21 Agosto 2024
“Este é um ato ilegal que constitui uma violação flagrante das noções fundamentais de liberdade de consciência e dos direitos humanos”, comentou um porta-voz do Patriarcado Russo, Vladimir Legoida, no Telegram.
A reportagem é publicada por RFI, 20-08-2024.
O Parlamento ucraniano adotou nesta terça-feira um projeto de lei que prevê a proibição da Igreja Ortodoxa ligada ao Patriarcado de Moscou e considerada como um representante de influência do Kremlin, após dois anos e meio de invasão russa na Ucrânia.
"Decisão histórica! O Parlamento aprovou um projeto de lei que proíbe uma filial do país agressor na Ucrânia", escreveu a deputada ucraniana, Iryna Gerashchenko, no Telegram. Segundo outro parlamentar, Yaroslav Zhelezniak, 265 deputados votaram a favor deste documento, sendo exigido no mínimo 226.
“Não haverá Igreja de Moscou na Ucrânia”, acrescentou o chefe da administração presidencial ucraniana, Andriï Iermak, no Telegram.
Perda de popularidade
A igreja visada por esta decisão já foi a mais popular na Ucrânia, um país com uma grande maioria ortodoxa. Mas perdeu muitos seguidores nos últimos anos, à medida que o sentimento nacional ucraniano ganhou popularidade diante da Rússia.
Este processo foi acelerado com a criação, em 2018, de uma Igreja Ortodoxa Ucraniana independente de Moscou, e ainda mais com o início, em fevereiro de 2022, da invasão russa na Ucrânia, abertamente apoiada pelo Patriarcado de Moscou.
Segundo Yaroslav Zhelezniak, a nova lei, que ainda deve ser promulgada pelo presidente Volodymyr Zelensky antes de entrar em vigor, dará nove meses às paróquias para "cortar os seus laços com a Igreja Ortodoxa Russa", que apoia a invasão russa da Ucrânia.
“Esperamos que a decisão de hoje acelere a transição destas paróquias para a Igreja Ortodoxa independente da supervisão de Moscou”, acrescentou a deputada Iryna Guerachchenko.
De acordo com relatos da mídia, a igreja ligada à Rússia ainda tem cerca de 9 mil paróquias na Ucrânia, em comparação com a estimativa de 8 mil a 9 mil paróquias da sua rival independente.
A proibição de cada uma delas terá de ser aprovada por um tribunal. Por isso, segundo especialistas ucranianos, a supressão de paróquias ligadas a Moscou pode levar meses, até anos.
Fim de relações com a Rússia
A Igreja Ortodoxa alvo desta proibição anunciou em maio de 2022 que cortaria todos os laços com o Patriarcado de Moscou e acusou as autoridades ucranianas de perseguição. Mas o governo ucraniano acredita que ela continua dependente da Rússia e vários dos seus representantes são alvo de investigações criminais.
A decisão do Parlamento ucraniano visa “destruir a ortodoxia canônica e verdadeira e colocar em seu lugar uma substituta, uma falsa Igreja”, disse nesta terça-feira a porta-voz da diplomacia russa, Maria Zakharova, citada pela televisão estatal.
Segundo uma sondagem realizada em 2023 pelo Instituto Internacional de Sociologia de Kiev, 66% dos ucranianos eram a favor da proibição da igreja ligada a Moscou.
Além disso, 54% dos ucranianos se identificaram com a igreja independente e apenas 4% com a que está sujeita ao Patriarcado Russo, de acordo com um estudo de opinião realizado pela mesma organização em 2022, em comparação com respectivamente 42% e 18% no ano anterior.
Leia mais
- Ucrânia, ferida no coração da Rússia. Artigo de Lucio Caracciolo
- Qual é o objetivo da Ucrânia na incomum incursão terrestre em território russo e que implicações isso tem? Artigo de Jesús A. Núñez
- Ucrânia. Por que a guerra não pode ter fim
- Ucrânia: a guerra volta-se contra quem a atiçou. Artigo de Michael Hudson
- Como a paz foi impedida na Ucrânia e na Europa. Artigo de Domenico Gallo
- A guerra deve acabar. EUA relutam na busca de uma paz negociada. Entrevista com Jeffrey Sachs
- Não à guerra entre Ucrânia, OTAN e Rússia
- Ucrânia: os generais da OTAN começam a recuar
- Proibida a Igreja Ortodoxa ligada ao Patriarcado da Rússia
- Igreja Ortodoxa Ucraniana pede “compaixão humana e misericórdia cristã”
- A ortodoxia diante da guerra. Entrevista com Lorenzo Prezzi
- A guerra entre os ortodoxos. Artigo de Marco Ventura
- O impasse bélico da Ortodoxia
- Ucrânia: Igreja Ortodoxa ligada a Moscou contra iniciativas de lei que "visam descaradamente privar milhões de ucranianos do direito à liberdade de religião"
- Igreja Ortodoxa Russa incentiva treinamento militar de jovens
- Kirill para Putin: 'santo subito'. Artigo de Lorenzo Prezzi
- Ucrânia. O Patriarca Kirill pede às paróquias que apoiem a guerra de Putin
- Rússia: Hilarion termina a sua carreira. Artigo de Lorenzo Prezzi
- “O Patriarcado de Moscou está implodindo”, afirma especialista russo
- O Patriarca da Rússia, Kirill, apelou aos russos para se unirem para derrotar as forças do mal. “O exército, os políticos e a igreja devem unir-se para a vitória”
- “A guerra na Ucrânia é a demonstração de que hoje somos mais manipulados do que nunca”. Entrevista com Ignacio Ramonet