11 Mai 2023
Desde abril, empresa gastou mais de R$ 670 mil em propaganda contra o PL 2630, segundo dados da Meta.
A reportagem é de Bruno Fonseca, publicada por Agência Pública, 09-05-2023.
O Google foi o maior anunciante político nas redes do Facebook e Instagram no início do mês de maio no Brasil. Segundo a Agência Pública apurou, o Google gastou mais de R$ 470 mil em anúncios contra o PL 2630, o chamado PL das Fake News, no Facebook e Instagram entre 30 de abril e 6 de maio. Ao todo, desde abril, o Google pagou mais de R$ 670 mil em anúncios, todos eles de postagens contrárias ao PL.
As campanhas funcionam da seguinte forma: o Google paga para a Meta — a empresa que é dona das redes Facebook e Instagram — para que postagens sejam impulsionadas como propaganda e tenham maior alcance. Ou seja, esses conteúdos aparecem com maior frequência e chegam a mais pessoas que usam as redes sociais.
Para se ter uma ideia da dimensão dessa campanha, em apenas um anúncio entre os dias 1 e 3 de maio, o Google pagou de R$ 200 mil a R$ 250 mil — o PL das Fake News iria ser votado no dia 2 de maio. Com isso, um vídeo de 15 segundos que afirma que “o PL 2630 pode aumentar a confusão sobre o que é verdade ou mentira no Brasil” apareceu mais de 1 milhão de vezes para usuários do Facebook e Instagram no Brasil.
A peça de publicidade ainda afirma que “precisamos melhorar o texto deste projeto de lei” e convoca o usuário: “fale com seu representante nas redes sociais ainda hoje”. A postagem inclui um link do blog do Google no Brasil. Nele, um texto de Marcelo Lacerda, Diretor de Relações Governamentais e Políticas Públicas, diz que “o PL das Fake News pode aumentar a desinformação no Brasil” e que “o PL 2630 pode piorar a sua internet”.
Google pagou de R$ 200 mil a R$ 250 mil em apenas um dos anúncios contra o PL no início de maio. (Foto: Reprodução)
Antes dessa ação contra o projeto de lei, a última campanha do Google registrada no Facebook e Instagram tinha sido em novembro de 2022, sobre o mês da consciência negra. Nela, o Google pagou menos de R$ 100. O anúncio atingiu cerca de 35 mil telas.
Anúncio sobre mês da Consciência Negra custou menos de R$ 100 ao Google. (Foto: Reprodução)
Google mirou campanha em empresários, marqueteiros, advogados e políticos
Donos de empresas, diretores, chefes de marketing, profissionais de relações públicas, advogados, defensores públicos, juízes, vereadores e servidores públicos foram alguns dos públicos para os quais o Google mirou a sua campanha contra o PL das Fake News.
Isso se chama direcionamento detalhado. Quem anuncia no Facebook pode escolher incluir ou excluir determinados públicos a serem atingidos pelas suas postagens.
Além disso, o Google segmentou a sua campanha para pessoas com os seguintes interesses: meios de comunicação, revistas, jornalismo de cidade, negócios e economia financeira.
O anúncio mais caro da campanha, ativo entre 28 de abril e 2 de maio, foi visto por mais mulheres que homens. São Paulo foi o estado onde o anúncio foi mais exibido.
Google fez campanha política sem rótulo
A campanha milionária do Google nas redes do Facebook inclui a veiculação de anúncios sem a devida identificação de conteúdo político, segundo dados da própria Biblioteca de Anúncios da Meta.
Explicando: no Brasil, quem deseja patrocinar campanhas no Facebook ou Instagram que tratem de assuntos sociais, eleições ou política precisa indicar que os anúncios falam disso. Esse rótulo aparece para a Meta e para os usuários das redes. Ao fim, todos esses dados vão para a Biblioteca de Anúncios da Meta, que está disponível para todas as pessoas.
Conforme a Pública apurou, metade dos anúncios do Google contra o PL 2630 nos últimos sete dias foram veiculados sem rótulo dizendo se tratar de uma campanha política.
Está nesse grupo dos “sem rótulo” o segundo anúncio mais caro feito pelo Google nos últimos dias: uma peça, exibida para mais de 1 milhão de telas e com o mesmo vídeo que diz que “o PL 2630 pode aumentar a confusão sobre o que é verdade ou mentira no Brasil” foi veiculada sem rótulo. O Google pagou de R$ 400 mil a R$ 450 mil apenas para impulsionar esse anúncio.
