Mulheres católicas solidárias com Anne Soupa e sua batalha

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05 Junho 2020

A candidatura de Anne Soupa à sede de arcebispo de Lyon provoca muitas reações de apoio, não tanto por sua nomeação, improvável, quanto por sua batalha por uma igreja mais feminina.

A reportagem é de Luc Chatel, publicada por Le Monde des Religions, 29-05-2020. A tradução é de Luísa Rabolini.

Candidata à sucessão do cardeal Barbarin à frente da arquidiocese de Lyon, Anne Soupa não tem nenhuma chance (exceto um milagre!) de acessar a tal função, cujos titulares não se candidatam e são nomeados pelo papa. Em vez disso, pode contar com o apoio de muitas mulheres católicas. Centenas de crentes anônimas, praticantes ou não, se manifestaram em centenas de redes sociais para parabenizá-la e incentivá-la. Não é tanto sua nomeação como arcebispo que elas apoiam, mas as convicções e as lutas que motivam sua candidatura, em particular aquela por uma maior presença de mulheres na Igreja. E para isso outras mulheres católicas se juntam a elas, já envolvidas naquele âmbito.

Como Véronique Margron, muito ouvida tanto dentro da Igreja como teóloga dominicana e presidente da Corref (Conferência das religiosas e religiosos da França), como fora dela, partindo de sua condenação decidida e franca das derivas da instituição ligadas aos abusos sexuais. “Anne Soupa coloca excelentes perguntas, em particular a falta de pluralidade na Igreja Católica e a escassa presença de mulheres em cargos de responsabilidade. Concordo plenamente com o diagnóstico". Quanto ao procedimento seguido, Véronique Margron pensa que" não é nomeando mulheres para todas as posições de poder que uma crise da instituição muito mais complexa será resolvida, porque é sistêmica e dificultada por um fator delicado a abordar: o sagrado", mas aprecia "seu frescor e humor".

A constatação é compartilhada por Marie Mullet-Abrassart, presidente dos Escoteiros e Guias da França (SGDF): “Penso que ela tem muita coragem, enfatiza. Sabe de sua parte que é uma provocação e sabe que corre o risco de ser atacada, mas permite reabrir um debate necessário sobre o lugar das mulheres e dos leigos na Igreja". Em 2017, tornando-se presidente do movimento de escotismo eclesiástico de 88.000 membros aos 33 anos, Marie Mullet-Abrassart iniciou uma segunda carreira, a de DRH (Diretora de Recursos Humanos) na empresa Danone. Isso lhe permite uma visão bastante ampla. “Os jovens devem ser educados para assumir responsabilidades, tanto na Igreja quanto em qualquer outro lugar, afirma. Porque, além do que o sistema não permite, também existem nossos medos, aqueles que nosso ambiente, embora benevolente, expressa sobre nossa capacidade de enfrentar os problemas com energia. Quando fui nomeada presidente do SGDF, me perguntaram com frequência: 'Mas como você vai administrar tudo?'. Uma pergunta que jamais teriam apresentado ao meu marido".

Anne Guilland parece não conhecer o medo de enfrentar vários problemas de frente, em particular o das reformas da Igreja Católica. Doutoranda em filosofia política em Ciências Políticas em Paris e em teologia na Universidade de Genebra, escreveu em 2019, juntamente com o jornalista Laurent Grzybowsky: “Outra igreja é possível - (Une autre Eglise est possible! - ed. Temps Présent) e, na sequência, criou com outras três mulheres na casa dos trinta anos, uma plataforma digital "feminista e interconfessional", Oh My Goddess !, cujo primeiro projeto é um podcast, “Bonne Nouv. elle, la parole inclusive du dimanche", no qual “desde o primeiro domingo do advento até a páscoa, um convidado (ou convidada) oferece toda semana sua homilia". “Minha primeira reação, ao saber do gesto de Anne Soupa, foi dizer: 'Genial!', fala empolgada. Sua candidatura é uma simpática brincadeira ao procedimento tradicional de nomeação de bispos pelo papado. Eu realmente gosto do equilíbrio nessa ‘desobediência civil’ e cordial". Nos conteúdos, “Anne Soupa expressa claramente o fato de que as mulheres reivindicam seu direito de ser o fermento da libertação do Evangelho dentro de uma instituição que se recusa a deixar-lhes os meios para fazê-lo. Temos a impressão de que a Igreja não quer fazer um esforço para rever suas tradições por medo ... mas de que, concretamente? ".

