06 Setembro 2024
Uma cidade do norte da Inglaterra vive o declínio econômico depois do fechamento progressivo de minas da região. Na cidade, cheia de desempregados e pessoas mais velhas, a chegada de refugiados sírios para ocupar as casas vazias causa hostilidade de alguns. No entanto, TJ, o dono do pub local, vai mediar este convívio, contando com a ajuda da jovem Síria Yara, uma fotógrafa. Nos cinemas.
O comentário é de Neusa Barbosa, publicada por Cineweb, 02-08-2024.
Ken Loach amarrou as pontas que unem refugiados sírios e mineiros britânicos desempregados no especial O Último Pub, que competiu no Festival de Cannes 2023 - e que o diretor veterano de 88 anos prometeu que seria seu último filme. Tomara que não.
Mais uma vez apoiado no roteiro do parceiro Paul Laverty, Loach fala de política a partir de uma abordagem humanista, elegendo como cenário um local de encontro de todas as pessoas, ou seja, um pub, onde se vai para beber, conversar, reclamação, namorar, socializar. Um lugar de encontros e conflitos, que é o oposto do isolamento, da solidão, da divisão.
Muito divididos, no entanto, são os habitantes da cidade do norte da Inglaterra, onde fica este pub, O Velho Carvalho, do afável TJ Ballantyne (Dave Turner). A cidade já viveu melhores dias, quando funcionavam como minas que davam trabalho à maioria dos homens locais. Seu fechamento levou à decadência do lugar, que foi sendo gradativamente abandonado por todos que encontraram alguma oportunidade fora dali. Quem ficou foram os velhos e os desempregados, sem opção, circulando numa paisagem desolada de lojas fechadas e casas vazias.
Estes imóveis vazios são destinados agora aos refugiados sírios que, fugindo da guerra, desembarcam onde podem, em busca de sobreviver. A chegada destas pessoas, que recebem algum tipo de subsídio mínimo do governo britânico, cria animosidade entre alguns moradores locais, que não tardam a praticar uma veia racista e xenófoba que é estimulada pelos políticos de extrema-direita nas redes sociais.
Uma dessas racistas entra em choque com uma jovem síria, Yara (Ebla Mari), quebrando a máquina fotográfica com que ela registra exaustivamente as memórias do que vive, do que trouxe do país natal e deste em que ela espera encontrar algum futuro. Ela busca retomar a máquina e acaba fazendo amizade com o dono do pub, que é uma espécie de embaixador da boa vontade, tendo a compreensão de que há muito mais em comum entre os refugiados sírios e os trabalhadores britânicos do que muitos deles pensam.
Não há nenhuma engenhosidade nesta posição do filme, em que Loach denuncia como as políticas dos últimos governos britânicos esvaziaram de recursos públicos cidades como esta, antes de um foco ativo de trabalho e sindicalismo, lançando seus moradores na pobreza e no desalento. Com sindicatos enfraquecidos, estes trabalhadores têm poucos lugares onde se ancorar e o pub é um deles. Melhor ainda que seja um pub onde alguma atividade social pode ser retomada.
A realização de um evento no bar, que um sírio e inglês, fazendo suas comidas típicas para ver as fotos que Yara fez dos moradores locais, é o ponto alto do filme, que não dá recurso a nenhuma peça nem idealização açucarada. Cada uma dessas pessoas é retratada em sua complexidade, mas deixando aberta a porta a olhar o outro de um modo descontaminado de preconceitos. Sim, a humanidade pode ser reorganizada para fazer um mundo melhor.
Como em outros filmes, Loach coloca no centro de sua história um cenário de socialização e festa, aqui no caso do pub. No filme A Parte dos Anjos (2012), este lugar era uma destilaria, e em Jimmy's Hall (2014), um salão de danças. Comer, beber, dançar também são formas de aproximação e até de chegar à política.
Poster do filme "O Último Pub".
Ficha técnica:
Nome: O último pub
Nome original: The old oak
Ano: 2023
País: Inglaterra , França , Bélgica
Gênero: Drama
Duração: 113 minutos
Classificação: 12 anos
Cor da filmagem: Colorido
Direção: Ken Loach
Elenco: Dave Turner , Ebla Mari , Claire Rodgerson