23 Agosto 2025
"O livro propõe a sinodalidade como um projeto a ser construído, explorando novas formas de organização e participação que levam a uma genuína renovação da Igreja. Ele contribui de forma valiosa para o tema, mostrando que caminhar juntos pressupõe conversão e que a imersão em diferentes culturas exige a renovação de atitudes, formas, estruturas e estilos", escreve Eliseu Wisniewski, presbítero da Congregação da Missão (padres vicentinos) Província do Sul, mestre em Teologia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), em resenha do livro intitulado Unidade na diversidade: por uma eclesiologia sinodal renovada (Madri, PPC Editorial, 2025).
A obra "Unidade na diversidade: por uma eclesiologia sinodal renovada" (Madrid, PPC Editorial, 2025, 417 p.), organizada por Emília Robles, oferece um olhar aprofundado sobre a eclesiologia sinodal, com a particularidade de ser coordenada por uma leiga de vasta experiência. A trajetória de Robles, que é pouco conhecida no Brasil, é notavelmente rica e diversificada: ela foi membro da Juventude Operária Católica (JOC) e trabalhou por anos em uma metalúrgica antes de se dedicar à educação e à teologia. Como educadora de rua, trabalhou com pré-adolescentes e adolescentes em um bairro popular, demonstrando seu compromisso com as realidades sociais. Sua formação em Teologia Pastoral e Psicologia, aliada às suas especializações em Gestalt, intervenções sistêmicas, mediação e comunicação social, confere-lhe uma perspectiva única e interdisciplinar. Além de atuar como professora de religião em escolas da FUHEM, ela integrou a equipe de comunicação e mediação do movimento "Somos Igreja" e, desde 2002, coordena a rede Proconcil, uma iniciativa voltada para a criação de um novo processo conciliar-sinodal. Sua atuação se estende à tradução e edição de diversos livros sobre temas eclesiásticos, como ministérios e a Conferência de Aparecida, o que ressalta sua contribuição significativa para o debate teológico e eclesial contemporâneo. A obra, portanto, não apenas explora um tema crucial, mas também reflete a visão de uma profissional com um percurso multifacetado, que conecta a experiência de base, a academia e a articulação de movimentos eclesiais.
Este valioso trabalho está organizado em quatro partes. São elas:
1) A palavra seguia crescendo: atentos aos sinais dos tempos (p. 47-83),
2) Desafios que se cruzam (p. 85-166),
3) No centro da Igreja (p.167-235) e
4) Nas periferias existenciais (p. 237-378) — é composto por dezoito (18) contribuições.
1) Conversão à (e na) sinodalidade: um chamado permanente no Espírito, de Emilia Robles (p. 11-46);
2) Sinais dos tempos e o crescimento do logos, de Juan Barreto Betancort (p. 49-83);
3) Autoridade e poder na Igreja sinodal, de Nurya Martínez-Gayol (p. 87-126);
4) Comunhão e comunicação, essência da missão da Igreja hoje, de Antonio Torres García (p. 127-140);
5) Mulheres na Igreja: uma abordagem sinodal diferente, de Cristina Inogés Sanz (p. 141-152);
6) Uma Igreja intercultural é convocada para um sínodo, de Luis Miguel Modino (p. 153-166);
7) O que a sinodalidade traz à Vida Consagrada, de María Luisa Berzosa González (p. 169-181);
8) Paróquias sinodais missionárias: “Se as paróquias não são sinodais e missionárias, nem a Igreja o será” (Francisco, 2 de maio de 2024), de Miguel Ángel González Sáiz (p. 183-199);
9) A Juventude Operária Católica (JOC), sacramento da sinodalidade, de Francisco Javier García Cadiñanos (p. 201-215);
10) A sinodalidade da Ação Católica Especializada, de Fernando Carlos Díaz Abajo (p. 217-235);
11) Caminhando juntos na Pastoral Penitenciária, de María Yela e Francisco Javier Sánchez González (p. 239-244);
12) Experiências de sinodalidade na prisão, de Francisco Javier Sánchez González (p. 245-251); 13) Sinodalidade na Pastoral com Migrantes, de Rufino García Antón (p. 253-266);
14) “Sinodalidade reconciliada” para "reconciliar a sinodalidade": transformando a polarização com a liderança do discernimento sinodal, de Elías López Pérez (p. 267-292);
15) Todos, todas e todes: a sinodalidade e o coletivo LGTBIQ+, de Margarita Benedicto (p. 293-304);
16) Espiritualidade sinodal à intempérie: juntos tecendo missão e comunidade sinodal pelos caminhos, rios e selvas da Amazônia, da Equipe Itinerante (EI-Manaus, EI-BolPeBra, EI-CoBraVe), (p. 305-347);
17) Implicações ecumênicas e inter-religiosas do Sínodo 2021-2024, de Rafael Vázquez Jiménez (p. 349-364); e
18) A Galileia em sandálias: um novo ecumenismo é possível, de Juan Larios (p. 365-378).
