05 Mai 2021
A quem queria enviar um recado o cardeal Camillo Ruini, que em entrevista a Il Foglio, alertava para o risco de cisma na Igreja alemã, por causa das bênçãos "católicas" dos casais homossexuais? O tema é conhecido (junto com a ordenação sacerdotal das mulheres, o celibato dos padres e assim por diante) e se arrasta há muito tempo, tanto que o próprio Papa Francisco em uma "carta" enviada à Igreja alemã em 2019 exortou os católicos e as hierarquias dos países liderados pela chanceler Merkel a permanecer unidos a Roma. Também é sabido que em 15 de março passado a Congregação para a Doutrina da Fé publicou um Responsum, citando a aprovação explícita do Papa Francisco, em que é negada a possibilidade de qualquer forma de bênção para os casais homossexuais. Nem é preciso dizer que a notícia correu o mundo.
A reportagem é de Maria Antonietta Calabrò, publicada por Huffington Post, 04-05-2021. A tradução é de Luisa Rabolini.
O presidente da Conferência Episcopal alemã, D. Georg Bätzing, bispo de Limburg, tomou as distâncias de uma bênção pública programada por alguns padres para o próximo dia 10 de maio (motivada pela observação de que "a bênção de Deus não pode ser negada a quem a pede"), que será preciso ver que consequências terá.
O fato mais interessante citado por Ruini - mas esta resposta é, assinala o próprio cardeal, já contida no Responsum da Congregação - é que “simplesmente, a Igreja não tem o poder de abençoar tais uniões. De fato, só pode receber bênção o que está em conformidade com os desígnios de Deus, não o que é contrário a eles, como as uniões entre pessoas do mesmo sexo”.
Dito tudo isso, para quem toca o sino de Dom Camillo? Para quem está falando o "doutor sutil" da Igreja? Um esboço da resposta pode ser encontrado no que aconteceu dentro da Igreja Católica logo após a publicação do documento da Doutrina da Fé. Tanto na Alemanha (mas também na Áustria, onde o cardeal Schönborn, um dos alunos favoritos de Ratzinger, divulgou sua posição) e nos Estados Unidos, onde vive o padre James Martin, o jesuíta que se dedicou ao cuidado pastoral das pessoas homossexuais também com o apoio da revista "América" em que escreve.
Segundo alguns, o lema "Roma locuta, causa finita" ("O Papa falou, a questão está encerrada") deveria ser invertido em "Roma locuta, causa infinita", porque se olharmos de perto, o juízo do Papa Francisco na realidade seria diferente daquele da Congregação. Sim, diz-se, Francisco autorizou a publicação do Responsum sem dizer explicitamente que o compartilhava, isto é, sem “aprová-lo de forma específica”. Francisco não optou por essa solução. Também poderia ter impedido a publicação, mas também não fez isso. E então? Dado que a “mens pontificia” seria - segundo esta interpretação - diferente daquele da Congregação para a Doutrina da Fé, a questão não estaria de forma alguma encerrada.
E, de fato, o suposto novo clima criado por Francisco sobre o tema dos casais homossexuais levou 210 teólogos alemães a se manifestarem a favor da tese rejeitada pela Congregação e o bispo de Mainz, Peter Kohlgraf, afirmou: “As bênçãos resultam de um acompanhamento pastoral das pessoas envolvidas. Não se trata de fórmulas que replicam aquelas matrimoniais, nem há intenção de encontrar uma formulação específica”.
Em outubro, polêmicas (no sentido inverso) explodiram após as palavras do Papa incluídas no documentário "Francisco", no qual Francisco defendia a necessidade de uma legislação civil sobre as uniões homoafetivas. Devemos então nos perguntar: existe a possibilidade de uma nova intervenção papal sobre o tema? Foi diante dessa temida perspectiva que tocou o sino de "Dom" Camillo Ruini? E se após 500 anos da Reforma de Martinho Lutero, a Alemanha pode voltar a ser um novo terreno de cisma, não é garantido que não seja necessário esconjurá-lo também em algum outro lugar, visto que a direita da Igreja estadunidense parece cada vez mais concordar nisso com a visão do ex-núncio Carlo Maria Viganò.
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Cardeal italiano adverte sobre os riscos de cisma na Igreja alemã - Instituto Humanitas Unisinos - IHU