21 Junho 2025
Uma reflexão sobre o significado profundo da misericórdia, entre os automatismos eclesiásticos e a responsabilidade do crente.
O Festival della Sintesi, que transforma a brevidade em arte, retorna a Lucca de 18 a 21 de junho com sua 10ª edição. Jornalismo, literatura, teatro, geopolítica, costumes, psicologia e teologia serão os protagonistas, com convidados como Peter Gomez, Marianna Aprile, Sergio Rubini, Carlo Freccero, Ezio Luzzi e Tonino Raffa, Elio Pecora, Letizia Toni, o teólogo Andrea Grillo e muitos outros. Serão quatorze eventos, distribuídos em quatro dias, e para celebrar o décimo aniversário, o Festival escolheu como sede uma das joias da arquitetura românica em Lucca, a Igreja de Sant'Alessandro, uma das mais antigas da cidade, definida por Carlo Ludovico Ragghianti como "uma das grandes progenitoras da arquitetura italiana do século XI", que reabre ao público nesta ocasião, após um importante projeto de restauração.
O artigo é do teólogo italiano Andrea Grillo, professor do Pontifício Ateneu Santo Anselmo, publicado por Avvenire, 15-06-2025.
A tradição conhece a complexidade do perdão e organiza o tempo da igreja, mas também da cidade, entre a feira e a festa. Como frequentemente acontece, a inércia da tradição é um grande rio, que carrega consigo água límpida, água turva e lama. A água límpida da misericórdia torna-se opaca e deixa apenas lama, não quando se humaniza, porque é isso que deve ser, isto é, humanidade reconciliada, mas quando introduz automatismos e exigências burocráticas, desprovidas de verdadeira justificação. O fato de o Jubileu ser uma intensificação da misericórdia, pela qual a Igreja e cada fiel vivem, é, sem dúvida, historicamente, um fato inegável e a ser zelosamente guardado. Mas as formas que essa intensificação conheceu ao longo dos séculos podem velar, ou mesmo obscurecer, esse mesmo elemento original. Eis os pontos delicados dessa tensão, quando se tenta aplicá-los às "indulgências".
A) Uma intensificação da experiência da misericórdia a cada quarto de século (1975, 2000, 2025) implica uma possibilidade de “perdão”, que no caso das indulgências não diz respeito ao pecado, mas à pena. Isso supõe que a diferença entre “remissão da culpa” e “remissão da pena” seja clara para o cristão. Essa diferença, no entanto, parece doutrinária, mas na realidade é uma diferença histórica. Ela aponta para o fato de que, na experiência eclesial, um longo período em que a reconciliação dizia respeito simultaneamente à culpa e à pena (porque exigia que, para a absolvição da culpa, as obras penitenciais tivessem que ser plenamente realizadas) foi seguido por um tempo que antecipou a remissão da culpa em relação à remissão da pena. Já estou absolvido do pecado, mas ainda tenho que responder com a obra da boca, do coração e do corpo: tenho que mudar a linguagem, o sentimento e a ação.
Essa compreensão, que se modificou profundamente ao longo dos séculos, chega ao Concílio de Trento, onde, embora permaneça claro que o sacramento da penitência é um “batismo laborioso”, prevalece na recepção católica a ideia de uma eficácia “ex opere operato”, que tende a desertificar cada vez mais a experiência das obras penitenciais. Esse fenômeno, que se intensificou nos últimos dois séculos e, sobretudo, se tornou mais rígido com a codificação canônica do início do século XX, tornou o conceito de pena temporal quase impensável. É, portanto, a própria tradição católica, em seu desenvolvimento, que erodiu o terreno sobre o qual a pena temporal é justificável, como pré-requisito para sua remissão.
