08 Mai 2020
"Nesse cenário de desolação e futuro incerto diante da atual pandemia e seu agravamento progressivo, e acima de todas as conseqüências inegáveis que o contexto que o mundo está vivendo terá para os mais pobres, os palestrantes manifestaram profunda preocupação com os danos sobre os povos e o aumento previsível da pressão sobre os recursos naturais sob a proteção da crise econômica, que se abriu com expressões diferentes, como derramamentos de petróleo nas áreas dos rios Corrientes e Marañón ou no Equador, o sério aumento do desmatamento como consequência do agronegócio e da mineração. Por outro lado, sérias crises sociais de migração e negligência estão surgindo no horizonte", escreve Jaime Palacio, integrante da Rede de Entidades para o Desenvolvimento Solidário - REDES, e membro do Enlázate por la Justicia, por ocasião da realização do colóquio digital A Amazônia diante do COVID-19.
A tradução é de Luis Miguel Modino.
Eis a nota.
Em seu esforço para construir pontes entre as duas florestas, e no âmbito do aniversário da encíclica Laudato Sí', a iniciativa eclesial "Enlázate por la Justicia" organizou em 7 de maio o colóquio digital "A Amazônia diante do COVID-19". Conforme apresentado pela representante da aliança, Rebeca Collado, a convocação faz parte da campanha "Se você cuida do planeta, luta contra a pobreza" que Caritas, CEDIS, CONFER, Justiça e Paz, Manos Unidas e REDES vêm promovendo desde a publicação da Laudato Sí'. Participaram do evento Dom Joaquím Pertiñez, Bispo de Rio Branco (Brasil), Rita Ruck, diretora do Escritório de Direitos Humanos do Vicariato de Iquitos (Peru), e Luis Miguel Modino (Brasil), missionário, jornalista especialista na Amazônia, e membro da equipe de comunicação da Rede Eclesial Pan-Amazônica (REPAM), e queria trazer à mesa o impacto da pandemia na Amazônia e seu povo e as conseqüências futuras já previstas.
(Foto: Luis Miguel Modino)
COVID-19: mais uma ferida na pele da Amazônia...
Com 31.783 casos confirmados e 1.952 mortes até 6 de maio, de acordo com a contagem feita diariamente pela Rede Eclesial Panamenha (REPAM) com base em dados oficiais de cada país, Modino ilustra o panorama do impacto da pandemia na Panamazônia, que ele considera claramente abaixo da realidade de contagiados e mortes. Infelizmente, os três oradores concordam na avaliação de que a gravidade da pandemia não é tanto em números, em si mesma, como na precariedade dos serviços de saúde que pioram quando vamos às periferias urbanas ou entram nas áreas rurais. Dom Joaquím Pertíñez denuncia como essa situação precária é agravada pela falta de serviços básicos, como água ou esgoto, clima e, sobretudo, indolência de um governo brasileiro que não tem consciência do impacto da pandemia e, principalmente, dos mais pobres. No caso de Iquitos, diz Rita Ruck, o vírus é mais um fardo para as pessoas mais humildes, o que aumenta as que já existem, como a leptospirose.
Os povos indígenas, mais uma vez, ameaçaram e abandonaram …
A história de abandono e esquecimento que marca os cinco séculos de colonização da Amazônia está se repetindo com as mesmas ameaças aos povos originários nesta pandemia. Além do risco representado pelo próprio vírus, possíveis problemas são adicionados por um sistema imunológico não acostumado a certas infecções, o que leva os povos a se adentrarem profundamente na selva como um dia já fizeram com a chegada dos conquistadores. Especialmente relevante, segundo Modino, é a ameaça aos povos isolados, cujo isolamento voluntário é quebrado pelas incursões de representantes políticos, de saúde ou religiosos de igrejas evangélicas.
Da mesma forma que no Brasil, testemunhos da área Achuar do Vicariato de Yurimaguas (Peru), da região de Guayaramerin, na fronteira da Bolívia com o Brasil ou do estado do Maranhão no Brasil, foram recebidos na ocasião da reunião, todos concordando que a pandemia agrava a condição de isolamento, esquecimento e negligência dos povos indígenas pelos diferentes estados. A ameaça nos territórios dos interesses da mineração, do desmatamento e do agronegócio, que nesses tempos de isolamento estão agindo com total liberdade, redobrando o risco que representam, como lembrou o missionário comboniano Dario Bossi.
Nas próprias palavras de um ancião líder do povo Achuar em um dos testemunhos da reunião, "agora temos o COVID-19, mas há uma doença que há anos mata muitas crianças e muitos idosos e o Ministério da Saúde não entra".
Um futuro de esperança em meio a ameaças
Nesse cenário de desolação e futuro incerto diante da atual pandemia e seu agravamento progressivo, e acima de todas as conseqüências inegáveis que o contexto que o mundo está vivendo terá para os mais pobres, os palestrantes manifestaram profunda preocupação com os danos sobre os povos e o aumento previsível da pressão sobre os recursos naturais sob a proteção da crise econômica, que se abriu com expressões diferentes, como derramamentos de petróleo nas áreas dos rios Corrientes e Marañón ou no Equador, o sério aumento do desmatamento como conseqüência do agronegócio e da mineração. Por outro lado, sérias crises sociais de migração e negligência estão surgindo no horizonte.
No entanto, da mesma maneira que o Papa Francisco inicia Laudato Sí' pedindo "tomar consciência dolorosa", o encontro terminou com sinais cheios de convicção e esperança, como o milagre da multiplicação de solidariedade que foi dado em Iquitos para o financiamento de uma planta de produção de oxigênio, que a partir da iniciativa popular canalizada pelo Vicariato alcançou em três dias a meta de arrecadar 1,8 milhão de soles.
Modino concluiu enfatizando a importância do esforço conjunto para tecer as redes e com o sinal que a REPAM supõe que “nos uniu a caminhar ao lado dos povos que sofrem“. Diante da divisão que é promovida pelas grandes potências econômicas e políticas, em palavras do cardeal Barreto.
Por fim, Dom Joaquín expressou o desejo de “sonhar esses sonhos com o Papa: cultural, ecológico, social e eclesial. Viver como se "tudo está interconectado" e nos colocarmos como Igreja a serviço de tudo isso, com os desafios que isso representa... "
Em resumo, um estilo de presença como Igreja nos dois lados do oceano que coloca a escuta dos povos como ponto de partida para qualquer passo dado... Uma das lições aprendidas com o processo do Sínodo Amazônico, desde seu documento preparatório até seu documento final e o exortação "Querida Amazônia" e também uma das lições que essa pandemia deve deixar "nas duas selvas".
Jaime Palacio
Rede de Entidades para o Desenvolvimento Solidário – REDES
Membro do Enlázate por la Justicia

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“Na Amazônia, o COVID-19 se junta às históricas ‘epidemias’ de abandono, isolamento e fome” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU