chefe de exércitos, como Maomé, mas a figura daquele profeta desarmado que foi Jesus.
Daí a dificuldade de entendimento mútuo entre os países mais fortemente ligados à sua matriz religiosa islâmica – na realidade, não apenas o Irã, mas também um fiel aliado do Ocidente, como a Arábia Saudita – e os herdeiros da tradição cristã, que agora está, por sua vez, amplamente secularizada. Daí também a crítica ao que, da perspectiva ocidental, parece ser uma clara violação dos direitos humanos.
Some-se a essa divergência fundamental o fato de o Irã ser o inspirador e financiador de grupos islâmicos extremistas como o Hezbollah e o Hamas, e estar por trás de atos terroristas contra Israel e o Ocidente. Como tal, está incluído na lista de "Estados desonestos" elaborada pelo governo americano. Isso basta para explicar a satisfação com que muitos governos acolheram o ataque de Tel Aviv, mesmo sem aderir, como os Estados Unidos, à ideia de guerra total e mudança de regime.
No entanto, mesmo neste nível mínimo, o conflito que explodiu nos últimos dias os desorientou e os forçou a fazer mudanças significativas em sua linguagem e atitude.
Considere o princípio, solenemente enunciado e repetido em todas as oportunidades – primeiro para a guerra na Ucrânia, depois para a guerra em Gaza – segundo o qual "não é possível colocar o agressor e o agredido no mesmo nível". Foi com base nesse mantra indiscutível que o Ocidente apoiou (até a chegada de Trump) a abordagem de Zelensky à guerra com a Rússia, excluindo a priori qualquer negociação até que o agressor se retirasse. E foi ainda mais claramente esse princípio que justificou o apoio total a Israel, por um ano e meio, ignorando os métodos do exército de Tel Aviv, em nome do slogan "Israel tem o direito de se defender" e da justificativa: "Eles não começaram".
Toda tentativa, mesmo por parte de figuras de autoridade, como o Secretário-Geral da ONU, Guterres, de salientar que, na complexidade do curso dos acontecimentos, a fronteira entre o agressor e o atacado não é tão nítida, e que o contexto também deve ser levado em conta, provocou até agora reações indignadas de políticos e comentaristas fervorosos em sua defesa "a priori" do atacado.
O ataque de Israel ao Irã nos obrigou a mudar rapidamente de posição sobre esse ponto. Neste caso, tornou-se essencial, para justificar o apoio a essa agressão, relembrar o contexto e analisar o que aconteceu antes de 13 de junho e que esclarece seu significado. No entanto, se adotarmos esse critério, devemos concordar retroativamente com Guterres, quando, em seu discurso na ONU em 24 de outubro de 2023, após deplorar a ferocidade do massacre de 7 de outubro, destacou que "os ataques do Hamas não ocorreram no vácuo. O povo palestino foi submetido a 56 anos de ocupação sufocante".
E ele também poderia ter se lembrado do drama da Nakba, a expulsão de pelo menos 300 mil palestinos (segundo a estimativa moderada do historiador judeu israelense Ben Morris) de suas terras. Mas essa referência ao contexto foi suficiente para enfurecer o representante israelense e indignar comentaristas em todo o Ocidente ("Uma enormidade", definiu nosso Paolo Mieli). E 7 de outubro tornou-se o início de tudo, enquanto 13 de junho deve ser considerado "em seu contexto".
Mesmo a condenação unânime e incontestável do terrorismo, como uma ação violenta contra indivíduos, até mesmo civis, sem qualquer legitimidade legal, entra em crise.
No ataque ao Irã, o Mossad matou, além de líderes militares e políticos, 14 cientistas – físicos e engenheiros – em ataques que os explodiram junto com suas famílias. O que pensaríamos se serviços secretos estrangeiros fizessem isso com cientistas – mas também com políticos e líderes militares – responsáveis apenas por trabalhar a serviço do nosso país? Matando também suas esposas e filhos inocentes? É provavelmente a isso que a chanceler alemã se refere quando fala do "trabalho sujo que Israel faz por todos nós". Mas será que ainda estaremos apoiando o terrorismo que condenamos com razão, quando outros são responsáveis por ele?
O fato é – e já foi respondido até agora – que a ameaça nuclear iraniana representa um perigo tão grave, para Israel e para todos, que justifica até mesmo esses compromissos. Mas será que essa ameaça realmente existe? A pergunta poderia parecer provocativa, se não fosse feita, nos últimos dias, pelo New York Times e pela CNN que, a propósito da possível entrada dos Estados Unidos na guerra, evocaram o espectro da Guerra do Golfo de 2003, desencadeada por George Bush Jr. com base em falsas evidências de que o Iraque possuía "armas de destruição em massa".
Relembrando essa farsa, jornalistas americanos relatam que, em março, a diretora de inteligência nacional indicada por Trump, Tulsi Gabbard, testemunhou perante o Congresso que, de acordo com a comunidade de inteligência dos EUA, o Irã não está construindo nenhuma arma nuclear.
Gabbard enfatizou a esse respeito que, de acordo com informações coletadas pela inteligência americana, "o líder supremo Khamenei não autorizou a retomada de um programa de armas nucleares, suspenso em 2003".
Por sua vez, a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), que publicou um relatório em 12 de junho afirmando que o Irã "violou suas obrigações de fornecer à AIEA cooperação plena e oportuna em relação a material nuclear não declarado e atividades em vários locais não declarados no Irã", agora esclareceu, por meio de seu diretor Rafael Grossi, que isso não implica uma referência à construção de uma bomba: "Não tivemos nenhuma evidência de um esforço sistemático (por parte do Irã) para adquirir uma arma nuclear."
E daí? Com base em quê tudo isso está acontecendo, com seus imensos custos humanos, morais, políticos e econômicos? A resposta é simples: com a palavra de Netanyahu, o único que resta para garantir que o Irã esteja prestes a adquirir uma arma nuclear.
Só que, se acreditarmos em Netanyahu, nestes dezoito meses o exército israelense respeitou rigorosamente os direitos humanos dos palestinos, tanto em Gaza quanto na Cisjordânia, e as denúncias feitas não só pelo Tribunal Penal Internacional, mas agora também por governos aliados de Israel, são fruto de uma indigna "cruzada antissemita".
É difícil, neste momento, dissipar a suspeita de que o ataque repentino de Israel ao Irã, e não a ameaça nuclear, tenha sido decidido para desviar a atenção internacional da violência diária, cada vez mais gratuita e inaceitável, contra a população palestina inocente, unindo em defesa do Estado judaico os governos que, como o inglês, começavam então a aprovar sanções contra os ministros ultraortodoxos de Tel Aviv.
Um plano, aliás, coroado de sucesso, se é verdade que os massacres em Gaza são cada vez mais sangrentos, mas a opinião pública mundial está polarizada em relação às "feras iranianas".
Quaisquer que sejam as falhas do regime de Teerã, neste momento o que está em jogo são as nossas democracias, que sempre as denunciaram com razão. Somos nós, a opinião pública e os governos ocidentais, que devemos decidir se seguimos Israel nesta corrida rumo ao suicídio da democracia – cada vez mais distanciada dos valores de verdade e justiça que a tornam tal – ou se temos a coragem de nos distanciar e dizer, com firmeza, o nosso "basta!"