B) Um fato interessante é que, justamente por esse desenvolvimento, as indulgências, por não mais gozarem dessa evidência primária e vital da “pena temporal” – isto é, a complexa elaboração da resposta ao dom do perdão, como parte constitutiva do sacramento da confissão –, era fácil pensar que a “pena temporal”, cuja remissão se pede, é aquela que concerne ao defunto. Que as indulgências estejam casadas com o “sufrágio” é um fato histórico, que, no entanto, esbarra em uma representação bastante trabalhosa: isto é, na crença de que a pena temporal concerne justamente àqueles que estão fora do tempo, como são os defuntos. Com os quais permanecemos em comunhão, justamente graças à comunhão dos santos, mas que não têm a temporalidade como característica peculiar. O que a doutrina clássica afirma, isto é, a diferença entre a morte individual e o juízo final, como “espaço temporal do purgatório”, permanece uma concepção marcada pela projeção da temporalidade dos vivos sobre a intemporalidade do defunto.
A morte individual é diferente do juízo final apenas para aqueles que sobrevivem. O defunto já está no cumprimento do tempo. Por isso, o fato de podermos atribuir ao defunto uma pena temporal, que já não sabemos conceber para os vivos, parece um paradoxo que merece reflexão. Por outro lado, a convicção de que as indulgências já não dizem respeito prioritariamente aos vivos, mas aos defuntos, emerge claramente também do texto da última Bula: "A indulgência jubilar, em virtude da oração, destina-se de modo especial aos que nos precederam, para que alcancem a plena misericórdia" (Spes non confundet, 22). Mas como podemos atribuir pacificamente ao defunto aquilo que lutamos para conceber para os vivos?
C) De onde vem essa possibilidade eclesial de “remissão da pena”? A Tradição utiliza dois argumentos. Por um lado, ela aparece como um aspecto que descende do “poder das chaves”. Deste ponto de vista, a indulgência pode ser reduzida a um “ato administrativo”, que nas categorias usadas na Idade Média não depende da “postestas ordinis”, mas da “potestas iurisdictionis”. Essa redução administrativa da remissão da pena cria uma espécie de “miragem”, que no deserto das obras penitenciais pode causar muitos danos. A miragem é constituída pela possível separação administrativa da remissão da pena da remissão da culpa.
Essa distinção tornou-se uma cisão e uma remoção da relação entre culpa e pena, disseminando atitudes muito arriscadas: por um lado, simplifica a remissão dos pecados e, por outro, dá a ilusão da facilidade festiva da remissão da pena, que só faz sentido (como celebração) no horizonte de uma laboriosa feira de resposta humana à graça de Deus. Por essa razão, uma releitura da indulgência como "oração da Igreja" surgiu desde meados do século XX como uma leitura diferente, que em parte também foi acolhida pelo magistério. Trata-se de uma iniciativa eclesial de oração, não de um ato formal de santificação.
D) O último ponto que merece atenção é talvez o mais amplo: ou seja, qual concepção de penitência sacramental é favorecida por uma leitura meramente administrativa das indulgências? Há aqui um nó profundo, que já chamamos de “burocratização” do sacramento. Se o sacramento é deslocado inteiramente para o lado do dom da graça e perde-se a consciência da dimensão “cooperativa” da graça do perdão, isto é, da obra de liberdade envolvida no sacramento, então as “penas temporais” tornam-se um mero “resíduo”, do qual se fala a cada 25 anos, exclusivamente na forma paradoxal de sua remissão: fala-se delas somente quando desaparecem.
Se falamos de “fazer penitência” apenas por ocasião do “cancelamento” da pena, na realidade não sabemos mais do que estamos falando e também alimentamos com essas indulgências “únicas” o mesmo formalismo que sustenta um sacramento de confissão ordinariamente elaborado sem a obra da liberdade, como puro dom da graça. Assim, o simples dom da absolvição do pecado confirma o simples dom da absolvição da pena: ambos, porém, são pensados de forma abstrata, imediata e sem dimensão processual. Essa tradição, tão deformada, merece hoje uma revisão cuidadosa e profunda.