Ecologia integral para um planeta feliz

Foto: PxHere

29 Novembro 2021

 

Como parte do festival Mantova Scienza, no dia 20 de novembro, o frei Andrea Frigo apresentou uma conferência intitulada “Ecologia integral. Instrumentos úteis para um planeta feliz”. Frigo, formado em Ciências dos Materiais pela Universidade de Pádua e pelo Instituto Nacional de Física Nuclear, é frade franciscano e coordenador de atividades do planetário de Amelia, no Convento da Santissima Annunziata, na província de Terni.

 

O comentário é do físico italiano Luigi Togliani, publicado por Settimana News, 28-11-2021. A tradução é de Anne Ledur Machado.

 

Introduzindo o encontro, o frei Andrea disse: “A fé e a razão são como as duas asas com que o espírito humano se eleva para a contemplação da verdade. A não só não tirou nada do meu amor pela ciência, mas também o reavaliou, ampliando as suas fronteiras e mostrando-me os limites de um modelo social e econômico tecnocrático insustentável e nocivo para o ser humano”.

 

A conferência de Frigo se concentrou em três aspectos: 1) há uma grave crise em curso; 2) o que cada um de nós pode fazer; 3) como nos colocar nos passos de São Francisco.

 

1. Vivemos em um planeta doente. Pode-se constatar que, de 1850 até hoje, a temperatura média da Terra aumentou cerca de 1,1°C e, continuando nesse ritmo de crescimento, chegaremos a um aumento em torno de 2,0°C em 2060. Se é verdade que há 50 milhões de anos (quando o ser humano não existia sobre a Terra) a temperatura era até 12°C mais alta do que os valores atuais, o que preocupa hoje é o rápido aumento que tem ocorrido nas últimas décadas. É um aumento devido ao ser humano, que modificou a composição da atmosfera terrestre com a emissão de quantidades cada vez maiores de gases de efeito estufa, incluindo o dióxido de carbono (CO2), o metano (CH4) e outros.

 

 

Aumento da temperatura terrestre de 1850 a 2020 (Imagem: www.BerkeleyEarth.org)

 

Crescimento da concentração de CO2 na atmosfera nos últimos 10.000 anos. (Imagem: DesdemonaDespair.net)

 

 

Como se pode ver no gráfico, que fornece dados dos últimos 10.000 anos, passamos de uma concentração de cerca de 280 ppm de CO2 em 1850 para mais de 410 ppm de CO2 em 2020, com um aumento vertiginoso nos últimos 40 anos. O aumento da concentração de CO2 e de outros gases aumentou o efeito estufa: portanto, há uma correlação direta entre a emissão de gases de efeito estufa na atmosfera e o aumento da temperatura média da Terra.

 

Quem nos garante que é realmente assim? Devemos reconhecer que nem todos são especialistas em matéria de clima, embora haja uma comunidade científica cujas publicações são controladas, ao contrário do que ocorre com as publicações nas redes sociais digitais. As experiências individuais não são generalizáveis. Os especialistas só o são no seu âmbito e não em outros. A verdadeira ciência é humilde.

 

As consequências das mudanças climáticas já estão debaixo dos nossos olhos. O derretimento progressivo e rápido das geleiras, a elevação do nível dos mares, os fenômenos climáticos extremos frequentes (inundações, furacões, secas), a diminuição da água potável e a perda da biodiversidade colocam cada vez mais em risco populações humanas inteiras, com crescentes fluxos migratórios.

 

A poluição ambiental acentua os problemas: basta pensar que, seguindo em frente assim, em 2050 a massa de todo o plástico que jogamos no ambiente vai superar a massa total de todas as espécies marinhas sobreviventes. As epidemias e as crises de saúde correm o risco de se multiplicar como consequência das invasões dos habitats de muitas espécies animais.

