04 Outubro 2019
"Mas se tentarmos olhar a Amazônia com um olhar global, há pontos de reflexão para todos. Não podemos apontar o dedo para aqueles que destroem as florestas primárias, se incêndios criminosos e o desmatamentos são uma consequência direta de criações de gado intensivas e de uma agroindústria que frequentemente sustentamos com nossas escolhas alimentares".
A opinião é do chef italiano Carlo Petrini, fundador do movimento Slow Food, em artigo publicado por La Repubblica, 03-10-2019. A tradução é de Luisa Rabolini.
Eis o artigo.
O que começa em 6 de outubro na Cidade do Vaticano é algo destinado a permanecer na história, não apenas da Igreja. No domingo, começará o Sínodo Especial sobre a região pan-amazônica, que envolverá, além de ouvintes de diferentes partes do mundo, Bispos dos nove países amazônicos. Assembleia convocada pelo Papa Francisco em outubro de 2017, quando a questão amazônica ainda não apresentava a dramaticidade atual "Amazônia: Novos Caminhos para a Igreja e para uma Ecologia Integral". O título do Sínodo, escolhido pelo Papa Francisco, permite compreender os temas que serão abordados até 27 de outubro: a proteção do meio ambiente, por um lado, mas também e, acima de tudo, os direitos dos povos indígenas e o reconhecimento, negado por séculos, de seu papel, de sua cultura e de sua espiritualidade.
Esse conceito de "tudo está conectado", que a Encíclica Laudato Si' já havia explicado claramente cinco anos atrás, e que agora vive sua primeira grande aplicação nessa assembleia. Uma oportunidade de deixar claro que não pode haver justiça social em um ambiente degradado, que o grito da terra está intimamente ligado ao dos pobres e que todos somos corresponsáveis pelo sofrimento de nossa Casa Comum. Esse conceito tomou forma na ideia de ecologia integral, onde não há hierarquias entre homem e meio ambiente e onde mesmo a menor ação influencia o resto do sistema. Essa é a verdadeira novidade dessa encíclica, cujo poder extraordinário ainda não foi entendido nem pelo mundo laico nem pelo católico.
Nesse caso, a Amazônia se torna parte do todo, esperança e novo paradigma de todo o ecossistema e, ao mesmo tempo, uma demonstração concreta da crise ambiental, econômica e social que estamos enfrentando e da qual somos cúmplices. Partindo da convicção, como o Papa Francisco gosta de repetir, de que a realidade pode ser melhor compreendida da periferia do que do centro, esse Sínodo poderá nos ajudar a ler de maneira pontual o que está acontecendo no mundo. As florestas amazônicas são, na verdade, florestas primárias que hospedam cerca de 15% biodiversidade e armazena entre 150 e 200 bilhões de toneladas de carbono a cada ano. Atualmente, no entanto, as mudanças climáticas e o aumento das intervenções humanas, o desmatamento em primeiro lugar, estão colocando em risco os ecossistemas e exercendo fortes pressões nas comunidades locais. E é justamente deles que é preciso recomeçar: depositários de uma sabedoria diferente da nossa são os indígenas, guardiões da biodiversidade, os interlocutores com os quais é fundamental dialogar.
Mas se tentarmos olhar a Amazônia com um olhar global, há pontos de reflexão para todos. Não podemos apontar o dedo para aqueles que destroem as florestas primárias, se incêndios criminosos e o desmatamentos são uma consequência direta de criações de gado intensivas e de uma agroindústria que frequentemente sustentamos com nossas escolhas alimentares. Não podemos ficar indignados com o esgotamento dos bens comuns, se na Itália, em apenas vinte anos, cimentarmos 28% da terra cultivável e se continuarmos a ignorar a urgência de legislar contra o consumo de solo para defender os interesses da construção. Também não podemos nos surpreender com a dificuldade de dialogar com o outro diferente de nós, se a integração parecer uma quimera em toda parte, mesmo na Europa. Em uma época em que o ser humano compete pela destruição de sua própria espécie, a única esperança que resta é superar o vulnus divisor que nos coloca uns contra os outros, lembrando-nos que pertencemos à mesma comunidade de destino. Um Sínodo que por esse significado poderoso poderia representar um pequeno Concílio Vaticano II, o início da conversão ecológica indispensável para vencer a desertificação humana e ambiental. Um caminho a ser feito juntos, crentes e não crentes, redescobrindo a amizade social, como Francisco a chama, que nos permite trabalhar lado a lado para a defesa da casa e do bem comum.
O autor, a convite do Papa Francisco, participará dos debates do Sínodo como auditor.
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Francisco na Amazônia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU