08 Junho 2019
Angus analisa a perda do sentido público e social do ensino superior e o avanço da universidade corporativa.
A entrevista é de Constanza Bonsignore, publicada por Página/12, 07-06-2019. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.
"A universidade está em crise", diz o filósofo canadense Ian Angus. Em seu livro "Amar las preguntas" (Wolkowicz), Angus explica como a universidade está perdendo o significado público e social que teve por décadas em face do avanço da universidade corporativa. Na entrevista Angus analisa como esse processo de transformação tem ocorrido e, consequentemente, como mudou a lógica e o modo de pensar sobre o conhecimento na universidade.
Eis a entrevista.
Por quais indicadores você considera que a universidade está em crise?
As universidades mudam de país para país, embora haja uma origem europeia que tenhamos mais ou menos tudo em comum. A grande maioria dos países tem um conceito de universidade pública, e a universidade pública tem como objetivo formar indivíduos, ajudá-los a desenvolver um emprego, entre outros objetivos. Mas também tem uma função que vai além do indivíduo. Pode-se até dizer que seu objetivo é desenvolver o conceito de cidadania, desenvolvimento social e econômico, conhecimento em geral. Isso é o que é destruído hoje.
Quais seriam as causas?
A universidade perdeu o propósito social público que já teve de duas causas centrais. Uma é a queda do financiamento. E o outro vem dessa ideia de pensar a educação como uma simples ajuda ao indivíduo para entrar no mercado de trabalho. A queda do financiamento está ligada a uma política especificamente ligada ao sistema capitalista e a essa era neoliberal. Além disso, existem outras tendências importantes que mudaram, como o avanço da tecnologia e todo o universo da informação e comunicação. Hoje em dia, o conhecimento é pensado como uma mercadoria.
Neste contexto de crise é onde a universidade corporativa surge?
A universidade pública tem alguma distância do Estado e também das corporações. Não é totalmente independente. Tem o seu jeito de se organizar e de se governar, que é um processo interno da universidade. Em geral, o que aconteceu é que o Estado começou a restringir os fundos necessários, de modo que a universidade começou a perder a capacidade do que normalmente deveria fazer. A universidade começou a procurar fundos, por outro lado, e é assim que as corporações entram no ambiente universitário. Mas as corporações têm seus próprios interesses: elas apoiam o que lhes interessa para obter algum valor disso, através do mercado fundamentalmente.
No seu livro refere-se à relação da universidade com o Iluminismo.
Meu objetivo era avaliar o estado atual da universidade, então tive que investigar a história da universidade e seus conceitos centrais. Escolhi o conceito de iluminismo no sentido do indivíduo, da sociedade e especialmente com base em uma instituição que tem o propósito de desenvolver e compartilhar conhecimento. No livro, argumento que esse conceito perdeu força e acho que devemos ter a herança desse pensamento crítico que teve o Iluminismo como o apoio de instituições universitárias.
Por que você sustenta que todo esse processo produziu uma transformação do conhecimento?
Instituições foram alteradas pela interpenetração de tecnologia e ciência. Nesse sentido, há uma transformação do conhecimento. O conceito que uso é o da tecnociência, pois é uma forma de captar em uma palavra a íntima conexão entre conhecimento e tecnologia. Ele mudou o modelo de conhecimento e conhecimento. O conhecimento se tornou uma mercadoria. Existe uma lógica neoliberal que concebe o conhecimento como algo já feito, que pode ser apreendido à mão e, assim, ser salvo, vendido ou passado adiante. Mas o conhecimento nunca é um produto acabado, nunca estamos no início do processo.
O que é possível fazer neste cenário de crise?
De certa forma, busco valorizar e resgatar o ideal do Iluminismo, que nada mais é do que a busca de conhecimento que gere pensamento crítico. Uma pessoa que gosta de falar sobre educação tem que respeitar o Iluminismo, que é respeitar a esperança. Todos os jovens que querem estudar têm alguma esperança e é isso que devemos sempre respeitar.
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"Hoje o conhecimento é uma mercadoria". O filósofo Ian Angus e a crise da universidade - Instituto Humanitas Unisinos - IHU