Fumaça da Amazônia chega a São Paulo

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13 Setembro 2022

 

Uma grande nuvem de materiais particulados, carregados de fuligem das queimadas, parte da região amazônica, avança sobre o Centro-Oeste e chega ao Sudeste e Sul do País; previsão é de que essa situação se prolongue por setembro.

 

A reportagem é de Eduardo Nunomura, publicada por Amazônia Real, 09-09-2022. 

 

Na manhã desta sexta-feira (9), o cientista Eduardo Landulfo, do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), saiu de casa e sentiu um cheiro de queimada. Ao contrário de milhares de paulistanos que tiveram a mesma sensação, ele tinha a certeza da origem daquele odor: era da Amazônia. No início da noite de quinta, ele já tinha coletado dados do Sistema Lidar do Centro de Lasers e Aplicações (Celap), que mostravam que uma imensa “língua” de materiais particulados tinha chegado a São Paulo e baixado a uma altitude de 2 mil metros.

 

É comum se detectarem as chamadas “plumas de aerossóis” geradas pela poluição normal de uma metrópole. Mas as imagens de satélite revelam que também a fuligem das queimadas da Amazônia estão agora sob as cabeças dos paulistas e também da população dos estados do Sul do Brasil, assim como na dos vizinhos Bolívia, Paraguai e Peru. “Você vê uma ‘língua enorme’ de material particulado e é isso que, com a umidade, cria aquela sensação de quase neblina, um smog, formando um cenário mais desfavorável para a qualidade do ar”, explica Landulfo, que conversou com a Amazônia Real.

 

Enquanto a entrevista transcorria, Landulfo enviava imagens que mostram claramente essa “língua” se formando e se concentrando nas Amazônias brasileira e boliviana. No lado do Brasil, há uma linha que começa no sul do Amazonas e do Pará, avançando pelo Tocantins e continuando sobre Acre, Rondônia e Mato Grosso. De lá, ela desce afunilando em direção às regiões Sudeste e Sul. “Quando há uma frente fria entrando, há uma diferença de pressão, que cria um duto entre o Centro-Oeste e o Noroeste, quase que sugando a fumaça”, explica o cientista.

 

 

No ranking de dez municípios brasileiros com mais focos de incêndio, detectados pelo Programa Queimadas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), todos estão nessa região: Lábrea (AM), São Félix do Xingu (PA), Porto Velho (RO), Altamira (PA), Feijó (AC), Boca do Acre (AM), Colniza (MT), Novo Progresso (PA), Tarauacá (AC) e Candeias do Jamari (RO). Os dados se referem ao número de focos acumulados entre 1 e 8 de setembro.

 

Em condições normais, os materiais particulados ficam em altitudes elevadas, acima de 3 mil a 4 mil metros, o que faz com que as pessoas não sintam a sua presença. Mas os computadores do Celap detectaram que a pluma de partículas aerossóis desceu a uma altitude de 2 mil metros. Do ponto de vista meteorológico, isso se deu por conta das condições climáticas: a frente fria combinada com o dia quente de quinta-feira fez com que os materiais particulados praticamente aterrissassem na direção do solo – o que fez, enfim, as pessoas notassem algo diferente no ar.

 

Até o meio-dia desta sexta-feira, não ocorreu um fenômeno assustador, de agosto de 2019, quando São Paulo viu o dia se tornar noite por causa da mesma poluição vinda da fumaça da Amazônia. Mas, segundo Landulfo, o sinal de alerta foi dado, uma vez que a circulação desses materiais particulados deverá se estender por todo o mês de setembro.

