02 Mai 2025
"Se o novo Papa disser que a desunião das Igrejas tem um peso misterioso, mas objetivo, decisivo e radical no mal que dilacera a humanidade, isso marcará um novo começo do desejo de unidade e dará uma contribuição não apenas de fachada, mas verdadeira, para a paz", escreve Alberto Melloni, professor da Universidade de Modena-Reggio Emilia e diretor da Fundação de Ciências Religiosas João XXIII, de Bolonha, publicado por Corriere della Sera, 30-04-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Eis o artigo.
Nessas horas, o luto por Francisco e o choque pela exclusão de Becciu do Conclave, mais amarga do que fora de ritual, darão lugar ao diálogo sobre a agenda do catolicismo de amanhã, que ajudará os cardeais a encontrar um novo bispo de Roma. Nem mesmo os cardeais sabem seu nome. Mas a coisa mais importante que ele fará assim que for eleito, todos sabem: ele terá que decidir se irá a Niceia em 24 de maio para celebrar junto com o patriarca ecumênico Bartholomeos (tratado de forma inadequada pelo cerimonial do funeral de Francisco) e os chefes de muitas outras Igrejas o 1.700º aniversário do primeiro concílio ecumênico. E, portanto, o centenário do “Credo” que, integrado ao Concílio de Constantinopla, fala sobre o núcleo da fé cristã e afirma que a fé cristã tem um núcleo. Uma viagem de importância capital. Que tinha como pano de fundo um desejo profundo, caro ao patriarcado: celebrar em comum, beber do mesmo cálice da salvação, nutrir-se do mesmo pão - passando assim de um ecumenismo de cortesias diplomáticas para um ecumenismo de unidade visível.
Francisco, que esperava, naquela ocasião, sincronizar a data da Páscoa entre o Oriente e o Ocidente, teria se contentado com esse gesto simbólico. Sua simpatia por nós teológico-históricos, como é bem sabido, era baixa. Ele confiava muito mais no encontro direto, mesmo que esse corresse o risco de ser genérico (como aquele com os evangélicos) ou oneroso (como aquele com o Patriarca de Moscou e de todas as Rússias, com quem assinou uma declaração comum que apenas refletia as opiniões alheias). É por isso que lhe convinha bastante que a dirigir o Conselho Pontifício para a Unidade fosse Kurt Koch, um prudente cardeal suíço. Nos 15 anos de sua presidência, o órgão - que havia levado os não católicos para o concílio, que havia cancelado, depois de nove séculos, as excomunhões mútuas entre papas e patriarcas, que havia produzido o acordo com os protestantes sobre a justificação - tornou-se um museu onde nada foi perdido e nada avançou.
É altamente improvável que o novo papa queira começar seu ministério petrino fulminando o ecumenismo católico e não vá a Niceia. Mas ao ir a Niceia, terá que dizer verbis et operibus, a coisa mais importante. Se achar que a divisão dos cristãos é uma meada teológica tão emaranhada, proporá um ecumenismo das boas maneiras, que no momento necessário não serve para nada. Se ele achar que as tragédias bélicas são o resultado de uma falta de confiança no direito internacional, já sabemos o que acontecerá: os pobres chorarão, o papa fará apelos veementes todos os domingos. Mas se o novo Papa disser que a desunião das Igrejas tem um peso misterioso, mas objetivo, decisivo e radical no mal que dilacera a humanidade, isso marcará um novo começo do desejo de unidade e dará uma contribuição não apenas de fachada, mas verdadeira, para a paz. Mais ainda: para a capacidade de Cristo, nossa paz, de converter os corações e acolher os perdidos como redentor.
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