29 Novembro 2018
"Se o povo brasileiro acha que o Petrolão foi o maior escândalo de todos os tempos do país, esperem até ver o que fizeram no BNDES", dizia uma imagem que viralizou no WhatsApp dias antes do segundo turno das eleições presidenciais.
A reportagem é de Amanda Rossi, publicada por BBC Brasil, 27-11-2018.
Vinha acompanhada de diversas outras que mostravam supostas obras financiadas pelo banco no exterior - algumas reais e outras que nunca chegaram a ser feitas. Parte das imagens tinha a frase "ah, se fosse no Nordeste", com o símbolo $ no lugar do "s".
O alcance das publicações foi extenso. Nos dias 22 e 23 de outubro, na semana que antecedeu a escolha do próximo presidente, o BNDES foi o principal tema de conversa de centenas de grupos públicos acompanhados pelo projeto Monitor do WhatsApp - metade das 60 imagens mais compartilhadas nesses dias foram sobre o banco de desenvolvimento brasileiro.
A polêmica sobre o BNDES é um assunto comum nos discursos do futuro presidente Jair Bolsonaro (PSL) - cujos apoiadores são os que mais usaram WhatsApp nas eleições. Em postagem no Twitter em 8 de novembro, Bolsonaro assumiu o compromisso de "abrir a caixa-preta do BNDES" logo no início do governo, e "revelar ao povo brasileiro o que feito com seu dinheiro nos últimos anos".
Bolsonaro disse ainda que, caso o próximo presidente do BNDES, Joaquim Levy, não abra a "caixa-preta", "ele está fora" do cargo, segundo áudio divulgado pela imprensa.
Mas, afinal, existe uma "caixa-preta" do BNDES? E o que ela poderia revelar?
Não está exatamente claro a que o futuro presidente se refere quando utiliza o termo "caixa-preta". A BBC News Brasil procurou representantes da área econômica do futuro governo, apontada como a que poderia responder sobre o assunto, mas não teve retorno.
A resposta simples para a pergunta é que o banco, de fato, mantinha muitos dados em segredo e se recusava a fornecer informações. Mas, a partir de 2015, após grande pressão da imprensa e de órgãos de controle, o BNDES se tornou mais transparente - passou a divulgar detalhes sobre seus empréstimos, não só os atuais, mas também os passados, englobando as operações feitas durante os governos do PT.
Essa transparência permite uma maior investigação e avaliação pela sociedade. Por outro lado, quando se fala em "caixa-preta", a interpretação do termo pode se referir também à revelação de informações não oficiais, como gravações de conversas, delações de funcionários.
Nesse sentido, é impossível prever se existem ou não irregularidades a serem reveladas.
Firmo o compromisso de iniciar o meu mandato determinado a abrir a caixa preta do BNDES e revelar ao povo brasileiro o que feito com seu dinheiro nos últimos anos. Acredito que este é um anseio de todos. Um forte abraço!
— Jair M. Bolsonaro (@jairbolsonaro) 8 de novembro de 2018
A BBC News Brasil procurou pessoas e órgãos que já haviam criticado a falta de transparência do BNDES no passado, para saber o que pensam hoje.
Um deles é o Tribunal de Contas da União (TCU), um órgão federal que fiscaliza as contas públicas. Em um debate no Senado em 2015, o então procurador do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU), Júlio Marcelo de Oliveira relatou: "Não temos como avaliar se o banco aplica os recursos bem ou não. O banco é hoje uma caixa preta na administração pública. O BNDES resiste a todas as tentativas de fiscalização mais profunda do TCU".
Segundo o TCU, essa situação mudou a partir de 2015. Hoje, o órgão diz receber do banco "todas as informações que lhe foram requisitadas". Inclusive, TCU e BNDES firmaram, recentemente, uma parceria para divulgar mais dados do banco ao público.
"Não se pode deixar de registrar a boa vontade dos gestores do BNDES de contribuir, de trazer as informações do banco a público", afirmou o presidente do TCU, ministro Raimundo Carreiro, no evento de assinatura do acordo de cooperação entre as instituições, nesta terça-feira. Na ocasião, o BNDES publicou outros tipos de informação em sua página de transparência, como o fluxo de desembolso dos empréstimos.
Quem também já criticou a falta de transparência do BNDES é o economista Sérgio Lazzarini, do Insper, que analisa dados do banco há mais de uma década - com um viés crítico, diga-se de passagem, mostrando as mazelas das relações entre os setores público e privado.
Lazzarini concorda com o TCU e diz que o BNDES se tornou mais transparente a partir de 2015. "O BNDES está sendo muito sincero e transparente sobre o que está acontecendo no banco. Por incrível que pareça, o BNDES está hoje até mais avançado que outros bancos internacionais", disse Lazzarini, que é PhD pela Universidade de Washington e foi professor visitante em Harvard, em 2010 e em 2012.
Um exemplo do que o BNDES divulga, e outros bancos públicos de desenvolvimento não costumam revelar, são os próprios contratos de financiamento relacionados a obras no exterior.
Assim, parte dos dados que os críticos pleiteiam já está disponível online. Por outro lado, há informações que permanecem em sigilo, como a análise de risco sobre os tomadores de empréstimo. O BNDES alega que esses dados são protegidos por sigilo fiscal e bancário e que sua divulgação traria consequências para o mercado de capitais - em outras palavras, ao ter sua classificação de risco divulgada, as empresas podem ter seus negócios impactados. A decisão sobre divulgar ou não esses dados está sendo analisada pela Justiça.
Hoje, estão disponíveis planilhas com os nomes das empresas beneficiadas, valores dos empréstimos, taxas de juros, prazo de pagamento, tipo de garantia. É possível consultar os dados no próprio site do BNDES ou baixar arquivos completos.
Assim, sabemos, por exemplo, que a Odebrecht foi a principal beneficiada por uma modalidade de empréstimos do BNDES destinada a financiar a exportação de bens e serviços de construção civil - em outras palavras, a realização de obras no exterior. Foram R$ 9 bilhões para projetos da empreiteira - 65% do total desembolsado pelo banco nesse segmento.
Outro exemplo: também é possível consultar todas as operações em benefício da JBS - que também foram motivo de polêmica.
O BNDES ainda passou a divulgar quanto recebeu de aportes do Tesouro - e quanto já devolveu. Isso é importante porque o Tesouro é nada menos que o caixa principal do Estado.
Sobretudo a partir de 2008, o Tesouro passou a aportar recursos no BNDES com o objetivo de aumentar o volume de empréstimos do banco - por exemplo, para financiar obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), ajudar a Petrobras a investir e financiar setores que eram considerados estratégicos pelo então governo.
Isso gerou um passivo, que o BNDES precisa devolver para o Tesouro - mais um alvo de críticas. Os dados mostram que o BNDES captou R$ 416 bilhões do Tesouro. E devolveu R$ 309 bilhões.
Reprodução da primeira página do contrato entre o BNDES e o governo de Cuba para construção do porto de Mariel, documento disponível no site do banco (Foto: Reprodução)
Dessa forma, se por um lado o BNDES tem lucro, repassando dividendos e pagando tributos para o Estado (foram cerca de R$ 130 bilhões entre 2001 e 2016), por outro lado, o banco tem sido financiado pelo próprio Estado.
"É uma situação artificial. É a mesma coisa que você contrair empréstimo no banco e usar o dinheiro para fazer um investimento. Você vai ter rendimentos, apesar de estar endividado", comenta Lazzarini.
Mas é importante ressaltar que o principal objetivo do BNDES não é ter lucro e repassar recursos para o Estado. Criado durante o governo de Getúlio Vargas, em 1952, o banco tem como propósito financiar o desenvolvimento da economia do Brasil, com empréstimos de longo prazo e taxas de juros competitivas (que chegam à metade do que é cobrado pelos bancos privados), tanto para governos estaduais e municipais como para empresas.
Assim, o BNDES tem um objetivo diferente de outros bancos públicos, como o Banco do Brasil e a Caixa Econômica. Não dá para abrir uma conta no BNDES, por exemplo. Nem pedir empréstimo para comprar um carro ou uma casa.
A importância do BNDES no fomento da atividade econômica no Brasil é grande: o banco responde por cerca de metade do volume total de financiamentos para pessoas jurídicas com prazo de pagamento acima de cinco anos.
Diversos outros países do mundo também têm bancos de desenvolvimento, como Alemanha, Japão, França, Coreia do Sul, além da China. O propósito é o mesmo: financiar o desenvolvimento de seus países, com operações de longo prazo.
