Os novos padres nos EUA: mais conservadores, mais isolados e com mais responsabilidades. Artigo de José Manuel Vidal

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18 Dezembro 2025

A solidão e o esgotamento profissional ameaçam a próxima geração do clero americano. Os jovens padres estão rejeitando o progressismo e clamando por uma Igreja mais rígida e tradicional.

O artigo é de José Manuel Vidal, diretor do Religión Digital, publicado por Religión Digital, 17-12-2025.

Eis o artigo.

O relatório de 2025 do Estudo Nacional de Padres Católicos nos Estados Unidos, conduzido pela Universidade Católica da América, revela dados importantes sobre o estado atual e as percepções do clero americano, com atenção especial às diferenças geracionais e aos desafios pastorais mais relevantes. Uma das descobertas mais marcantes diz respeito aos padres mais jovens. De acordo com o estudo, os novos padres são mais conservadores, sentem-se mais isolados, correm o risco de esgotamento profissional e defendem uma Igreja mais rígida e tradicional.

Bem-estar pessoal e comunitário

  • Os padres americanos mantêm altos níveis de bem-estar individual, com uma pontuação de 8,2/10 na Escala de Bem-Estar de Harvard, mas percebem suas dioceses ou ordens religiosas como muito menos prósperas (pontuações em torno de 5,7 a 6,2).

  • O esgotamento profissional continua sendo um desafio: 39% apresentam pelo menos um sintoma, sendo a situação pior entre os padres diocesanos e aqueles ordenados após o ano 2000, que relatam uma sobrecarga de responsabilidades maior do que os ordenados nas décadas anteriores.

Gerações e perfil ideológico

  • O fato mais surpreendente: existe uma clara tendência de os padres jovens serem muito mais conservadores — e muitas vezes mais reacionários — do que os mais velhos.

  • Entre os ordenados antes de 1975, mais de 70% se declaram teologicamente progressistas; em contraste, entre os ordenados a partir de 2010, mais de 70% se identificam como “conservadores/ortodoxos” ou “muito conservadores/ortodoxos” e apenas 8% como progressistas.

  • Politicamente, apenas 10% dos ordenados desde 2010 se consideram liberais, enquanto metade se vê como conservadora em algum grau; nas gerações anteriores, era o contrário.

  • Além disso, os padres mais jovens apresentam uma taxa de solidão mais elevada: 45% dos ordenados após 2000 sentem-se pelo menos "um pouco solitários", em comparação com apenas 27% dos ordenados antes de 1980.

Cuidado pastoral, prioridades e sinodalidade

  • 94% acreditam que as prioridades da Igreja devem ser o ministério da juventude, a formação familiar e a evangelização, mas menos de 71% têm ministérios da juventude ativos em suas paróquias; detecta-se uma lacuna entre as prioridades declaradas e a ação concreta.

  • Questões como justiça social, mudanças climáticas e assistência a migrantes estão se tornando menos prioritárias para as novas gerações de sacerdotes, ao contrário das devoções eucarísticas e do interesse (ainda minoritário, mas crescente entre os jovens) pela missa tradicional em latim.

  • O processo sinodal gerou pouco entusiasmo: 37% consideram-no uma “perda de tempo” e apenas 25% o acharam útil. No entanto, a maioria já pratica formas de sinodalidade a nível paroquial (conselhos pastorais, participação leiga, consultas).

Relação com bispos e confiança institucional

  • A confiança nos bispos permanece baixa, embora tenha melhorado ligeiramente (52% confiam em seu bispo, 27% confiam no episcopado nacional). O fator que mais influencia a confiança é a percepção de que o bispo se preocupa genuinamente com seus sacerdotes.

Visão sobre as mulheres e o equilíbrio interno

  • 51% acham que as mulheres não têm influência suficiente na Igreja, um número quase idêntico ao do catolicismo leigo americano.

Conclusões

O relatório alerta que a mudança geracional está consolidando um presbitério significativamente mais conservador, menos comprometido com causas sociais, mais propenso à solidão e ao esgotamento profissional, e mais distante de formas de governança com as quais não se identificam. Embora valorizem a formação contínua e demonstrem grande entusiasmo espiritual, a discrepância entre as aspirações pastorais e a realidade organizacional persiste e pode se intensificar nos próximos anos.

O relatório apresenta conclusões profundas sobre o estado do clero americano e a situação institucional da Igreja nos Estados Unidos, revelando tendências preocupantes e mudanças ideológicas significativas.

Fonte: Religión Digital.

Em relação ao clero

  • A mudança geracional é marcada por uma maior tendência conservadora em termos de identidade, liturgia e cuidado pastoral, resultando numa virada eclesiástica em direção a posições mais rígidas e ortodoxas entre os jovens sacerdotes.

  • A solidão e o esgotamento tornam-se problemas sérios, especialmente para os padres ordenados depois de 2000, podendo afetar negativamente a sua capacidade de acompanhar e liderar pastoralmente os fiéis.

  • A formação contínua e o apoio emocional surgem como necessidades urgentes para os padres mais jovens, que sentem maior pressão institucional e menos apoio da comunidade, tanto por parte dos seus bispos como da estrutura diocesana.

  • A desconfiança na hierarquia continua generalizada, e a percepção da proximidade ou indiferença do bispo influencia diretamente o bem-estar do sacerdote e sua visão da Igreja.

  • Há um interesse crescente entre os jovens em formas litúrgicas tradicionais, como a Missa Tridentina, o que indica uma possível (minoritária, mas visível) revitalização dos ritos pré-conciliares dentro do presbitério americano.

Em relação à Igreja

  • A polarização ideológica está crescendo dentro da Igreja, e o fosso geracional impacta diretamente a orientação pastoral, a gestão paroquial e a resposta institucional aos desafios sociais.

  • Existe uma desconexão entre as prioridades declaradas (paternidade, evangelização, formação familiar) e as realidades organizacionais, visto que muitos sacerdotes detectam dificuldades na implementação de verdadeiros processos de renovação e acompanhamento.

  • O processo sinodal não conseguiu inspirar a maioria do clero, embora muitos pratiquem informalmente formas de consulta e governança leiga no nível paroquial; a sinodalidade estrutural continua a ser vista com suspeita ou indiferença.

  • Existe uma percepção de falta de influência feminina na tomada de decisões eclesiais, um ponto reconhecido pela maioria dos padres e em consonância com a percepção dos leigos católicos.

  • A escassez de vocações afeta a organização e a distribuição do trabalho pastoral, aumentando a carga de trabalho e criando desequilíbrios que contribuem para o esgotamento pessoal dos sacerdotes em atividade, especialmente os mais jovens.

  • As tendências refletem uma Igreja institucionalmente dividida, com uma postura renovada, porém menos aberta ao diálogo e mais vulnerável ao esgotamento, enfrentando o desafio de restaurar o equilíbrio pastoral e emocional em meio a profundas tensões ideológicas e socioculturais. Este relatório revela uma Igreja que, em sua transição geracional, está se tornando claramente menos progressista e mais rígida, mas pagando o preço com maior solidão e exaustão pastoral.

Fonte: Religión Digital.

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