 

Mas a crise também é econômica e política. A riqueza se concentra cada vez mais em poucas mãos. Estamos bem longe de superar a fome, enquanto a desnutrição aumenta nas populações pobres e a obesidade nas ricas; o desequilíbrio entre Norte e Sul do mundo está crescendo. Exploramos demais e mal os recursos – que são limitados – do nosso planeta: se em 1961 usávamos apenas 73% dos bens oferecidos pela Terra, hoje usamos 160%, deixando aos jovens uma herança pesada. Para a Itália, o dia 13 de maio é atualmente o overshootday, ou seja, o dia do ano a partir do qual nos endividamos em relação aos recursos que usaremos e que não temos.

 

 

Distribuição da riqueza do mundo (Imagem: DataBank.WorldBank.org)

 

 

Mapa da distribuição da riqueza no mundo (Imagem: DataBank.WorldBank.org)

 

2. Na encíclica Laudato sì’, de 2015, o Papa Francisco nos alerta para o atual sistema econômico que persegue a ideia de crescimento ilimitado e que se vale do paradigma tecnocrático, um modelo desviante e aberrante da antropologia, segundo o qual o ser humano pode possuir tudo e a tecnologia pode resolver todos os problemas. É um modelo que leva ao egoísmo coletivo e à cultura do descarte.

Ao invés disso, devemos buscar o equilíbrio, distinguindo entre as necessidades essenciais (casa, comida, educação) e as outras demandas, na consciência de que o aumento das necessidades e a pegada ecológica humana reduzem a biocapacidade da Terra.

Devemos estar cientes de que vivemos às custas da Criação. Os preços das coisas que compramos muitas vezes não levam em conta o impacto e a poluição que a produção desses bens envolve. Por isso, é preciso aceitar comprar menos coisas e gastar mais para adquirir produtos de menor impacto ecológico, privilegiando aqueles que tem quilômetro zero, aqueles obtidos em lavouras orgânicas e sem exploração da mão de obra das pessoas.

Devemos fazer com que os produtos vivam mais tempo com a reutilização, o reparo e a reciclagem, aproveitando esta última possibilidade apenas quando o objeto não for mais utilizável. É fundamental uma boa informação sobre as questões ecológicas: devemos nos comprometer com a sensibilização das pessoas, especialmente das crianças e dos jovens, e nos comprometer com ações concretas. A partir da base, devemos buscar nos dirigir a quem nos governa e aos poderes fortes, para que ocorra uma mudança profunda da nossa sociedade.

 

 

3. Qual é a contribuição das religiões? É preciso acompanhar tanto os aspectos espirituais quanto os materiais, com um olhar profético e não míope. Devemos nos tornar catalisadores da fraternidade, mais atentos às relações do que aos objetos, portadores de esperança.

É preciso o carisma da profecia para revelar as mentiras. Em particular: não é verdade que a técnica sozinha pode nos salvar, não é verdade que podemos ser felizes sozinhos, não é verdade que basta o dinheiro para ser feliz, crescer não significa aumentar o PIB e o consumo, não é verdade que existe o crescimento ilimitado, não é verdade que bastam os muros para nos defendermos.

 

No fim, Andrea Frigo citou o Papa Francisco:

 

“Acho que Francisco de Assis é o exemplo por excelência do cuidado pelo que é frágil e por uma ecologia integral, vivida com alegria e autenticidade. É o santo padroeiro de todos os que estudam e trabalham no campo da ecologia, amado também por muitos que não são cristãos. Manifestou uma atenção particular pela criação de Deus e pelos mais pobres e abandonados. Amava e era amado pela sua alegria, a sua dedicação generosa, o seu coração universal. Era um místico e um peregrino que vivia com simplicidade e em uma maravilhosa harmonia com Deus, com os outros, com a natureza e consigo mesmo. Nele se nota até que ponto são inseparáveis a preocupação pela natureza, a justiça para com os pobres, o empenho na sociedade e a paz interior” (Laudato si’, n. 10).

 

Agora é tempo de conversão, para passar do cartesiano Cogito ergo sum ao Tu es ergo sum, ou seja, “eu sou porque tu és”.

 

 

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