A mesma exclamação "Genial!" foi escolhida por uma pioneira na luta por um lugar melhor para as mulheres na Igreja, a jornalista e ensaísta Monique Hébrard. “Conheço Anne, ela tem o dom de fazer façanhas, confidencia. E isso é, ao mesmo tempo, absurdo, porque ninguém se candidata a ser bispo, e genial. Luto por esses problemas há quarenta anos e, basicamente, é preciso constatar que nada está se movendo. Estamos sempre presos a um clericalismo sacralizado, a um ministério sacerdotal que é muito mais herdado de ritos pagãos e de uma antropologia misógina do que da Boa Nova de Jesus Cristo”.

Em sua epopeia, Anne Soupa também pode contar com a sororidade ecumênica de outras cristãs, como Nathalie Nehlig, pastora da União das Igrejas Protestantes da Alsácia e Mosela: “Só posso encorajá-la em sua batalha. Persevere!".

Todos esses apoios certamente permitirão que Anne Soupa relativize a violência dos ataques dos quais foi alvo, principalmente nas redes sociais. Da parte dos homens, como o capelão militar que, na página de uma editora católica no Facebook, a define como "connasse (prostituta)" e uma das pessoas que a apoia de "desequilibrado". Veementes também as mulheres, algumas das quais não hesitam em chamá-la de "herege" ou em evocar "o diabo".

Diante da hostilidade das correntes tradicionalistas e dos pesos típicos dessa instituição antiga e hierárquica que é a Igreja, algumas mulheres prefeririam um método diferente daquele escolhido por Anne Soupa: mais medido, paciente e adequado às possibilidades. “Se amanhã fosse decidido ordenar padre as mulheres, haveria um cisma, teme Monique Hébrard, há um ponto em que podemos progredir, é a possibilidade de falar. Por exemplo, permitindo que as mulheres façam homilias". Marie Mullet-Abrassart expressa satisfação por vários e poderosos movimentos eclesiais serem atualmente dirigidos por mulheres: SGDF, o Secours catholique, CCFD-Terre solidaire, MRJC (Movimento Rural da Juventude Cristã) e ainda as influentes Semanas Sociais da França. Explica também que, após a publicação em La Croix, em 2018, de um artigo em que convidava à "necessária conversão radical de uma Igreja que ofereça todo o seu espaço às mulheres, aos jovens e aos leigos, em todos os lugares e em todos os níveis", e após o choque das revelações dos abusos e crimes sexuais cometidos por padres, dezenas de organizações católicas decidiram se unir em uma estrutura comum, Promessas d'Eglise, que se reúne regularmente e tem encontros com os bispos para fazê-los progredir em alguns temas, incluindo: "o papel das mulheres", "a igual dignidade dos batizados" ou "a luta contra os abusos sexuais". "Acho que as coisas estão mudando, mas a lentidão é frustrante", constata.

Véronique Margron, ao fazer uma proposta, inspira-se em uma modalidade muito antiga de designar bispos, em vigor nos primeiros séculos do cristianismo, por aclamação dos fiéis.

“Evidentemente, não se trata de reproduzi-la de forma idêntica, diz com um sorriso, porque seria bastante ridículo e reforçaria uma das tendências atuais, a da personificação do poder, mas é necessário um modo para dar à comunidade de fiéis o devido espaço. Por que não refletir sobre a possibilidade de uma organização na qual a comunidade local, formada por leigos e padres, seja consultada, não sobre um nome ou um perfil do bispo ideal, mas sobre as reais necessidades da diocese? O que ajudaria os homens – por enquanto – que seriam nomeados. Já seria magnífico se esse procedimento pudesse ser instituído!".

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