26 Setembro 2025
"Combinado não sai caro, mas o descumprimento dos combinados climáticos tem um valor imensurável, principalmente para as juventudes do Sul Global", escreve Marcele Oliveira, produtora cultural, comunicadora e ativista climática, em artigo publicado por ((o))eco, 24-09-2025.
Eis o artigo.
Imagina acordar e saber que combinaram de salvar o mundo, mas depois deixaram pra lá? É o que está acontecendo para os que acompanham os debates internacionais em torno das questões climáticas. Quem combinou foram os mais de 190 países que em 1992, na Eco92, no Rio de Janeiro, combinaram que, a partir de conferências anuais, iriam respeitar a ciência e construir um caminho de resiliência e adaptação climática, com colaboração entre nações para efetivar uma verdadeira transição ecológica.
Bem, 2025 é um ano que vai ficar marcado para a história como a hora da verdade em relação a esses combinados, principalmente do mais famoso deles: o Acordo de Paris, que completa 10 anos preparando a implementação que deveria ter começado 50 anos atrás. Apesar da demora em ação climática efetiva, aquela que salva a vida das populações mais vulneráveis aos impactos da mudança do clima, os próximos meses também se apresentam como a corrida contra o tempo para aumentar a ambição e garantir o pontapé para uma fase de implementação dos acordos internacionais.
Do local ao global, três letras chamam atenção. Os compromissos climáticos de cada país sob o Acordo de Paris são conhecidos como Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDC), e a renovação das NDCs é a chance de reduzir as emissões e garantir um futuro possível para as crianças, adolescentes e futuras gerações ao redor do mundo. É a contribuição nacional de cada país para um assunto mundial, que impacta todos nós.
Apesar da relevância, a obrigação de entregar uma NDC ambiciosa vem sendo desrespeitada, tendo inclusive países que não pretendem entregar uma atualização desse compromisso em tempo para a conferência de novembro. Aos que entregaram, observamos que a implementação talvez seja lamentavelmente lenta e insuficiente, pela falta de recursos e pela falta de prioridade política. Uma avaliação interessante sobre as NDCs e outros compromissos você pode conferir em Climate Action Tracker.
Minha mãe costumava dizer que combinado não sai caro, e de fato é o descumprimento dos acordos multilaterais que têm apresentado prejuízos irreparáveis aos ecossistemas, aos diversos povos que protegem a natureza e as cidades não adaptadas para enfrentar as consequências de um clima que já mudou. Combinado não sai caro, mas o descumprimento dos combinados climáticos tem um valor imensurável, principalmente para as juventudes do Sul Global.
Com a última oportunidade para enviar novas NDCs antes do relatório-síntese, divulgado antes da COP30, a Semana do Clima de Nova Iorque, que acontece neste setembro, se torna o palco do encontro entre líderes em tensões geopolíticas e suas responsabilidades assumidas enquanto nação diante da crise climática. Essa responsabilidade é comigo, com você, com a natureza e com eles mesmos, já que é impossível viver em um planeta morto.
#NDCNOW é parte do Mutirão Global contra Mudança do Clima, que representa o chamado à ação para engajamento de todos os setores na ação climática, com os olhares atentos a quem já lidera a ação climática no campo local, como as juventudes.
Com a campanha #NDCNow, as juventudes cobram ambição, e você também pode fazer parte dessa cobrança pela campanha “NDC Youth Network” (Rede Jovem da NDC), de iniciativa da Care About Climate, que disponibiliza um email padrão a ser enviado ao setor responsável de diferentes países em relação a entrega das NDCs inclusivas e alinhadas ao limite de 1,5°C. A mesma organização puxa o “NDC Equity Tracker” (Rastreador de Equidade das NDCs), que já capacitou 150 jovens embaixadores do clima de todo o mundo e que resultou na campanha “NDC Youth Clause” (Cláusula da Juventude da NDC), a qual pressiona pela integração formal das vozes e prioridades dos jovens aos compromissos climáticos nacionais.
As juventudes estão de olho! No Brasil, a campanha “Nossa Decisão Climática”, da PalmaresLab, também aponta como as NDCs precisam ser inclusivas para crianças e adolescentes em sua construção, aplicação e conceito. Já os povos indígenas expandem o conceito tradicional de NDC, reconhecendo a demarcação e proteção territorial como uma política climática fundamental em uma “NDC dos Povos Indígenas do Brasil”. A verdade é que se dependesse só de nós, já estava feito.
Faltando 50 dias para a COP30, queremos ver nas próximas semanas a entrega de NDCs compromissadas com o nosso presente e com o nosso futuro. Nesse sentido, #NDCNOW é parte do Mutirão Global contra Mudança do Clima, que representa o chamado à ação para engajamento de todos os setores na ação climática, com os olhares atentos a quem já lidera a ação climática no campo local, como as juventudes, e o monitoramento incansável dos tomadores de decisão que estão com nossas vidas nas mãos. Hoje o clima é de ação, para que lá na frente a história possa contar que apesar das dificuldades, mantivemos nosso compromisso multilateral de pé, respeitando a soberania dos nossos povos e da natureza. Imagina acordar e saber que com compromissos ambiciosos e respeitados, salvamos o mundo?
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