02 Agosto 2018
Para diretor-técnico, o instituto, criado em 1955, atravessa a crise mais grave de sua história, com perda de receita, funcionários e sócios. Mas se reorganiza para seguir assessorando os sindicatos.
A reportagem é de Vitor Nuzzi, publicada por Rede Brasil Atual - RBA, 01-08-2018.
A "reforma" trabalhista retirou o custeio do movimento sindical e agravou a situação, que já era preocupante, do Dieese, o tradicional instituto de assessoria e análise do mundo do trabalho. Recentemente, sua direção se reuniu para discutir um plano de reestruturação, o que se traduz em diminuição do tamanho, mas também em definição de diretrizes. Um processo "para se pensar à frente", diz o diretor-técnico do Dieese, Clemente Ganz Lúcio. Dificuldades fazem parte da trajetória da entidade, mas ele acredita que esta seja a mais grave crise de sua história, iniciada em 1955.
"Nos anos 60, o impacto político foi severo, mas o Dieese era pequeno. Hoje, o impacto é em relação a uma equipe grande e uma instituição de presença nacional", avalia Clemente. Para ele, o momento é de "construir resistência em todas as frentes". A receita atual corresponde de 60% a 70% do período 2014/2015. Caiu a arrecadação sindical e houve perda de contratos com órgãos governamentais. A previsão é de que a receita de 2019 seja equivalente a 50% de 2016.
A pesquisa da cesta básica, que era realizada nas 27 capitais, agora é feita em 20. Também diminuiu o número de regiões metropolitanas abrangidas pela Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED). A pesquisa original, de São Paulo, iniciada em 1985, está garantida pelo menos para o ano que vem.
O corte atingiu também pessoal e subseções. Segundo o coordenador de Relações Sindicais do Dieese, José Silvestre Prado de Oliveira, de 62 subseções em entidades no ano passado, o número caiu para 50. "Em algumas, o técnico foi demitido. Em outras, o tamanho da subseção foi reduzido, e também o valor do contrato." Desde 2015, mais de 100 funcionários foram dispensados. De 340, ficaram aproximadamente 230.
Caiu ainda o número de sócios, hoje em torno de 670. Em 2017, eram 720. Silvestre lembra que no começo dos anos 2000, esse número chegou a quase 1.200, mas a inadimplência também era alta, em torno de 40%. "Muitas entidades têm nos procurado para reduzir o valor da mensalidade", acrescenta.
Uma parte da equipe teve atraso nos salários. Desde setembro, foi adotada uma linha de corte de R$ 5 mil – até esse valor, o pagamento é integral. Falta ainda acertar o 13º salário. Um comitê de reestruturação foi organizado, com participantes das seis centrais reconhecidas formalmente, e lançada uma campanha de fortalecimento do Dieese.
Transição
"O que a gente está fazendo é trabalhar nas entidades sindicais para a construção de um fundo para ajudar na reestruturação. Estamos tentando preservar as receitas sindicais e não sindicais", diz Clemente. O momento difícil também leva a planejar o futuro: "Olhar para as transformações que estão ocorrendo no mundo do trabalho, o impacto que a reforma trabalhista traz para o sistema de relações do trabalho".
O Dieese busca estabelecer prioridades, "reorganizar o nosso atendimento sindical para as negociações coletivas, principalmente", além de formar uma rede de atendimento nos estados, dando suporte via internet. Com a preocupação de se manter "na medida em que o próprio movimento sindical vai definindo o seu tamanho". É um período de transição "cujo tamanho ninguém sabe", lembra o diretor técnico. Algumas entidades certamente vão ajudar, mas ele observa que cada uma também está tentando se preservar.
Fundado no final de 1955, com o objetivo de monitorar as entidades de trabalhadores e fomentar pesquisas próprias, com desconfiança dos índices oficiais, o Dieese acompanhou o crescimento do movimento social nos anos 1980, lembra Silvestre, mas nunca teve um financiamento 100% sindical. Agora, tem um duplo desafio: "Se reorganizar, mas também com capacidade de ajudar o movimento sindical a se repensar".
Leia mais
- Reforma trabalhista vai intensificar precarização, aponta Dieese
- Suspensão de reformas permitirá ampliar debate com trabalhadores, diz Dieese
- PEC 287 é uma das reformas de maior exclusão social no país, diz Dieese
- Crise não pode ser pretexto para flexibilização, afirma Dieese
- PLC 30 abre portas para retrocessos como terceirização no serviço público e prestação de serviço por cooperativas, adverte Dieese
- Técnico do Dieese diz que medidas do governo deixam a economia 'no chão'
- Dieese aponta queda no rendimento do trabalho
- Alta de desemprego reflete ajuste no mercado, diz Dieese
- "O trabalhador é pressionado a aceitar uma condição aviltante". Entrevisa com Clemente Ganz Lucio
- Livro detalha mudanças no mundo do trabalho contemporâneo
- Seis meses após reforma trabalhista, arrecadação de sindicatos desaba 88%
- Reforma trabalhista: Menor autonomia do trabalhador sobre o tempo social, maior concentração de renda e desigualdade social. Entrevista especial com Ruy Braga
- Reforma trabalhista na visão da empresa: “será que precisamos de um paizão?”
- Justiça mantém contribuição sindical extinta pela reforma trabalhista
- Reforma deve mudar cenário para sindicatos
- A eliminação dos custos associados ao direito e à proteção do trabalhador constitui a espinha dorsal da reforma trabalhista. Entrevista especial com Ludmila Abilio
- Como transformar as leis do Trabalho, no século 21
- Morte ao sindicato: nas fábricas reina o populismo
- Reforma trabalhista: ‘É muito atraso, é muito retrocesso’. Entrevista com Vera Lucia Navarro
- ‘Argumentar que a reforma trabalhista traz mais segurança é errado’
- “A Reforma Trabalhista é a vitória do Brasil colônia sobre o Brasil do desenvolvimento”
- Em dossiê, pesquisadores detalham os impactos da reforma trabalhista
FECHAR
Comunicar erro.
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Dieese se reestrutura para sobreviver e acompanhar futuro do trabalho - Instituto Humanitas Unisinos - IHU