23 Julho 2025
"Lembremos: a ecologia integral e, consequentemente, o cuidado da casa comum, nada mais é do que a Doutrina Social da Igreja. E é preciso rezar para que todos vivamos essa conversão".
O artigo é de Cristina Inogés Sanz, em artigo publicado por 7Margens, 22-07-2025.
Cristina Inogés Sanz é teóloga e foi membro do Sínodo dos Bispos sobre a Sinodalidade por nomeação do Papa Francisco, depois de ter integrado a comissão metodológica de preparação. Autora do livro A Sinfonia Feminina (Incompleta) de Thomas Merton (Paulinas Editora),
Há alguns dias, um amigo meu fez-me notar que, na primeira temporada da série The Young Pope, o fictício Papa Pio XIII impede que sejam feitos souvenirs e outros produtos com a sua imagem, pois somente Deus é o verdadeiro protagonista. Disse-me isso comentando o espanto que os turistas e peregrinos, em pleno Ano Jubilar, manifestam diante da falta de “lembranças” com a imagem de Leão XIV.
Aparentemente, o Vaticano (o próprio Leão XIV?) ainda não autorizou o uso da imagem do Papa para esse fim. Seria bom que essa autorização nunca chegasse e começássemos a valorizar a imagem do Papa, seja ele quem for, sem a necessidade de a explorar nos mais variados objetos, alguns de gosto duvidoso.
Em muitas ocasiões, essa comercialização da imagem papal é acompanhada por um culto insano – muitas vezes inconsciente –, mas que alimenta uma forma de religiosidade que fica nesse ponto, sem avançar mais, sem crescer na fé, sem questionar nada que permita aprofundar o caminho que todos os cristãos devemos percorrer. Pode-se dizer que, às vezes, isso toca a idolatria.
Podemos dizer, assim, que Leão XIV, pelo menos por enquanto, não está prestes a entrar no mercado de lembranças que alimentam as lojas nos arredores da Praça São Pedro. Essa "ausência comercial" leva algumas pessoas a dizer que ele não está, mas ele está. Na verdade, ele está desde o início, mas, para alguns, era um "estar tranquilo".
Provavelmente viam essa "calma" porque não se deram ao trabalho de ouvir ou ler, sobretudo ler as suas homilias, discursos, catequeses, alocuções do ângelus… Mas, de repente, o letargo desses alguns foi abalado porque Leão XIV incluiu no Missal Romano uma fórmula litúrgica para rezar pela guarda da "casa comum" e ele próprio celebrou a primeira eucaristia que surpreendeu muitos, em plena natureza, como se fosse uma catedral.
Porquê essa surpresa? Porque acreditavam que todas essas coisas sobre o cuidado da criação, que vêm desde os tempos de João XXIII e que Francisco colocou em primeiro plano, eram coisas de cuidar de plantinhas e floreiras e, com a morte de Francisco, a causa morreu. E nada disso. A ecologia integral, o cuidado da nossa casa comum, é pura Doutrina Social da Igreja.
Na Laudato Si’, pela primeira vez Francisco utilizou a expressão "casa comum". Estas duas palavras encerram uma visão do mundo muito concreta e um programa para toda a humanidade – crente e não crente – com uma profunda carga social. Se a Terra é uma casa onde todos habitamos, temos a legitimidade de encontrar o nosso lugar-lar nela; se é comum, deve ser partilhada. Apenas duas palavras apresentam todo um programa social que, ao que parece, Leão XIV está disposto a seguir.
A sua experiência no Peru, onde toda a riqueza natural está sob o olhar e a ação destrutiva de multinacionais sem escrúpulos, como em muitos outros países, permitiu-lhe ver a realidade dessa necessidade ecológica que coloca o ser humano no centro da reflexão e do cuidado.
Parece que, para alguns, de repente Leão XIV está e está de uma forma que começa a não agradar. Ser Leão XIV não implica ser o sucessor de Leão XIII, mas, evidentemente, a intenção de colocar a Doutrina Social da Igreja em cima da mesa será um ponto muito comum nos dois papas. A Doutrina Social da Igreja é evangelho, e apenas evangelho, e no evangelho o centro é sempre o bem-estar da pessoa. Mas Jesus incomodava, não podemos esperar que o magistério de um papa não incomode alguns.
Aliás, em alguns setores, começa-se a dizer que este papa "também é comunista", reafirmando assim que Francisco foi o primeiro. Que falta de originalidade e que pouco conhecimento da história quotidiana da Igreja! No pontificado de Leão XIII, os jornais – único meio de comunicação de massa da época – publicavam em muitas cidades o convite para rezar o rosário em igrejas e catedrais pela conversão do papa comunista. Tudo por causa da publicação da encíclica Rerum Novarum.
Como diz o Livro do Eclesiastes (1,9), não há nada de novo sob o sol. É uma pena, porque isso significa que algumas pessoas nunca leram nada e confiaram e confiam no que alguns dizem.
Lembremos: a ecologia integral e, consequentemente, o cuidado da casa comum, nada mais é do que a Doutrina Social da Igreja. E é preciso rezar para que todos vivamos essa conversão.