 

Imagens do GFS / NCEP / US National Weather Service

 

“Tem muita coisa vindo de fora do Brasil também, da Bolívia”, alerta o cientista, que relaciona com a alta incidência de queimadas detectadas pelos satélites da Nasa. Segundo os dados do Programa Queimadas do Inpe, o Brasil teve em setembro 26.444 focos de incêndio florestal, ante os 7.245 da Bolívia e os 2.174 do Peru. “Quando há queima (da floresta), todo o material particulado é levado para cima, e pelas condições meteorológicas, elas vão atingindo diferentes níveis, podendo subir ou descer. Se você sente o cheiro de fumaça, é porque ele (o material particulado) realmente caiu.”

 

O mês de agosto registrou 33.116 focos de queimadas na Amazônia, quebrando desastrosos recordes de destruição nos últimos 12 anos. Apenas no dia 22, houve 3.358 focos de incêndios, mais que o dobro do “dia do fogo” de 2019. Em questão de poucos anos, o Brasil viu sua trajetória descendente de desmatamento se tornar novamente ascendente, alcançando em 2021 um recorde em 13 anos, com 12.415 quilômetros quadrados. Mas a lógica da destruição por meio do fogo continua em setembro.

 

O “dia do fogo”

 

Eduardo Landulfo trabalha há 25 anos no Ipen, hoje no Laboratório de Aplicações Ambientais de Lasers. Em agosto de 2019, ele foi um dos pesquisadores que notou a presença da incômoda presença da fumaça vinda da Amazônia. Na época, os dados indicavam que uma grande nuvem de aerossóis se formou por São Paulo a altitudes que variavam de 2 mil a 4 mil metros, que chegaram a obstruir a chegada da luz solar. Isso ocorre porque essa nuvem de poluição é carregada de monóxido de carbono, dióxido de carbono, materiais particulados e até metano. Ao ser questionado se poderia comparar com o que aconteceu três anos atrás, ele afirma que “em 2019 foi pior”, mas com a ressalva de que essa impressão valia até a data de 9 de setembro e o mês ainda está só no começo.

 

A Amazônia Real, em agosto de 2019, relatou que houve um aumento de 300% no número de focos de queimadas na região por conta do “dia do fogo”. Produtores rurais do município de Novo Progresso, no sul do Pará, realizaram uma operação orquestrada para incendiar a floresta amazônica. Na ocasião, funcionários do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) ficaram de mãos atadas, não podendo combater as chamas, já que o próprio governo de Jair Bolsonaro, representado na época pelo ex-ministro da Justiça Sérgio Moro, negou o envio da Força Nacional de Segurança para apoiar as brigadas de incêndio.

 

No Twitter, a candidata a deputada federal por São Paulo Sonia Guajajara (Psol), uma das principais lideranças indígenas do País, externou pela manhã sua preocupação a fumaça vinda da floresta:

 

 

Outro que se manifestou com preocupação na rede social foi o divulgador científico Atila Iamarino:

 

 

O que realmente preocupa o cientista do Ipen é que essa queima não parece ser aquela provocada pela cultura tradicional de queimadas que proprietários rurais costumam adotar nessa época do ano. Ou seja, não é tão aleatória quanto se imaginaria. “Quando olhamos os focos de focos, há uma certa organização, não parecem ser pontos pequenos de queimada. É maior e mais organizado, e isso é preocupante”, informa.

 

“É um sinal de alerta para não pensarmos que o que está na Amazônia não nos afeta. Isso tem consequências para a saúde, (os materiais particulados) vão para o trato respiratório, quem tem asma vai ter uma piora nos próximos dias”, conclui. O sistema do Ipen fica dentro da Cidade Universitária, na zona oeste de São Paulo, e realiza medições diárias das distribuições em altitude do material particulado.

 

A Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb) indicava, às 11 horas desta sexta-feira, que a qualidade do ar na região metropolitana de São Paulo estava na faixa N3 – Ruim, uma vez que os níveis de materiais particulados estavam na faixa dos 113 µg /m³, e que para as próximas 24 horas as condições metereológicas são desfavoráveis para a dispersão dos poluentes dióxido de enxofre, partículas inaláveis, dióxido de nitrogênio, monóxido de carbono e ozônio.

 

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