Mas para onde vai o dinheiro? O portfólio de empréstimos inclui obras de infraestrutura pagas pela União, Estados e municípios. São rodovias, ferrovias, metrôs, iniciativas de saneamento básico, usinas hidrelétricas, parques de energia eólica.
Há também os empréstimos para o setor privado desenvolver atividades no Brasil e no exterior. Na lista de beneficiários privados ou de capital misto, constam empresas como Vale, Petrobras, Embraer, BRF e Natura.
É no incentivo ao setor privado que residem as maiores polêmicas. Entre os maiores beneficiários do BNDES nos últimos anos estão grandes empresas no coração de investigações de combate à corrupção - como as já citadas Odebrecht e JBS.
A revitalização do Porto do Rio de Janeiro foi um dos primeiros projetos apoiados pelo BNDES, na década de 1950 (Foto: Reprodução/ BNDES)
A divulgação dessas informações, no entanto, é razoavelmente recente. Durante muitos anos, o BNDES viveu um clima de segredo.
Para se ter uma ideia, em 2012, um mês após a entrada em vigor da Lei de Acesso à Informação, o então ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, tornou secretos documentos do banco que tratavam de empréstimos aos governos de Cuba e de Angola.
No ano seguinte, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva concedeu uma entrevista sobre a África e foi questionado se era a favor de mais transparência no BNDES. "Eu não sei quais são as necessidades de transparência de um banco. Eu acho que o BNDES tem que ter a mesma transparência que tem o Banco de Boston, o Itaú, o Bradesco…", respondeu Lula.
Diferentemente do BNDES, esses três bancos citados por Lula são privados.
Essa opacidade fez o BNDES ser alvo de fortes críticas. Órgãos de controle, Congresso e imprensa faziam pressão constante para o banco abrir seus dados.
Uma primeira reviravolta ocorreu no começo de 2015, de forma inesperada. "O Congresso da República Dominicana postou no seu site um contrato com o BNDES. Isso veio a público aqui no Brasil. Foi um achado, um tesouro, uma descoberta de Indiana Jones", lembra o economista Lazzarini, que já vinha tentando acessar informações desse tipo, sem sucesso.
Em seguida, também naquele ano, o BNDES sofreu uma derrota na Justiça. O banco havia entrado com um mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal, questionando um pedido do TCU por informações sobre operações assinadas com a JBS/Friboi. Segundo o BNDES, os dados estavam protegidos por sigilo bancário.
No julgamento, o ministro relator Luiz Fux declarou: "Aquele que contrata com o BNDES deve aceitar que a exigência de transparência justifica o conhecimento por toda a sociedade de informações que possam influenciar seu desempenho empresarial". O BNDES foi, então, obrigado a abrir os dados para TCU.
Segundo o TCU, esse julgamento de 2015 foi um divisor de águas - antes, o BNDES negava os dados, depois, passou a fornecer todas as informações solicitadas.
"O BNDES é um órgão público, mas é um banco. Tínhamos dois valores que se tensionavam: transparência e sigilo bancário - que é do cliente, não do banco. Mas a partir daí (do julgamento no STF em 2015), o BNDES vem tomando uma série de ações de transparência. É hoje um dos bancos mais transparentes do mundo. O mais transparente do Brasil, seguramente", afirma Ricardo Ramos, diretor de estratégia e transformação digital do BNDES.
A BBC News Brasil consultou os sites de outros bancos públicos de desenvolvimento, como o CDB, da China, e o KfW, da Alemanha, e não encontrou o volume de dados que está disponível no site do BNDES.
O ex-presidente do BNDES, Luciano Coutinho, discursa durante posse de Maria Silvia Bastos Marques, que dirigiu o banco de junho de 2016 a maio de 2017 (Foto: Agência Brasil)
Críticos do BNDES costumam compará-lo à Petrobras, que calculou uma perda de R$ 6 bilhões com corrupção. Mas há uma diferença entre as duas instituições.
"Nós não temos cargo político. São 2.707 funcionários concursados. E apenas 13 assessores não concursados - mas eles não tomam decisão, só fazem assessoramento", explica Ramos. Já na Petrobras, o esquema de corrupção se desenrolou por meio de diretores indicados politicamente, como Renato Duque, Paulo Roberto Costa e Jorge Zelada, segundo as investigações da Operação Lava Jato.
"Dificilmente terá havido corrupção na estrutura profissional do BNDES, uma das melhores do setor público. O erro cingiu-se a estratégias mal concebidas. É pouco provável que tenha havido deslizes na análise dos projetos, na formalização dos contratos e na fiscalização da aplicação dos recursos", escreveu o economista Maílson da Nóbrega na revista Veja, na última sexta-feira.
Nóbrega não é um defensor do PT, pelo contrário. Ex-ministro da Fazenda no governo José Sarney, o economista é um conhecido crítico do governo Dilma Rousseff. Sobre a Petrobras, já declarou que a empresa "foi vítima de um assalto sistêmico" e defendeu privatizações para evitar o uso político das estatais: "é impossível ter seriedade em um país em que 35 mil cargos da administração pública podem ser providos por indicação política".
"Não existe caixa-preta no BNDES. O que existiu foi falta de comunicação do porquê a gente antes não divulgava determinadas operações. Mas hoje somos bem transparentes e estamos dispostos a evoluir mais. Cabe ao banco, pacientemente, mostrar à sociedade que temos transparência, sim", conclui Ramos.
O BNDES também se defende dizendo que já foi alvo de algumas investigações - algumas delas encerradas sem apontar irregularidades, e outras ainda em curso.
"O BNDES tem passado por auditorias frequentes do Tribunal de Contas da União, da Controladoria Geral da União, foi investigado por três CPIs e pela Operação Bullish, da Polícia Federal. Nenhum funcionário de carreira do banco foi indiciado por corrupção", lista Ricardo Ramos, ele próprio um funcionário de carreira, há 26 anos na instituição.
Uma das últimas investigações, feita pela CPI do BNDES no Senado, teve seu relatório final apresentado em março deste ano. O documento diz que o BNDES contribuiu para projetos estratégicos, reconhece que a inadimplência é baixa e recomenda avançar mais na criação de mecanismos para apurar a efetividade dos financiamentos concedidos.
E completa: "Discordamos de qualquer medida tendente a extinguir ou reduzir as possibilidades de financiamento por parte do BNDES".
As operações do BNDES mais criticadas são justamente as que viralizaram no WhatsApp no período eleitoral: os empréstimos para outros países contratarem construtoras brasileiras, principalmente na América Latina e na África.
"Via BNDES, o Brasil é um dos maiores patrocinadores do socialismo que massacra milhões no mundo. Conosco, o foco é o Brasil", declarou Bolsonaro pelo Twitter, durante a campanha.
Em novembro do ano passado, a BBC News Brasil mostrou a situação de uma das obras financiadas pelo BNDES no exterior, o Aeroporto Internacional de Nacala, no norte de Moçambique, executado pela Odebrecht. Três anos após a inauguração, a maior parte da infraestrutura estava parada e sem uso.
O governo de Moçambique foi quem tomou empréstimo do BNDES para pagar a Odebrecht - a uma taxa de juros em torno de 4% ao ano e prazo de 15 anos para pagar. Porém, sem movimento, o aeroporto não gerou receitas. Assim, o país deixou de pagar o financiamento. Foi o primeiro calote do BNDES no exterior.
Vale lembrar que, em 2004, o Brasil perdoou a dívida moçambicana, no valor de US$ 315 milhões, justamente visando à aprovação de novos empréstimos pelo próprio BNDES - já que um débito em aberto impede a contração de novas dívidas.
Depois de Moçambique, Venezuela e Cuba também não pagaram algumas das parcelas dos seus compromissos com o BNDES. No total, a dívida dos três países com o Brasil está em US$ 459 milhões (cerca de R$ 1,7 bilhão).
Em sua defesa, o BNDES alega que esses casos são exceção - a maior parte desse tipo de empréstimos está sendo paga em dia. Além disso, o banco diz que o rombo gerado por esses três países está sendo coberto por uma espécie de seguro.
Mas por que o BNDES apoiou projetos no exterior? O banco se justifica dizendo que o objetivo era gerar emprego e renda no Brasil. "Quando financia as exportações de uma empresa brasileira de engenharia para obras no exterior, o BNDES exige que todos os bens e serviços apoiados sejam de origem brasileira", afirma a instituição.
