13 Mai 2025
A história dos últimos anos de guerra no Sudão está escrita no corpo de Fathia Arbab Ishaq. Uma guerra que não começa, mas continua. Fathia, que hoje tem oito anos, tinha quatro quando, em 2021, a tenda em que vivia com a família foi atacada por combatentes das Forças de Apoio Rápido (RSF) que invadiram o campo de deslocados de El Geneina. Dois anos depois, ela fugiu do Sudão com sua mãe, Huwaida Adurahman Adam, que agora tem trinta e seis anos, fugindo de um massacre que matou dois dos quatro filhos de Huwaida. Hoje, Fathia e sua mãe são duas dos setecentos mil refugiados que chegaram ao Chade vindos de Darfur.
A informação é de Francesca Mannocchi, publicada por La Stampa, 12-05-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Fathia vive em uma tenda, o chão é um cobertor e o banheiro é uma lata de água abastecida em um poço a um quilômetro de distância. Fathia, que viu seus irmãos morrerem diante de seus olhos, não vai à escola há dois anos, não come o suficiente porque não há comida para todos, se sustenta com muletas e caminha com a dignidade dos sobreviventes.
A guerra civil no Sudão eclodiu em 15 de abril de 2023, desde então o país tem sido palco de um conflito devastador entre o exército do general Abdel Fattah al-Burhane, que tomou o poder em 2021 durante um golpe de estado, e as RSF paramilitares, afiliadas ao seu ex-vice, Mohamed Hamdan Daglo. Ambas as forças que lutam pelo país foram acusadas de crimes de guerra. O massacre de El Geneina, do qual Fathia e sua mãe fugiram, é um deles.
Durante dois meses, entre a primavera e o verão de 2023, em El Geneina estavam combatendo de um lado os Masalit e outros grupos não árabes, apoiando o exército, e do outro lado as RSF e as milícias árabes aliadas. As Forças de Apoio Rápido sitiaram a cidade em maio, em meados de junho torturaram e mataram o governador masalit do estado de Darfur Ocidental, Khamis Abbakar, e em 22 de junho El Geneina caiu nas mãos da RSF.
As organizações humanitárias estimam que 10 mil pessoas foram mortas nos massacres, a maioria pertencente à população masalit. Aqueles que conseguiram escapar a tempo chegaram ao Chade. Para se salvarem, mas também para contar o que viram. Os abusos e a tortura, as valas comuns. Os homens agrupados e executados. A violência sistemática contra as mulheres. E seus filhos morrer sem poder fazer nada. Violência repetida, cotidiana, civis atacados, mortos, sequestrados, mulheres estupradas na frente de seus filhos ou mães enquanto tentavam chegar à fronteira mais próxima a pé. Huwaida também tem as mesmas memórias que todos. Enquanto fugia, viu homens retirados de carroças para serem separados das mulheres e depois executados na frente de todos. Os milicianos, diz ela, gritavam: "Não deixaremos nenhum masalit sobreviver, mataremos todos vocês".
Em 2023, a guerra no Sudão eclodiu na capital Cartum, uma novidade para o país, palco de vários conflitos, mas quase sempre travados em áreas periféricas, como em Darfur no início dos anos 2000 ou aquele que levou à separação do Sudão do Sul. A primeira consequência de um conflito que começou em áreas urbanas e, portanto, mais densamente povoadas, foi um deslocamento em massa da população, um êxodo que rapidamente transformou o Sudão na maior (e esquecida) crise humanitária do mundo. Mais da metade da população, cerca de 25 milhões de pessoas, precisa de assistência humanitária e proteção, mas a carência de financiamentos e a insegurança deixaram grandes áreas do país inacessíveis. Até o momento, quase 13 milhões de pessoas foram forçadas a abandonar suas casas em todo o Sudão, incluindo quase 4 milhões que fugiram para países vizinhos.
Almortada Mohamed também chegou ao Chade há dois anos, também vindo de El Geneina. Ele tem 23 anos e estudava engenharia no Sudão. Hoje, mora em uma cabana que está reforçando enquanto espera a chegada da estação chuvosa, e todas as manhãs veste uma das duas camisas que trouxe e vai a um centro de apoio fundado por outros jovens como ele que, sem a possibilidade de estudar e com o futuro em suspenso, uniram forças para criar um centro para alimentar as crianças menores. Alimentar – enfatiza Almortada – e não nutrir, porque a refeição que servem todas as manhãs, uma tigela cheia de caldo e um pouco de cereais, não contém nenhum dos alimentos que as crianças precisariam, mas pelo menos enche a barriga. Almortada fugiu com toda a família; todos conseguiram se salvar, mas não lhes resta mais nada: "Precisamos estudar, nos tratar, precisamos de um futuro e estamos em um limbo. Somos como animais numa armadilha, não podemos voltar para casa e aqui, mesmo sendo acolhidos, vivemos em um estado de abandono. O mundo nos esqueceu e, enquanto isso, no Sudão, as pessoas morrem de fome".
Segundo o PAM das Nações Unidas, a fome atingiu níveis catastróficos, tornando o Sudão o único lugar no mundo onde a fome foi oficialmente declarada em mais de um lugar no país: confirmada em 10 áreas e outras 17 estão em risco. Em algumas áreas, a assistência alimentar emergencial é a única barreira que impede a fome. Mas operações vitais estão cada vez mais limitadas pela insegurança e pela falta de dinheiro. O Plano Regional de Resposta a Refugiados de US$ 1,8 bilhão, liderado pelo ACNUR para 2025, que visava sustentar cinco milhões de refugiados e membros das comunidades anfitriãs, recebeu apenas 10% do financiamento. E quando não há dinheiro, não há comida, não há voos para transportar suprimentos da capital para a fronteira, e as pessoas morrem de fome. O Fundo Mundial de Alimentos reduziu as rações em áreas afetadas pela fome para 70% do necessário e para 50% em áreas em risco de fome. Em todo o país, quase 25 milhões de pessoas, ou seja, a metade da população, sofrem de fome extrema. Quase 5 milhões de crianças e mães que amamentam sofrem de desnutrição aguda.
As crianças desnutridas chegam todos os dias ao hospital em Adré, onde o MSF gerencia as operações no departamento pediátrico e também o apoio psicológico. Nos leitos, no fundo da sala que abriga 24 pessoas, há dois recém-nascidos que não passam de 1,5 quilo. Um tem seis meses, outro, sete. Se houvesse maquinário adequado, equipamentos suficientes, muitas das crianças que chegaram aqui devido a partos prematuros ou com doenças graves poderiam ter sido tratadas, mas a taxa de mortalidade continua muito alta e o hospital na capital, Ndjamena, fica a 900 quilômetros de distância. Mariam fugiu de Zalingei. Uma bomba atingiu uma casa vizinha e ela fugiu com seu filho, que agora tem quatro anos. Ela não conseguiu levar consigo nada além de um pouco de farinha e água. Ela caminhou dezenas de quilômetros porque não tinha condições financeiras para viajar nos comboios.
Na cama em frente, Hosna Mohmeed, 37, cuida de seu filho de dois anos, gravemente desnutrido. Mas Hosna não fugiu do Sudão; é um pai chadiano. Um agricultor como a esposa que se senta ao seu lado. Eles também não sabem como alimentar os três filhos e também precisam desesperadamente de comida e assistência médica. Hosna olha para o filho e tenta alimentá-lo com uma seringa cheia de leite. A criança vomita uma, duas vezes. Hosna diz: "O que há de errado, doutor? Não entendo o que há de errado."
E todos ficam em silêncio. Porque a resposta é uma só: fome.