A ética social a partir da Amoris Laetitia

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01 Setembro 2017

“Do interior, vemos que a Amoris Laetitia do Papa Francisco nos ensina a cosmovisão antropológica e cristã do matrimônio-família. O “reflexo da união entre Cristo e sua Igreja, se realiza plenamente na união entre um homem e uma mulher, que se doam reciprocamente com um amor exclusivo e livre fidelidade, se pertencem até a morte e se abrem à comunicação da vida, consagrados pelo sacramento que lhes confere a graça para se constituírem como igreja doméstica e serem fermento de vida nova para a sociedade” (AL 292)”.

A artigo é da Universidade Loyola Andaluzia, publicado por Religión Digital, 28-08-2017. A tradução é do Cepat.

Eis o artigo.

O Papa Francisco escreveu a Exortação Apostólica Pós-sinodal Amoris Laetitia, a Alegria do Amor, sobre o Amor na Família. A encíclica está tendo um grande eco e impacto na vida pública e na Igreja. Neste breve artigo, iremos nos centrar na inter-relação essencial e inseparável da psicologia, vida afetiva e emocional-sentimental com a ética ou moral, especialmente em seu caráter social. A partir do capítulo quinto e sexto de tal documento (AL 142-198), acreditamos que o Papa nos apresenta algumas chaves ou critérios que são muito importantes para a vida familiar e social.

A inteligência

A vida humana e ética que nos constitui como pessoas, com os valores e ideais que dão sentido à existência do ser humano, se fecundam com a vida afetiva. Com as emoções e sentimentos que nos movem (cf. AL 142-146). A inteligência ética ou moral se entrelaça com a inteligência emocional e sentimental. Os pensamentos e valores interagem com os sentimentos. A razão moral conflui com a emoção e a vida afetiva.

Na linha de X. Zubiri, é na inteligência sentimental que o pensar ou o raciocinar se correlacionam com o sentir: pensando sentimentalmente e sentindo inteligentemente. Com um amor inteligente e uma inteligência do amor. Na busca de uma caridade na verdade e a mesma verdade na caridade, assim como nos ensina Bento XVI.

Uma inteligência que se restrinja unicamente ao estritamente racional, conceitual ou técnico, torna-se fria e desapiedada, fria e calculista, utilitarista e mercantilista. Torna-se a razão instrumental, que impõe a dominação e a opressão de tudo e de todos. A inteligência tem que ser guiada pela ética empática e compassiva; pela razão cordial ou misericórdia, pela compaixão diante do sofrimento e a injustiça do outro, das vítimas e dos pobres.

Com um sentido ou anseio de justiça, de plenitude e libertação integral com as vítimas da história, com os pobres da terra. Na esteira da teoria e filosofia crítica, como é a Escola de Frankfurt, a teologia política de J. B. Metz ou o pensamento latino-americano, por exemplo, dos jesuítas I. Ellacuría e J. C. Scannone.

E um amor que não seja inteligente, que não busque a verdade real, que não se encarne e historicize na realidade humana e social, na realidade histórica, não é efetivo e nem transformador. O amor deve empregar as expressões ou mediações da razão e da inteligência como são a filosofia e as ciências humanas e sociais. Caso contrário, pode ser um amor não real e nem libertador. Cair no paternalismo e assistencialismo, sendo cúmplice do mal e da injustiça, das patologias como os fundamentalismo e integrismos diversos.

Neste sentido, o ser humano não se move tão somente por razões, pensamentos e valores. Mas, ao contrário, na esteira de Pascal, por razões que o coração compreende. É a razão e justiça cordial, como nos mostra A. Cortina, a “razão quente” (C. Díaz), a inteligência sentimental e espiritual, como nos ensinam J. A. Marina e F. Torralba. A razão se conjuga com o eros e o ágape (cf. AL 150-152), com o amor que recebe e que dá, que acolhe e se doa ou entrega.

Bem comum

O que nos leva ao serviço e ao compromisso moral pelo bem comum, pela paz e pela justiça com os pobres. Desta forma, o eros, a pulsão afetiva e amorosa se canaliza pela moral, pela cultura que nos humaniza e liberta do prazer egolátrico, da ânsia de poder ou dominação. Tal como nos mostra o mais valioso de Freud, que compreendeu bem o que nos amadurece como pessoas: é o amor, as relações afetivas com os outros; e o trabalho, a ação criadora, transformadora na sociedade e o mundo. Atualizando e aprofundando ao pai desta psicologia profunda ou da psicanálise.

Já que como insiste A. Ávila, na linha do mais valioso da psicologia – como pode ser a matéria da psicologia da religião ou evolutiva com Piaget -, trata-se de ir alcançando a maturidade humana, moral e espiritual. Um desenvolvimento e processo de amadurecimento na autonomia e verdadeira liberdade, que se realiza nos valores ou deveres e ideais morais.

Como são o bem comum, mais universal, a paz cosmopolita e a justiça internacional, nas pegadas de Kant, assim como fazem alguns destes autores, incluído o próprio Habermas, ainda com sua ética comunicativa. Mas que, como recorda C. Gilligan, este dever moral ou justiça, associado aos valores masculinos, não pode se esquecer da compaixão ou da ética do cuidado, do lado feminino da existência. Na linha de P. Ricoeur, que segue toda a tradição bíblica e cristã, o amor e a justiça são inseparáveis. A razão cordial ou o princípio de misericórdia, necessariamente, se une ao compromisso pela promoção e libertação integral com os pobres. Assim como nos mostra o jesuíta J. Sobrino.

A força do amor

Do interior, vemos que a Amoris Laetitia do Papa Francisco nos ensina a cosmovisão antropológica e cristã do matrimônio-família. O “reflexo da união entre Cristo e sua Igreja, se realiza plenamente na união entre um homem e uma mulher, que se doam reciprocamente com um amor exclusivo e livre fidelidade, se pertencem até a morte e se abrem à comunicação da vida, consagrados pelo sacramento que lhes confere a graça para se constituírem como igreja doméstica e serem fermento de vida nova para a sociedade” (AL 292).

E mais, diante da família burguesa e individualista, é um matrimônio e família que experimenta “a força do amor, sabe que esse amor é chamado a curar as feridas dos abandonados, a instaurar a cultura do encontro, a lutar pela justiça”.

Com uma opção de solidariedade libertadora aos mais pobres e oprimidos, onde se encontra presente, como sacramento, Jesus Pobre e Crucificado (cf. AL 183). Assim se manifesta a nós todo o esplendor e a beleza do amor real. Com algumas pessoas, matrimônios e famílias que vão adquirindo a maturidade, o sentido e a felicidade: no amor, serviço e compromisso, na militância pela civilização do amor e a justiça libertadora para com os pobres da terra; diante de todo mal, opressão e injustiça.

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