A Pública questionou a Meta se isso configura infração às regras da plataforma, que respondeu que não irá comentar sobre o assunto. Também perguntamos ao Google por que não informou que os anúncios tratavam de assuntos sobre questões sociais, eleições ou política. A empresa não retornou até a publicação desta reportagem.
Tramitação do PL está travada na Câmara dos Deputados
O PL 2.630, que ganhou o apelido de PL das Fake News, ainda precisa ser votado na Câmara dos Deputados. Na primeira semana de maio, a votação, que estava na pauta do dia, foi adiada. O texto inicial foi aprovado no Senado há três anos.
O principal ponto do projeto é obrigar as plataformas como Google e Meta a proativamente remover conteúdos que se enquadrem em situações como crimes contra o Estado Democrático de Direito, atos de terrorismo ou preparatórios, estímulo ao suicídio ou à automutilação e crimes contra crianças e adolescentes. O texto também regula transparência das plataformas, acesso a dados via API e a imunidade parlamentar. O projeto vale para plataformas com mais de 10 milhões de usuários no Brasil.
Além disso, o texto trazia mudanças sobre direitos autorais e remuneração de conteúdos jornalísticos compartilhados nas redes sociais. Segundo reportagens, o relator do projeto, o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), deve retirar esses trechos do PL, para serem votados separadamente.
No dia 1º de maio, o Google exibiu em sua home um link contra o PL. Quem acessava a página — a home do Google é utilizada por 97% dos 160 milhões de brasileiros que usam a internet — via a afirmação de que “O PL das Fake News pode aumentar a confusão sobre o que é verdade ou mentira no Brasil”. O link direcionava para o mesmo texto do Google que foi veiculado nos anúncios no Facebook.
Home do Google com link para artigo contrário ao PL das Fake News. (Foto: Reprodução)
Leia mais
- Sérgio Amadeu: regular as redes é medida necessária contra desinformação
- Como o Brasil vai encarar o poder das Big Techs? Artigo de Sérgio Amadeu da Silveira
- Educação para redes e reconstrução de parâmetros de realidade: desafios da era WhatsApp. Entrevista especial com Sérgio Amadeu
- O fim da neutralidade e a transformação da internet numa rede de supermercado. Entrevista especial com Sérgio Amadeu
- Brasil, colônia digital. Artigo de Sérgio Amadeu
- PL das Fake News: “regular as plataformas é uma tarefa da nossa geração”
- A nova Comunicação e o poder total das Big Techs
- 3 milhões de dólares do Google para combater as fake news sobre as vacinas contra o Covid-19. Onde está o dinheiro, quem o pegou e com que resultados?
- “Cunho religioso domina as abordagens das fake news nesta eleição”, destaca Lúcio Uberdan
- Olavo de Carvalho, pioneiro das modernas fake news no Brasil
- Um sentido inusitado do 8 de janeiro
- No ecossistema de desinformação, a centralidade do WhatsApp no adoecimento do sistema democrático. Entrevista especial com João Guilherme Bastos dos Santos
- Um Brasil em fazimento. Artigo de Leonardo Boff
- Onde mora o perigo. Artigo de Luiz Werneck Vianna
- Empresários percebem que país já não pode se submeter às forças armadas. Entrevista com Fabio Konder Comparato
- “A política se transformou em um espetáculo onde só há ideologias, não há ideias”. Entrevista com Boaventura de Sousa Santos
- O jogo combinado do STF deu drible em Lira. Resta saber se ele não dará depois uma canelada
- Em decisão histórica, STF manda investigar governo Bolsonaro por genocídio indígena
- TSE desmonetiza canais de fake news e expõe investigação contra Carlos e Jair Bolsonaro e Braga Netto
- Desinformação não é jornalismo, diz nota em apoio à decisão do TSE contra a Jovem Pan
- Francisco, aos comunicadores católicos: “Combater o fundamentalismo dentro da Igreja”
- A urgência do Revogaço antifascista
- Pego pelas fezes. Artigo de Edelberto Behs
- O que Noam Chomsky pensa a respeito da Inteligência Artificial do ChatGPT
FECHAR
Comunicar erro.
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Google pagou mais de meio milhão de reais em anúncios no Facebook contra PL das Fake News - Instituto Humanitas Unisinos - IHU