26 Junho 2025
"O verdadeiro coração da Eucaristia, a unidade entre corpo sacramental e corpo eclesial, é apagado e esquecido. Afinal, é algo pouco frequentado, justamente pelos adultos. Será que essa forma de grave falta de educação eucarística deveria talvez tornar-se, por meio de Carlo, que foi a sua primeira vítima, um modelo a propor a todos os jovens? É brincadeira? Quem terá a cara de pau – e o coração tão árido – de apoiar tal absurdo?"
O artigo é de Andrea Grillo, teólogo italiano, publicado por Come se non, 17-06-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Como é possível que um jovem beato possa comunicar uma teologia eucarística tão ultrapassada, tão pesada, obsessiva, tão concentrada no inessencial e tão pouco atenta, em vez disso, às coisas decisivas? Como é possível que todo o caminho que a Igreja fez nos últimos 70 anos, em termos de compreensão do valor eclesial da Eucaristia e de sua celebração, tenha sido comunicado de forma tão distorcida ao jovem e fervoroso comunicador, a ponto de lhe sugerir uma compreensão tão deficiente, tão defeituosa, tão unilateral? Quem o apoiou nesse interesse pelos "milagres", desconsiderando o verdadeiro milagre? Perguntei-me onde residem as razões para esse pequeno escândalo.
Para me documentar, pesquisei no site oficial da Associação Carlo Acutis, que pode ser encontrado aqui. A seção dedicada aos milagres eucarísticos é realmente singular. Talvez seja o testemunho mais claro da distorção de olhar e de visão que talvez tenha sido inadvertidamente sugerida a Carlo, ou mais provavelmente desajeitadamente reelaborada e depois imposta a ele, por maus mestres. De quem Carlo deveria ter sido defendido e não entregue. Quando se examinar a seção (encontrada aqui), poderá se ler, no início, três textos, escritos pelo Cardeal Comastri, por D. Raffaello Martinelli e pelo Padre Roberto Coggi O.P. São textos bastante singulares, pois parecem vir de outro mundo, de gabinetes isolados ou de salas sem comunicação. Por estar na soleira de um santo "supercomunicador" me parece um belo paradoxo.
Vamos começar pelo Cardeal, que inicia bastante mal: ele lembra de ter sido contestado por um livro escrito anos antes sobre milagres eucarísticos. Mas leiamos o texto desse lamentável ataque de seu Prefácio: “Há alguns anos publiquei um estudo sobre os milagres eucarísticos, mas, para minha grande surpresa, recebi uma carta contestando a documentação coletada, porque afirmava que os ‘sangramentos’ eucarísticos eram fruto de uma época ingênua e facilmente inclinada a construir prodígios. Sofri bastante por essa afirmação. E a razão era simples: as coisas não eram assim; os fatos falam inequivocamente. Padre Pio, um homem do século XX, não foi um milagre eucarístico vivo?”
Na soleira de uma “exposição” de milagres eucarísticos, um início tão inutilmente pessoal e fora de tema (o que Padre Pio tem a ver com isso?) parece um pouco fora de compasso e sem qualquer relevância real para o tema.
Mas vamos ao segundo texto, mais extenso, de D. Martinelli. Aqui o tom muda e entramos em uma discussão muito articulada, mas que começa se prevenindo:
- milagres eucarísticos não são “objetos de fé”. Excelente. Mas depois o autor, que deve justificar sua apresentação, começa a ilustrar a “positividade” dos milagres eucarísticos. Eis a pars construens: “Os milagres eucarísticos podem ser uma ajuda útil e fecunda para a nossa fé.
Por exemplo, eles podem:
- Ajudar a ir além do visível, do sensível, a admitir a existência de um além. Precisamente por ser reconhecido como um fato extraordinário, o Milagre Eucarístico não pode ser explicado por fatos e raciocínios científicos, vai além da razão humana e questiona o homem, incitando-o a ‘ir além’ do sensível, do visível, do humano, isto é, a admitir que há algo que é incompreensível, inexplicável humanamente apenas pela razão humana, cientificamente indemonstrável.
