03 Julho 2025
Pesquisadores espanhóis encontram diferentes tipos de plástico no plasma seminal e no fluido folicular ovariano.
A reportagem é de Miguel Ángel Criado, publicada por El País, 01-07-2025.
Consequência de décadas vivendo em uma sociedade plástica, esse plástico está em toda parte. Já degradado ao tamanho de microplásticos (partículas menores que cinco milímetros), ele chegou ao Ártico, à Fossa das Marianas, ao Himalaia, à atmosfera, ao que comemos e até mesmo ao interior de nossos corpos. Agora, pesquisadores espanhóis confirmaram que ele também se infiltrou nos fluidos reprodutivos humanos: onde o óvulo se desenvolve e no sêmen. Eles conseguiram identificar até uma dúzia de plásticos diferentes, embora em baixas concentrações. O impacto que eles podem ter tanto nos espermatozoides quanto nos ovócitos e sua função na criação da vida ainda é desconhecido.
Pesquisadores e médicos da Universidade de Múrcia e das clínicas de reprodução assistida Next Fertility analisaram amostras de plasma seminal de 22 doadoras e fluido folicular de 29 mulheres em tratamento de fertilidade. Os resultados deste trabalho foram apresentados pelo primeiro autor do estudo, o pesquisador espanhol Emilio Gómez Sánchez, na reunião anual da Sociedade Europeia de Reprodução Humana e Embriologia (ESHRE), atualmente realizada em Paris.
Microplásticos estavam presentes em 69% das amostras de fluido folicular, o líquido onde os ovócitos, os futuros ovários, se desenvolvem. No caso do sêmen, a porcentagem cai para 55%. O plasma seminal, além de servir como meio de transporte para os espermatozoides, os mantém vivos. A diferença pode ser devido ao pequeno tamanho da amostra. Mas o Dr. Gómez, diretor do laboratório Next Fertility Murcia, aponta outra possibilidade. "Mulheres submetidas à fertilização in vitro recebem tratamento hormonal que aumenta a vascularização ovariana, resultando em maior fluxo sanguíneo." As três vias pelas quais essas partículas de plástico entram no corpo — inalação, ingestão ou através da pele — terminam no mesmo lugar: a corrente sanguínea.
Os microplásticos foram caracterizados pela equipe liderada pela Professora Pilar Viñas, diretora do Departamento de Química Analítica da Universidade de Múrcia. Utilizando microscopia direta de infravermelho a laser, eles detectaram nove tipos de material plástico, embora sua distribuição tenha variado entre as amostras de plasma seminal e fluido folicular. "Em ambos os grupos, foram identificados vários polímeros microplásticos comumente usados, como politetrafluoretileno (PTFE), poliestireno (PS), tereftalato de polietileno (PET), poliamida (PA) e poliuretano (PU)", explica Viñas.
A concentração era muito baixa, às vezes duas ou três partículas por amostra. "Não se sabe como os microplásticos chegaram aos fluidos biológicos, embora sua concentração seja muito menor do que a de partículas não plásticas, como o carbonato", enfatiza o professor. Mesmo assim, em uma das amostras, eles contaram até 38 partículas de Teflon (PTFE). O limite inferior do tamanho que conseguiram detectar foi de 20 mícrons (0,02 milímetros). Os nanoplásticos, ainda menores e cuja presença no corpo humano só agora começa a ser estudada, ainda precisam ser descobertos.
No livro Espermageddon (Roca Editorial, 2022), seu autor, Niels Christian Geelmuyden, compila diversos estudos sobre o impacto dos microplásticos no sistema reprodutivo. Um deles mostra como ostras expostas ao poliestireno "produzem menor número de óvulos e espermatozoides menos móveis". No entanto, não há estudos sobre como eles afetariam o sistema reprodutivo humano. O Dr. Gómez também destaca que, em testes com animais de laboratório, "eles recebem plástico para beber ou comer em concentrações muito altas". No âmbito das suspeitas, mas não das certezas, como enfatiza Gómez, os microplásticos podem ter um efeito inflamatório e oxidativo, potencialmente afetando "a contagem de espermatozoides ou o desenvolvimento dos ovócitos". Por isso, ele considera necessário ampliar e multiplicar as pesquisas.
Os poucos estudos que relacionaram a presença de microplásticos no corpo humano com a saúde encontraram resultados preocupantes. Assim, pacientes com plásticos microscópicos nas artérias aumentam em 4,5 vezes o risco de ataque cardíaco, derrame e morte. Observou-se que eles tendem a se concentrar na corrente sanguínea ou no cérebro, mas também no leite materno, no fígado e nos intestinos.
Alguns estudos sugerem que eles podem danificar o DNA, mas seus efeitos a longo prazo são desconhecidos. Gómez enfatiza que não detectaram alterações na motilidade dos espermatozoides ou na viabilidade dos ovócitos, mas esta é uma amostra pequena e preliminar, e ele acredita que é urgente ampliar o escopo desses estudos.
Fay Couceiro, professor de Poluição Ambiental e chefe do Grupo de Pesquisa em Microplásticos da Universidade de Portsmouth (Reino Unido), enfatiza que, “considerando o declínio global das taxas de fertilidade, analisar as possíveis causas é altamente relevante e oportuno”. Em declarações ao site especializado SMC, ele acrescentou que “encontrar microplásticos não é tão surpreendente, já que os encontramos em muitas outras partes de nossos corpos”. Couceiro conclui lembrando o que dizem os autores da pesquisa: “Presença não é o mesmo que impacto, e os autores são claros ao afirmar que, embora tenham encontrado microplásticos nos fluidos reprodutivos de homens e mulheres, ainda não sabemos como eles nos afetam”.
A Dra. Stephanie Wright, professora associada de toxicologia ambiental no Imperial College London, também em entrevista à SMC, ressalta que os microplásticos estão por toda parte, "inclusive em laboratórios", apontando a possível contaminação das amostras como uma possível explicação. Para ela, "os dados fornecidos não comprovam que sua presença seja resultado da exposição humana, e sim de um artefato metodológico, portanto, devem ser interpretados com cautela neste estágio inicial". No entanto, para controlar e descartar esse risco, os pesquisadores também analisaram os recipientes das 51 amostras e não encontraram microplásticos.