07 Mai 2025
A catástrofe climática que atingiu o Rio Grande do Sul há um ano deixou marcas em várias regiões do estado e milhares de gaúchos. Em alguns locais, a vida voltou a algo próximo do normal; em outros, no entanto, essa retomada é ainda um sonho distante, o que escancara os desafios da adaptação urbana ao “novo anormal” do clima. Sem falar na dor de quem teve parentes desaparecidos nas inundações e espera até hoje por seus corpos.
A reportagem é publicada por ClimaInfo, 06-05-2025.
O Vale do Taquari foi uma das regiões mais arrasadas em maio de 2024, porque já tinha sofrido com temporais e enchentes por duas vezes meses antes, em setembro e novembro de 2023. Como o Valor abordou, bairros inteiros desapareceram em cidades da região e, no esforço de reconstrução, podem ter de mudar de lugar para evitar que a tragédia se repita.
Este é o caso de Passo da Estrela, no município de Cruzeiro do Sul, de 11,6 mil habitantes. A prefeitura diz que, de 500 casas do bairro, restaram cinco. De algumas, ficaram apenas as marcas no chão. Em outras, que mantiveram alguma estrutura, é possível ver um emaranhado de móveis, vegetação e escombros no que antes era o lado de dentro. Numa casa onde restou uma parede, a escada e a churrasqueira, hoje se leem frases como ‘‘a inação custou vidas e lares’’, ‘‘a culpa não é só do clima’’ e ‘‘essa casa já foi um lar’’.
O povoamento no Vale do Taquari se fez bem próximo às margens do rio. “Isso não aconteceu de forma ordenada. E as mudanças climáticas têm intensificado essa relação da ocupação urbana, com a proximidade da água, de uma maneira que ninguém estava antecipando quando essa ocupação aconteceu”, disse Izabele Colusso, professora da Universidade do Vale do Taquari (UNIVATES).
Izabele integra a coordenação técnica do projeto que busca revisar os planos diretores de sete municípios atingidos na região. O trabalho faz parte do Plano Rio Grande, do governo estadual. A hipótese de realocação total de cidades, que chegou a ser cogitada, não está nos planos. Mas algumas áreas de ocupação dos municípios serão transferidas para outros locais.
“Tem um custo econômico e social muito grande. As pessoas já estão sofrendo com muitas perdas, e perder a sua identidade é muito simbólico. A gente está indicando áreas de risco, onde há perigo para as pessoas, e áreas de ocupação prioritária, onde elas podem ir sem risco, lugares seguros para as cidades crescerem”, explicou.
Pela dimensão da tragédia, o trabalho é mesmo árduo. Ainda assim, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e a Anistia Internacional reclamam da resposta das autoridades brasileiras, destacou a VEJA. Elas apontam que há uma reconstrução “lenta e desigual” – o próprio governador do RS, Eduardo Leite, admitiu que levará até cinco anos para recuperar algumas áreas – e cobram medidas estruturais para enfrentar futuras catástrofes climáticas.
Há mais apelo midiático que avanço concreto na reconstrução do RS, avalia Fernando Meirelles, professor e pesquisador do Instituto de Pesquisas Hidrológicas (IPH) da UFRGS, em entrevista ao IHU. “A maior parte das notícias e dos valores anunciados (do Plano Rio Grande) se referem às fases de reparação de estruturas, como estradas, ou ações de forte impacto midiático, como o desassoreamento. No caso do desassoreamento, os efeitos dessas intervenções não foram estudados e, portanto, não devem ser executados, pois podem agravar os problemas em outros pontos da bacia ou não terem nenhum efeito prático em uma nova cheia”, ponderou.
A reconstrução das vidas está ainda mais lenta e dolorosa para 25 famílias cujos filhos, irmãos, pais ou companheiros seguem desaparecidos desde a enchente de 2024. São memórias e nomes que até hoje não puderam ganhar uma despedida, destaca o g1.
É o caso de Daiana Lassakoski, mãe de Carlos Eduardo, o Dudu. Ela ressalta que, um ano depois, a dor de viver sem o filho segue insuportável. Daiana mudou-se da região em que morava, pois afirma que “não tem psicológico” para continuar no mesmo lugar em que o filho desapareceu. Busca desesperadamente por qualquer sinal de Dudu, enquanto tenta se reerguer e lidar com a dor, que “parece que vai arrancar o coração”.
Sul21, CNN e Agência Pública também relembraram o drama dos gaúchos um ano após a tragédia climática.