11 Outubro 2025
Sempre há uma primeira vez. Sarah Mullally, 63 anos, é sob todos os aspectos notável. De que outra forma se poderia definir a primeira mulher a se tornar Arcebispa de Canterbury? Soa mal? Para os ingleses, não é um problema, porque eles não flexionam masculino e feminino. Vamos nos acostumar com o neologismo, necessário, visto que, em 500 anos, o mais alto cargo religioso e espiritual da Igreja Anglicana nunca deixou de ser exercido por um homem. Houve 105 antes dela. Todos homens. O que era necessário agora era uma figura feminina de destaque, forte e carismática para limpar a infâmia de décadas de gestão masculina, que haviam levado a Igreja Anglicana a mergulhar em um abismo de escândalos sexuais e de pedofilia, acusações de corrupção e acobertamentos, culminando em novembro de 2024 com a renúncia de seu antecessor, o Arcebispo Justin Welby.
A reportagem é de Caterina Soffici, publicada por La Stampa, 04-10-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Quando se trata de carisma, Sarah Mullally o tem de sobra. Ex-enfermeira, casada e com dois filhos — Liam e Grace —, ela se define feminista. Uma liberal, escolhida para limpar e renovar. Um tapa na cara da onda reacionária, extremista, xenófoba e racista surfada por Nigel Farage. Em 2018, em seu primeiro sermão à frente da diocese de Londres, ela relembrou o ataque das sufragistas radicais que lutavam pelo direito ao voto e pela igualdade de oportunidades para as mulheres. A bomba, cem anos antes, havia sido colocada justamente embaixo do púlpito onde ela discursava. Ela disse brincando: "Deixe-me tranquilizá-los. Não tenho bombas comigo, pelo menos não no sentido literal da palavra. E, no entanto, estou ciente de que, como a primeira mulher bispa de Londres, serei necessariamente uma subversiva."
Liberal, inclusiva, progressista, para aqueles que contestaram sua nomeação como bispa de Londres (as nomeações foram abertas às mulheres em 2014 pelo próprio Welby), respondeu: "Tenho grande respeito por aqueles que, por razões teológicas, não podem aceitar meu papel de sacerdote ou bispo. Acredito que a diversidade da Igreja deve prosperar e crescer; todos deveriam poder encontrar uma casa espiritual." Sobre os homossexuais: "É hora de refletir sobre nossa tradição e as Escrituras e considerar juntos como podemos oferecer uma resposta que seja amor inclusivo."
Sobre pessoas LGBTQ+ na Igreja: "O que devemos lembrar é que se trata de pessoas, e a Igreja busca demonstrar amor a todos, porque reflete o Deus de amor, que ama a todos." Além disso, apoiou a criação de um grupo para fornecer aconselhamento sobre "cuidado pastoral e inclusão de pessoas LGBTQ+ na vida de nossas comunidades eclesiais".
Sobre o aborto: ela diz ser pessoalmente contra, mas quando se trata de outros, ela se define mais como pró-escolha do que pró-vida. Uma verdadeira bomba. Bastaria isso para explicar por que Mullally foi escolhida como Primaz da Igreja da Inglaterra em um momento tão delicado. Acima dela, apenas o Rei, "Governador supremo da Igreja e defensor da fé". Uma verdadeira figura.
Antes de uma carreira brilhante e meteórica na hierarquia eclesiástica, trabalhou como enfermeira durante 35 anos. Em 1999, já era Chefe de Enfermagem, chefe do serviço de enfermagem britânico, responsável por 400.000 enfermeiros e atendentes em obstetrícia, a pessoa mais jovem a ocupar o cargo. Em 2005, a Rainha a nomeou como Dama, o equivalente a Sir. Enquanto isso, estudou teologia, tornou-se diácona e, em 2001, fez os votos sacerdotais. Até 2004, foi cura em tempo parcial e não remunerada em Battersea Fields. Depois, renunciou ao cargo de Chefe de Enfermagem e assumiu o sacerdócio em tempo integral. O resto é história.
Tudo isso pode parecer muito estranho para um leitor italiano. Mas a Igreja Anglicana não é nem de longe comparável à Igreja Católica. Muito mais secular, em todos os aspectos. Muito mais prática. Até o processo de nomeação demonstra o nível de diferenças. Nada de conclaves ou fumaça preta e branca. A nomeação é feita pelo rei, por sugestão do governo, que por sua vez recebe dois nomes de um comitê de assessores nomeados entre fiéis proeminentes. Chama-se Comissão da Coroa para as Nomeações de Canterbury e é um órgão colegiado presidido por um ex-diretor-geral do MI5, o serviço de inteligência interno (neste caso, Lord Jonathan Evans).
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