Segundo um estudo da LCA Consultoria, a cada US$ 100 milhões investidos pelas construtoras brasileiras no exterior, 19 mil empregos eram gerados ou mantidos no Brasil.
Vale ressaltar que essa não é uma operação exclusiva do Brasil. Outros países fazem empréstimos desse tipo, como a China.
Inclusive, foi com o objetivo declarado de ajudar as empreiteiras brasileiras na competição com a China pelos mercados africanos e latino-americanos que esse tipo de financiamento ganhou vulto no Brasil, a partir de 2007, durante o governo Lula.
As taxas de juros do mercado privado não eram competitivas no mercado internacional. Já o BNDES oferecia juros entre 3% e 9%, e prazo para pagar de até 25 anos. Foi uma forma, portanto, de dar condições menos desfavoráveis a empresas brasileiras, na comparação com potenciais concorrentes estrangeiros.
Já a partir de 2016, à luz da Lava Jato, esse tipo de financiamento para infraestrutura do exterior foi descontinuado. Segundo o BNDES, as empresas foram procuradas para assinar um novo termo de compliance, assumindo o compromisso de que todo o dinheiro desembolsado pelo banco seria realmente usado na obra. Nenhuma delas quis aderir, diz o banco.
Além disso, desde então não houve mais nenhum pedido de empréstimo nesse segmento. Ou seja, hoje, essa modalidade de empréstimo não está mais ativa. Por outro lado, os dados estão públicos. As polêmicas, no entanto, não retrocederam.
Reprodução do site do BNDES, mostrando a evolução dos desembolsos do banco desde 1995, por região do país e setor econômico (Foto: Reprodução)
Outra fonte de polêmica sobre o BNDES durante os governos do PT foram os empréstimos para grandes empresas crescerem e se internacionalizarem - conhecida como política dos "campeões nacionais". Entre elas, a JBS e a operadora Oi.
"Havia uma visão ideológica no governo brasileiro de apoiar grandes empresas por meio do BNDES. O banco lavou as mãos, como se dissesse: se esse grupo está pleiteando financiamento e tem capacidade de pagar, então vamos em frente, vou emprestar e não vou contestar políticas governamentais", explica Lazzarini, do Insper.
O economista dá um exemplo: "O BNDES não se perguntava se valia à pena oferecer baixa taxa de juros para fomentar um grande grupo para ir para a África, só porque o Brasil queria competir com chineses".
Assim, o BNDES teria emprestado para projetos cujos impactos são questionáveis - como o Aeroporto de Nacala. "Avaliação de impacto era algo que não existia no BNDES", conclui Lazzarini.
Porém, isso também mudou, diz o economista. A partir da gestão de Maria Silvia Bastos na presidência do BNDES, iniciada em 2016, durante o governo de Michel Temer, o banco se tornou mais criterioso na hora de emprestar.
Se antes os critérios mais importantes eram a capacidade financeira para pagar o empréstimo e a geração de renda e emprego no Brasil, a partir de 2016 outros valores entraram na balança: benefícios econômicos, ambientais, sociais, regionais e para o cliente que recebe o empréstimo.
Lazzarini exemplifica: "obras de saneamento básico no Brasil passam a ter mais prioridade no BNDES, porque é algo com muito impacto social, muito mais que financiar um frigorífico ou um aeroporto".
Outra mudança é que o BNDES tem buscado ampliar o volume de financiamento para os "campeões anônimos" - micro, pequenas e médias empresas.
Dessa forma, entre 2015 e 2016, o BNDES viveu uma série de transformações, tanto na área de transparência como na de avaliação de impacto. Como parte das mudanças, em 2017, o banco divulgou uma publicação chamada "Livro Verde", "uma espécie de 'contabilidade escancarada' para a avaliação serena dos próprios brasileiros".
Na introdução do livro, o então presidente do banco, Paulo Rabello de Castro - que saiu da presidência para concorrer como vice-presidente na chapa de Alvaro Dias (Podemos) - declarou que é importante que a sociedade discuta sobre o BNDES, mas que esse debate precisa ser "o mais amplo e bem-informado possível, sem a inconveniente repetição de fantasias ou 'pós-verdades' sobre as atividades do banco".
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Existe uma 'caixa-preta' do BNDES, como diz Bolsonaro? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU