A ordenação de mulheres é possível, afirmou Pontifícia Comissão Bíblica, em 1976. Artigo de Johannes Beutler, jesuíta

Reprodução de parte do cartaz usando em protesto pelo grupo Maria 2.0, que pede maior participação das mulheres na Igreja católica. | Foto: Reprodução - Maria 2.0

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08 Setembro 2020

Ainda em 1976, a Pontifícia Comissão Bíblica havia chegado à conclusão de que a ordenação das mulheres é possível. Por que os seus argumentos não são ouvidos?

O comentário é de Johannes Beutler, jesuíta alemão e ex-membro da Pontifícia Comissão Bíblica de 1993 a 2001, em artigo publicado por Publik-Forum, 06-09-2020. A tradução da versão italiana é de Moisés Sbardelotto.

Eis o artigo.

Nos anos 1970, quando a Igreja Anglicana começou a ordenar primeiro mulheres padres e depois mulheres bispas, Roma ficou nervosa. O Papa Paulo VI temia que pedidos semelhantes também fossem impostos à Igreja Católica e, por isso, encarregou tanto a Comissão Teológica Internacional quanto a Pontifícia Comissão Bíblica de esclarecer a questão da ordenação das mulheres.

Naturalmente, esperava-se que ambas as comissões reforçassem e confirmassem a secular tradição da Igreja. Mas a Pontifícia Comissão Bíblica chegou em 1976 a um resultado que não agradou ao papa.

Doze dos 16 membros com direito a voto sustentaram a opinião de que as Escrituras estão abertas à possibilidade da ordenação das mulheres. A lista dos membros da comissão contém os nomes de estimados estudiosos da Bíblia de diversas nações. Apesar disso, o Vaticano preferiu não publicar o documento final. Que só foi conhecido graças a uma indiscrição e depois publicado nos EUA.

Em vez disso, os resultados da Comissão Teológica Internacional foram repassados para o decreto Inter insignioris, publicado em outubro de 1976, e ao qual o Papa João Paulo II se referiria mais tarde. O prefeito da Congregação da Fé daquela época, o cardeal Franjo Šeper, indicou os motivos contra a ordenação de mulheres.

Acima de tudo, a práxis de Jesus, que havia chamado como apóstolos apenas homens. Depois, a práxis dos apóstolos e da Igreja primitiva, o ensino e a práxis constante da Igreja. Por fim, um argumento simbólico: apenas um padre do sexo masculino poderia (nas celebrações) representar o homem Cristo perante a comunidade.

O último argumento é o mais fraco. Pressupõe a relação de Cristo com a Igreja segundo a imagem homem-mulher (Carta aos Efésios 5,2ss.), sem que se possa detectar no texto qualquer referência ao gênero dos padres.

A Pontifícia Comissão Bíblica em 1976, em vez disso, chegou à conclusão de que não há nenhuma linha direta que leve do círculo dos 12 aos ministérios da Igreja das origens. O círculo dos 12 tem principalmente um significado simbólico como reconstituição do povo de Israel com as suas 12 tribos.

Já a equiparação dos 12 com os apóstolos é redutiva e não permite entender a multiplicidade dos apóstolos na Igreja primitiva. Desde o início, as mulheres também assumiram responsabilidades no anúncio e na direção das comunidades. Pensemos apenas na diácona Febe ou na apóstola Júnia.

Nem um pouco impressionado com isso, o Papa João Paulo II declarou que a exclusão das mulheres do ministério era um ensinamento da Igreja que deveria ser mantido. E repetiu os argumentos da Comissão Teológica, mas sem o motivo simbólico, segundo o qual o padre deve ser homem para representar Jesus homem.

Esse argumento esquecido se encontra, porém, como único argumento (!) no documento do Papa Francisco na conclusão do Sínodo sobre a Amazônia, no qual ele exclui outros acessos ao ministério.

Por isso, já é hora de o magistério romano retomar o diálogo com a pesquisa bíblica e não simplesmente continuar a ignorá-la. É verdade que, contra o princípio luterano, segundo o qual a Escritura é suficiente para esclarecer questões de fé, a Igreja Católica sempre deu grande valor à convicção de que a revelação deve ser extraída não só da Escritura, mas também da tradição e do magistério.

No entanto, a partir do Concílio Vaticano II, a função da Sagrada Escritura não é mais apenas a de fornecer os argumentos para a teologia sistemática. Ela deve ser levada em consideração pela sua própria visão. Portanto: é preciso ousar mais a Bíblia!

 

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