Como se pode perceber, os autores e autoras deste livro abordam a sinodalidade sob diversas perspectivas, discutindo sua natureza e os espaços em que ela se manifesta. A própria diversidade de autores, processos, contextos e temas presentes na obra já constitui um claro exemplo de sinodalidade.
No livro prefaciado pelo papa Francisco (p. 5), o pontífice afirma que o processo sinodal atual convida a Igreja a redescobrir a eclesiologia de comunhão do Concílio Vaticano II, um processo que exige tempo. Assim como uma borboleta, a Igreja precisa respeitar seu próprio ritmo para ouvir, discernir e amadurecer cada etapa. A sinodalidade, portanto, requer que a escuta e o discernimento, elementos cruciais para a tomada de decisões pertinentes e atentas aos sinais dos tempos, sejam apoiados por um tempo adequado, garantindo que a comunhão, a participação e a missão se desenvolvam de forma sólida.
No seu prefácio, Glória Liliana Franco discute a sinodalidade como um chamado urgente para que a comunidade se volte a Jesus. Ela argumenta que este processo exige uma profunda conversão e a coragem de romper com a crise e com a noite que se instala, abrindo espaço para a atuação do Espírito Santo. Segundo a autora, essa jornada não é passiva; ela demanda uma renovação constante de atitudes, com a capacidade de se adaptar a diferentes contextos e culturas. Franco reforça a necessidade de um impulso missionário que valorize e fortaleça os vínculos, a amizade e o cuidado mútuo. A busca pela utopia da fraternidade, um ideal de união e solidariedade, é vista como essencial, mesmo quando a humanidade se mostra frágil e rachada. A história, conforme ela aponta, é construída nesse claro-escuro da existência humana, onde a fragilidade e a graça estão em constante confronto.
No seu desfecho, Emilce Cuda enfatiza que a proposta sinodal almeja estabelecer uma cultura sinodal. Para isso, ela detalha a importância do "lugar" onde a sinodalidade acontece, os requisitos essenciais para esse espaço de encontro e diálogo, e os impactos sociais significativos que dele devem emanar.
O livro propõe a sinodalidade como um projeto a ser construído, explorando novas formas de organização e participação que levam a uma genuína renovação da Igreja. Ele contribui de forma valiosa para o tema, mostrando que caminhar juntos pressupõe conversão e que a imersão em diferentes culturas exige a renovação de atitudes, formas, estruturas e estilos. Com uma variedade de textos, a obra nos convida a ver a Igreja como uma totalidade dinâmica, onde a diversidade precisa ser integrada para que se possa responder de maneira inovadora à vontade de Deus, mesmo nos contextos mais complexos e desafiadores da história.
Os leitores podem ler a obra na íntegra ou selecionar os capítulos que melhor atendam às suas buscas existenciais, teóricas ou pastorais. Em síntese, os capítulos tratam do chamado essencial de aprender a caminhar juntos na Igreja, como um aprendizado permanente e incompleto, sujeito a tentações recorrentes, tanto pessoalmente quanto no âmbito da Igreja como sistema, de olhar para trás, atrapalhando o progresso que o Espírito nos impulsiona, por medos ou pretensões enganosas que nos distanciam da fidelidade à verdadeira missão da Igreja. Pois esse é o princípio norteador da sinodalidade. Seu exercício visa animar a vida e a missão evangelizadora da Igreja na unidade, sob a guia do Senhor Jesus, que prometeu: “Onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, eu estou no meio deles” (Mt 18,20).