- Oferecer a oportunidade de falar, na catequese, da Revelação pública e de sua importância para a Igreja e o cristão.
Pergunto ao leitor: que tipo de raciocínio é esse? Os milagres seriam “ocasiões” para falar de outra coisa?
Segue-se uma longa seção sobre a “revelação pública”, mas o discurso sobre a Eucaristia, em seu valor eclesial, permanece totalmente fora do texto.
Finalmente, o texto de Roberto Coggi coloca a cereja no bolo. Logo no início de sua Introdução, ele escreve: “Conhecemos a doutrina católica a respeito da presença real. Com as palavras da consagração: ‘Este é o meu Corpo’, ‘Este é o meu Sangue’, a substância do pão se torna o Corpo de Cristo, e a substância do vinho, o seu Sangue”. Teria sido bom se alguém tivesse atualizado o padre dominicano sobre o fato de que a reforma do Missal de 1970 mudou o que ele está convencido ser a “doutrina católica”, mas é apenas a sua fantasia. As palavras da “fórmula” não são apenas aquelas que ele cita, mas incluem muitas outras: “Tomai, todos, e comei: este é o meu Corpo que será entregue por vós”, e depois “Tomai, todos, e bebei: este é o cálice do meu Sangue, o Sangue da nova e eterna aliança, que será derramado por vós e por todos, para remissão dos pecados. Fazei isto em memória de Mim”.
Não causa surpresa que uma cultura dos milagres eucarísticos, que esquece o único “milagre”, esteja ligada a uma leitura minimalista, seca e ultrapassada tanto da consagração quanto da celebração eucarística.
É útil que, logo em seguida, o Pe. Coggi repita corretamente a teoria de Tomás de Aquino sobre os milagres eucarísticos. Mas, precisamente, essa teoria elimina qualquer possibilidade de “milagre”: o corpo e o sangue são apenas “aparências” do pão e do vinho. Isso deveria excluir a valorização do milagre, mostrando sobretudo os seus limites. Especialmente se estivermos falando de um adolescente de 14 anos!
No entanto, esses são os três discursos oficiais que apresentam a "exposição sobre os milagres eucarísticos". Que esse aspecto seja apresentado como "argumento" a favor da santidade de Carlo é realmente surpreendente.
Deveríamos talvez chegar a dizer: reconhecemo-lo como santo "apesar da sua fixação distorcida pelos milagres eucarísticos"? A questão é, na realidade, mais grave, porque não diz respeito a um jovem adolescente, mas a falsos mestres que o cercaram durante a sua vida e que, após a sua morte, querem projetar nele, como exemplo, a sua falta de teologia.
A falta de educação eucarística não é um problema do jovem Carlo, cuja curta vida, no entanto, carrega consigo uma luz. O problema não diz respeito ao adolescente, mas aos adultos que lhe colocam na boca essas palavras, essas imagens, essas reconstruções, esses interesses não equilibrados e pouco saudáveis.
É uma falta de educação eucarística que não se envergonha de escrever Prefácios, Apresentações e Introduções, que parecem, estes sim, escritos por adolescentes sem qualquer formação teológica sobre o "verdadeiro" e "único" milagre eucarístico da comunhão eclesial. Sobre esse aspecto, que realmente justifica a centralidade da Eucaristia na vida dos cristãos, nenhum dos três autores dedicou uma única linha. Mas o que estou dizendo, uma única palavra, se não por engano, citando o catecismo, mas quase distraidamente.
O verdadeiro coração da Eucaristia, a unidade entre corpo sacramental e corpo eclesial, é apagado e esquecido. Afinal, é algo pouco frequentado, justamente pelos adultos. Será que essa forma de grave falta de educação eucarística deveria talvez tornar-se, por meio de Carlo, que foi a sua primeira vítima, um modelo a propor a todos os jovens? É brincadeira? Quem terá a cara de pau – e o coração tão árido – de apoiar tal absurdo?